Respeito recíproco é bom e todos nós gostamos
Quase diariamente surgem notícias de que há um novo projeto
de lei tentando melhorar a legislação tributária. Mas enquanto se discute o novo
projeto, deixa-se de lado a observância de normas em vigor há muito tempo e com
isso a lei não melhora, nossos direitos são esquecidos e ninguém se preocupa em
respeitar o que já existe.
Justiça é dar a cada um o que é seu. A justiça tributária é, portanto, reconhecer o direito de cada contribuinte, tratando-o de forma respeitosa, cumprindo todas as leis que garantem seus direitos.
A Constituição é a maior das nossas leis e a que mais descaradamente se ignora. O artigo 37, por exemplo, ordena que a administração pública federal, estadual ou municipal “...obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade”, devendo ainda observar as diversas normas que seguem o artigo.
O primeiro desses princípios — o da legalidade — é ignorado costumeiramente em qualquer repartição. Ainda recentemente, por exemplo, autoridades da Secretaria das Finanças do município de São Paulo , inventaram uma instrução normativa sem qualquer base legal, contrariando várias súmulas do STF , e com base nesse monstrengo bloquearam a emissão de notas fiscais de contribuintes em débito. Há casos de alguns que, embora tenham pago ou parcelado a dívida, ainda encontram dificuldades em emitir as notas, porque há uma demora injustificada nas providências do serviço público, ágil ao suspender direitos, mas tardio na sua devolução.
Na esfera federal é a mesma coisa. Contribuinte que sofreu auto de infração teve seus bens arrolados porque o débito que discute é de valor superior a 500 mil reais. Pois bem, como a Receita Federal tinha dificuldades para administrar a grande quantidade de processos de arrolamento, um decreto alterou aquele valor para 2 milhões de reais. Assim, o contribuinte cujo auto era de 500 mil, agora está fora do novo valor e o arrolamento deve ser cancelado. Mas a Receita Federal só é ágil para causar transtornos, não para resolver problemas que ela mesma cria. O contribuinte que requer o cancelamento do arrolamento recebe um “não” como resposta, obrigando-o a socorrer-se junto ao Judiciário.
Um processo qualquer de interesse do contribuinte deveria ser rápido. O inciso LXXVIII do artigo 5º da CF ordena que qualquer processo judicial ou administrativo terá “razoável duração” e no âmbito federal há uma lei que determina que o processo administrativo deve ser julgado no prazo de um ano.
Nada disso é respeitado. Processos administrativos em qualquer instância não observam qualquer prazo para solução, arrastando-se morosamente, ou melhor, dormindo placidamente nas prateleiras das repartições. O respeito está longe desse ambiente.
Por outro lado, já se tornou comum que documentos do contribuinte quando apreendidos pelo fisco ou quando levados à repartição pelo próprio interessado, ficam em poder dos funcionários além do prazo razoável e sem qualquer motivo.
Já constatamos, em várias oportunidades e nas mais diversas repartições, que documentos, livros, talonários etc. ficam amontoados em condições precárias de segurança. Qualquer pessoa, inclusive estranha ao serviço público, pode ter acesso a tais documentos, que ficam sujeitos a sumiço ou vandalismo. Assim, quando entrega documentos ou livros, o contribuinte deve exigir protocolo detalhado e, terminada a ação fiscal, obter de volta os documentos que lhe pertencem.
O nosso Código Tributário Nacional possui várias normas que dão garantias ao contribuinte contra eventual abuso de direito por parte do agente fazendário. Uma dessas garantias é relacionada com o sigilo. Livros e documentos fiscais não podem ser manuseados por pessoas não autorizadas e nenhum assunto relacionado com a fiscalização pode ser divulgado. Tal garantia está no artigo 198 do CTN.
Apesar disso, já tive a oportunidade de constatar numa repartição federal em São Paulo, que pessoas que sequer eram funcionários públicos tinham acesso a processos de autuação. No caso, uma pessoa que me atendeu para dar vista de um processo, revelou que era “terceirizado”. Ou seja: tratava-se de pessoa que não poderia ter acesso ao processo ou ao uso dos computadores da Receita.
Com essa “terceirização”, fica evidente que não há segurança no trato das informações tributárias. Com um simples telefone celular qualquer pessoa pode copiar documentos de um processo e usar a informação como quiser, inclusive fornecendo-a a terceiro. O contribuinte tem o direito de ver respeitada a privacidade de seus documentos, o que nesse caso não ocorreu.
A Receita Federal é função de Estado. Eventual “terceirização” é totalmente nula, quando o prestador de serviço tiver acesso a dados protegidos pelo sigilo. A continuar dessa forma, um dia vamos terceirizar a polícia, o judiciário e o que mais?
Respeito todos merecemos, inclusive o servidor público. Mas quando o respeito é verdadeiro, ele é recíproco. Se apenas um é que respeita, mas recebe em troca um tratamento vil, baixo, grosseiro, a relação pode ser perigosa, por provocar uma reação que nem sempre se consegue controlar. O servidor público, por mais importante que seja sua função, não é superior a ninguém. Assim o diz a Constituição. Não pode esquecer-se que ao lado daquela norma que trata do crime de desacato, que muitas repartições fazem questão de ostentar na parede, também existe outra que cuida do crime de abuso de autoridade.
Justiça é dar a cada um o que é seu. A justiça tributária é, portanto, reconhecer o direito de cada contribuinte, tratando-o de forma respeitosa, cumprindo todas as leis que garantem seus direitos.
A Constituição é a maior das nossas leis e a que mais descaradamente se ignora. O artigo 37, por exemplo, ordena que a administração pública federal, estadual ou municipal “...obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade”, devendo ainda observar as diversas normas que seguem o artigo.
O primeiro desses princípios — o da legalidade — é ignorado costumeiramente em qualquer repartição. Ainda recentemente, por exemplo, autoridades da Secretaria das Finanças do município de São Paulo , inventaram uma instrução normativa sem qualquer base legal, contrariando várias súmulas do STF , e com base nesse monstrengo bloquearam a emissão de notas fiscais de contribuintes em débito. Há casos de alguns que, embora tenham pago ou parcelado a dívida, ainda encontram dificuldades em emitir as notas, porque há uma demora injustificada nas providências do serviço público, ágil ao suspender direitos, mas tardio na sua devolução.
Na esfera federal é a mesma coisa. Contribuinte que sofreu auto de infração teve seus bens arrolados porque o débito que discute é de valor superior a 500 mil reais. Pois bem, como a Receita Federal tinha dificuldades para administrar a grande quantidade de processos de arrolamento, um decreto alterou aquele valor para 2 milhões de reais. Assim, o contribuinte cujo auto era de 500 mil, agora está fora do novo valor e o arrolamento deve ser cancelado. Mas a Receita Federal só é ágil para causar transtornos, não para resolver problemas que ela mesma cria. O contribuinte que requer o cancelamento do arrolamento recebe um “não” como resposta, obrigando-o a socorrer-se junto ao Judiciário.
Um processo qualquer de interesse do contribuinte deveria ser rápido. O inciso LXXVIII do artigo 5º da CF ordena que qualquer processo judicial ou administrativo terá “razoável duração” e no âmbito federal há uma lei que determina que o processo administrativo deve ser julgado no prazo de um ano.
Nada disso é respeitado. Processos administrativos em qualquer instância não observam qualquer prazo para solução, arrastando-se morosamente, ou melhor, dormindo placidamente nas prateleiras das repartições. O respeito está longe desse ambiente.
Por outro lado, já se tornou comum que documentos do contribuinte quando apreendidos pelo fisco ou quando levados à repartição pelo próprio interessado, ficam em poder dos funcionários além do prazo razoável e sem qualquer motivo.
Já constatamos, em várias oportunidades e nas mais diversas repartições, que documentos, livros, talonários etc. ficam amontoados em condições precárias de segurança. Qualquer pessoa, inclusive estranha ao serviço público, pode ter acesso a tais documentos, que ficam sujeitos a sumiço ou vandalismo. Assim, quando entrega documentos ou livros, o contribuinte deve exigir protocolo detalhado e, terminada a ação fiscal, obter de volta os documentos que lhe pertencem.
O nosso Código Tributário Nacional possui várias normas que dão garantias ao contribuinte contra eventual abuso de direito por parte do agente fazendário. Uma dessas garantias é relacionada com o sigilo. Livros e documentos fiscais não podem ser manuseados por pessoas não autorizadas e nenhum assunto relacionado com a fiscalização pode ser divulgado. Tal garantia está no artigo 198 do CTN.
Apesar disso, já tive a oportunidade de constatar numa repartição federal em São Paulo, que pessoas que sequer eram funcionários públicos tinham acesso a processos de autuação. No caso, uma pessoa que me atendeu para dar vista de um processo, revelou que era “terceirizado”. Ou seja: tratava-se de pessoa que não poderia ter acesso ao processo ou ao uso dos computadores da Receita.
Com essa “terceirização”, fica evidente que não há segurança no trato das informações tributárias. Com um simples telefone celular qualquer pessoa pode copiar documentos de um processo e usar a informação como quiser, inclusive fornecendo-a a terceiro. O contribuinte tem o direito de ver respeitada a privacidade de seus documentos, o que nesse caso não ocorreu.
A Receita Federal é função de Estado. Eventual “terceirização” é totalmente nula, quando o prestador de serviço tiver acesso a dados protegidos pelo sigilo. A continuar dessa forma, um dia vamos terceirizar a polícia, o judiciário e o que mais?
Respeito todos merecemos, inclusive o servidor público. Mas quando o respeito é verdadeiro, ele é recíproco. Se apenas um é que respeita, mas recebe em troca um tratamento vil, baixo, grosseiro, a relação pode ser perigosa, por provocar uma reação que nem sempre se consegue controlar. O servidor público, por mais importante que seja sua função, não é superior a ninguém. Assim o diz a Constituição. Não pode esquecer-se que ao lado daquela norma que trata do crime de desacato, que muitas repartições fazem questão de ostentar na parede, também existe outra que cuida do crime de abuso de autoridade.
Raul
Haidar é advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e
Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista
ConJur.
Revista Consultor Jurídico, 20 de agosto de
2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário