Câmara dos EUA pede que Brasil desista de sanções
A possibilidade de que o Brasil aplique sanções de propriedade intelectual contra empresas americanas atingirá o desenvolvimento econômico do país sul-americano, afirmou nesta segunda-feira a Câmara de Comércio americana.
O Brasil anunciou há uma semana uma lista de produtos americanos que serão sobretaxados, totalizando US$ 591 milhões, e ameaçou com outras sanções sobre serviços e propriedade intelectual (principalmente dirigidos às indústrias farmacêutica e de música), por até US$ 238 milhões.
“Uma ação deste tipo poderia converter o Brasil em um lugar menos hospitaleiro para as indústrias baseadas na propriedade intelectual a longo prazo”, afirmou a Câmara em um comunicado.
“Pedimos ao governo brasileiro que suspenda qualquer represália enquanto ambas as partes seguirem negociando uma solução”, afirmou.
Em uma histórica decisão, o Brasil foi autorizado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) a aplicar medidas compensatórias por US$ 830 milhões por ano em represália aos subsídios americanos ilegais aplicados na produção de algodão.
A disputa levou altos responsáveis americanos, entre eles o próprio secretário de Comércio, Gary Locke, a viajar ao Brasil para tentar reverter a situação.
O presidente Luiz Inacio Lula da Silva pediu na quarta-feira ao presidente americano, Barack Obama, que “coloque suas pessoas para negociar rapidamente” para acabar com o conflito. As sanções brasileiras entrarão em vigor em 30 dias.
O Diário Oficial da União divulgou nesta segunda resolução destinada à consulta pública para adoção de medidas de suspensão de concessão e obrigações na área de propriedade intelectual contra os Estados Unidos em retaliação aos subsídios concedidos aos produtores americanos de algodão. A decisão complementa medidas anunciadas na semana passada que elevavam o imposto de importação de produtos americanos.
Entre as novas medidas se destacam a suspensão de direitos e obrigações que o país tem, relativos a patentes e direitos de marca e de autor; a subtração do prazo de patentes; a possibilidade de permitir a importação paralela de produtos protegidos por patente e a suspensão de direitos de autor e cobrança de taxas adicionais.
A segunda lista se refere ao que se chama de retaliação cruzada, que não se limita à área que motivou a solicitação original na Organização Mundial do Comércio (OMC). Com isso, a resposta brasileira pode ter uma abrangência maior, não limitada à área de bens, ou ao setor agrícola. É a terceira vez que a OMC autoriza esse tipo de retaliação e, caso seja concretizada, será a primeira vez que ela se tornará efetiva.
Terra
Guerra Comercial: Olho por olho
A reação do Brasil contra o subsidio ilegal para o algodão americano escancara a arrogância dos impérios.
Além de atingir o Brasil, esse protecionismo, já condenado pela Organização Mundial do Comércio, abala a economia de quatro países africanos, chamados de “Cotton 4″: Benin, Burkina Fasso, Chade e Mali. Eles não sobrevivem sem essa exportação. Uma crueldade.
O governo brasileiro buscou o caminho legal contra uma decisão ilegal. E vai reagir, também, dentro de uma regra admitida pela OMC, especialmente adotada para equilibrar o confronto entre nações com poderes desiguais: a “retaliação cruzada”. É uma espécie de Lei de Talião. Atingido no produto algodão, o Brasil fará retaliação contra propriedade intelectual.
Há uma ironia histórica nesse contencioso.
Em 1988, para proteger os pacientes atingidos pela Aids, o Brasil quebrou a Lei de Patentes e deu acesso generalizado ao tratamento e a medicamentos no País. Os EUA reagiram. Atingidos na propriedade intelectual fizeram represália contra bens brasileiros. Uma decisão unilateral. Sem abrigo legal. Naquela ocasião, a lista americana foi publicada exatamente no dia 7 de setembro. Dia da independência brasileira.
Uma desforra calculada friamente.
Carta Capital
Governo pode retaliar produção, comercialização, importação e licenciamento
Retaliação envolve inclusive prazo de patantes de medicamentos
Renata Veríssimo
BRASÍLIA – O diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, Carlos Marcio Cozendey, explicou há pouco que a lista com 21 itens, publicada hoje no Diário Oficial da União, para retaliação aos Estados Unidos, na área de propriedade intelectual, prevê quatro linhas de aplicação do direito de patentes. Ou seja, o governo poderá retaliar na produção, na comercialização, na importação e no licenciamento de produtos, como medicamentos.
Ele explicou que o governo brasileiro pode, por exemplo, reduzir o prazo em que a empresa que registrou a patente tem exclusividade na produção de um produto. Dessa forma, laboratórios brasileiros, por exemplo, poderiam, passar a fabricar medicamentos que ainda estão sob direito de patente.
Outro item que está na lista de consulta pública é a possibilidade de empresas brasileiras poderem fazer licenciamento de patentes de produtos, sem pagar remuneração ao detentor da patente. Outra medida é a possibilidade de suspender o direito exclusivo do titular da patente de impedir a importação de produtos. Dessa forma, segundo Cozendey, empresas brasileiras poderão, por exemplo, importar de outro país, que não dos Estados Unidos, onde já há fabricação de um produto genérico.
A lista ainda prevê um aumento nas taxas cobradas pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), para o registro de marcas e patentes, por companhias norte-americanas, e também uma cobrança maior pelo Serviço Nacional de Proteção de Cultivares (SNPC) para registro de direito de Propriedade Intelectual. Outra medida que pode ser aplicada, após a consulta pública, é tornar obrigatório para cidadãos e empresas dos EUA o registro para obter o direito de autor, seja na área de audiovisual, de livros ou de software. Cozendey explicou que hoje esse direitos são pagos ao autor, sem que o registro seja obrigatório.
Também está em consulta pública a possibilidade de taxas a remessa dos recursos relativos ao pagamento de Direito de Propriedade Intelectual sobre marcas, patentes e programas de computador. Cozendey disse que em alguns casos a medida pode reduzir o preço do produto para o consumidor brasileiro. Ele disse que, por exemplo, na área de medicamento, pode haver uma redução do preço, porque ao passar a ser produzido por laboratórios nacionais, a concorrência irá aumentar.
Ele explicou que o Brasil ainda não sabe quando a lista definitiva de propriedade intelectual estará concluída. Segundo ele, essa é uma área complicada e sem precedentes na história de comércio.
O diplomata informou que este é o terceiro caso de retaliação em propriedade intelectual, autorizado pela Organização Mundial do Comércio (OMC), mas as outras duas anteriores não foram aplicadas. Ele disse que o governo norte-americano pediu um pouco mais de tempo para conversar com o Congresso dos Estados Unidos para depois iniciar um processo de negociação com o Brasil.
Agencia Estado
A guerra fria no comércio mundial
Protecionismo “oficial” não causou baixa no comércio, mas ações na OMC cresceram mais de 100% desde 2007
A AMEAÇA brasileira de elevar impostos de importação de produtos americanos suscita o alerta exagerado de risco de guerra comercial com os EUA. O subsídio americano ao algodão foi condenado na Organização Mundial do Comércio (OMC). Os EUA deram de ombros, e o Brasil ameaça retaliar.
A iniciativa parece diplomaticamente um tanto desastrada. Mas é difícil o Brasil ficar fora da guerra comercial, que fermenta. França e europeus mais pobres se queixam da Alemanha. Os EUA, da China.
“Guerra fria”, pois, nesta crise de 2007-2010, as ameaças de protecionismo até agora são muito mais comuns do que novas barreiras oficiais a importações. O comércio mundial caiu 9% no ano passado, a maior baixa desde a Segunda Guerra.
Desânimo do consumidor, restrição de crédito para famílias e empresas e seca de financiamento para o comércio internacional foram as causas da baixa, diz o economista Jian Wang, do Federal Reserve de Dallas. Não o protecionismo.
Mas Wang nota que o número de pedidos de processos na OMC tem crescido. No primeiro semestre de 2009, o número de queixas subiu 20% sobre a primeira metade de 2008. No primeiro semestre de 2008, havia crescido 86,8% sobre a primeira metade de 2007.
Tais reclamações podem se tornar restrições comerciais de fato a partir deste ano. Wang observa ainda que o número de barreiras pode crescer anos depois do pior de uma crise. O pico da recessão anterior foi em 2001. O grosso das medidas destinadas a barrar importações barateadas marotamente ocorreu em 2003.
Wang, como tantos outros, diz que países com superavit comerciais excessivos precisam consumir mais (trata-se de China, Alemanha e Japão). Isto é, deixar que os salários reais subam e “crescer para dentro”, importando mais e estimulando economias do resto do mundo.
Parlamentares americanos pediram ontem que Barack Obama declare oficialmente que a China manipula o câmbio. Isto é, que mantém sua moeda desvalorizada demais, de modo a baratear seus produtos e exportar mais. Caso a China não se emende (até parece), querem que o governo vá à OMC pedir retaliações contra os chineses. O Nobel de Economia Paul Krugman acha que o excesso chinês no comércio ajuda a deprimir a economia mundial.
A ministra das Finanças da França, Christine Lagarde, disse ao jornal britânico “Financial Times” que os produtos alemães são competitivos porque a Alemanha arrocha salários. Os alemães bufaram e disseram que vendem mais porque são mais eficientes (embora arrochos sejam um fator de eficiência). O PIB alemão depende de exportações. Tal como a China, mas em muito menor escala, seu consumo doméstico é baixo. Os alemães em parte dependem do deficit comercial de vizinhos europeus, a quem criticam por terem deficit (entre outras críticas).
O governo brasileiro toma medidas desde 2008 a fim de reduzir, de modo indireto, o efeito do real forte.
Colocou mais dinheiro barato no BNDES, baixou impostos e deve tomar mais medidas de estímulo até meados do ano (a melhor delas seria baixar o consumo do governo). Não temos cacife para muito mais. Como vamos aumentar a produtividade?
Folha de São Paulo
Brasil vs. EUA
Em mais um passo para pressionar os Estados Unidos a oferecerem compensações por subsídios ilegais concedidos à produção local de algodão, o governo brasileiro anunciou ontem a lista com as principais áreas sujeitas à retaliação em direitos de propriedade intelectual. A lista de bens e mercadorias submetidas a sanções econômicas já havia sido divulgada na semana passada.
Em consulta pública até 5 de abril, a lista prévia compreende represálias de até US$ 238 milhões em patentes, marcas e direitos de autor por meio de eventual suspensão, retirada ou cobrança de taxa adicional calculadas anualmente pelo Ministério do Desenvolvimento.
As penas podem ser impostas a medicamentos humanos e veterinários, produtos químicos e processos biotecnológicos agrícolas, cultivares, execuções musicais, programas de computador, além de obras literárias e audiovisuais. "A lista é para tentar gerar um movimento dos Estados Unidos", admitiu o diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, Carlos Márcio Cozendey. "O Brasil está reagindo. Não altera a regra do jogo. E não deve significar redução de investimentos no país". A tendência, segundo ele, é "reduzir custos" para o consumidor brasileiro.
A porta para a negociação continua aberta, mas o governo busca forçar gigantes farmacêuticas, indústrias de biotecnologia e de software, além de companhias de entretenimento, a reforçar a pressão sobre o governo americano na disputa do algodão. "Espero que as empresas estejam do nosso lado para fazer os Estados Unidos cumprirem as regras da OMC. Elas vão nos ajudar em Washington".
O diretor do Itamaraty afirmou que, "se houver acordo", as medidas impostas pelo governo podem ser interrompidas "a qualquer momento", já que são produtos específicos e regras gerais. "Temos certeza de que eles têm interesse em respeitar as regras da OMC", afirmou a secretária-executiva da Câmara de Comércio Exterior (Camex), Lytha Spíndola.
Os EUA foram condenados pela Organização Mundial do Comércio (OMC) a compensar o Brasil por subsidiar ilegalmente a produção e exportação de algodão. O País foi autorizado a retaliar os EUA em até US$ 829 milhões anuais. Para permitir essa "retaliação cruzada", foi necessário mudar as regras internas. Se, de fato, ocorrer a chamada "retaliação cruzada", será a primeira vez na recente história da OMC. Em dois casos anteriores, as represálias comerciais acabaram descartadas - Antígua e Barbuda desistiu de retaliar os EUA e o Equador também recuou de sua intenção contra a União Europeia. "A área é nova e ainda estamos inventando como fazer e implementar essas medidas", reconheceu Cozendey.
Na prática, a aplicação de eventuais medidas pode reduzir o prazo de validade de uma patente industrial, levando o produto a "cair em domínio público". Isso, entende o governo, aumentaria a concorrência. "Podemos reduzir a patente em um determinado período", disse Cozendey. "Provavelmente, não se adotará sobre patentes com prazos muito longos".
Os planos do governo também incluem licenciar patentes de medicamentos, químicos, biotecnológicos, softwares, livros e filmes sem a devida remuneração de direitos de autor. A licença ficaria sob controle do Estado, sem pagamento arbitrado. "A lista é ampla e abrangente, porque queremos ouvir todos os setores", disse Lytha.
Na relação de bens e mercadorias, que deve vigorar a partir de 7 de abril, foram inicialmente identificados 222 itens. Mas apenas 102 posições tarifárias sofreram retaliação. O que somaria US$ 2,7 bilhões em sanções acabou limitado a US$ 591 milhões. "Se fosse tudo em bens, causaríamos prejuízo aos consumidores brasileiros. Por isso, optamos pela propriedade intelectual", disse Cozendey.
Na lista sujeita às sanções, estão permissões especiais, sem licença do titular da patente, para executar a "importação paralela" de medicamentos. Assim, seria possível trazer ao país medicamentos genéricos concorrentes de produtores americanos. "Podemos trazer de onde já existem genéricos e obrigar os produtos americanos a enfrentar essa concorrência aqui", afirmou o diretor do Itamaraty.
A relação prévia de retaliação em propriedade intelectual também abrangeu a elevação de preços de registro ou de taxas de renovação de patentes no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). "Podemos criar um novo registro para direito de autor em filmes, livros e softwares", informou Cozendey. O governo também avalia criar a obrigação de novos registros para filmes, livros e softwares ou taxar remessas de remuneração de propriedade intelectual. Seria outra maneira de reforçar a pressão sobre um dos setores mais sensíveis na relação comercial bilateral.
Folha de São Paulo
Poder dos EUA pode comprometer comércio exterior do Brasil
A retaliação do governo brasileiro contra os subsídios à produção do algodão bancada pelos Estados Unidos pode acabar em uma grave deterioração das relações comerciais entre os dois países. Sem deixar claro o que pretende fazer para equilibrar o comércio de algodão com o Brasil, a cúpula econômica norte-americana pode até tirar as vantagens tarifárias recebidas por alguns produtos brasileiros. Segundo o economista e técnico em projetos de logística sincronizada, Antônio Luiz Netto, essa é uma possibilidade real e pode até envolver outros países.
O poder de barganha dos Estados Unidos, ressalta o economista, é muito grande internacionalmente. “Eles têm o poder na mão para chegar em outros países importadores ou exportadores e pedir para frear as relações com o Brasil, senão podem tomar medidas contra eles também. Isso existe sim e os Estados Unidos podem fazer”.
PortoGente consultou importadores, exportadores, despachantes e empresas de logística que atuam nas proximidades dos portos de Rio Grande (RS), Paranaguá (PR) e Santos (SP) e todas que têm envolvimento com o mercado norte-americano estão bastante preocupadas com as consequências dessa guerra comercial. É importante lembrar também que a briga comercial com a Argentina já tem apresentado resultados negativos ao comércio exterior brasileiro. De acordo com esses empresários, o crescimento da corrente comercial com a Ásia é o que alimenta a esperança de bons ventos no futuro.
O economista Antônio Luiz Netto concorda e acredita que “logo logo” o Brasil irá sentir as ações dos Estados Unidos se não houver uma clara amenização da chancelaria brasileira sobre os subsídios aplicados pelo governo comandado por Barack Obama. “A melhor solução é deixar fluir um acordo entre os empresários dos dois países. Essa intervenção estatal pode complicar para todos”.
Portogente
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