LEGISLAÇÃO

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Setor portuário



O aprimoramento do setor portuário parece certo

Em mais um anúncio relevante para a infraestrutura, o governo federal promoveu uma sensível mudança no setor portuário, tão carente, burocratizado e ineficiente no País. Seguindo o rumo do Programa de Investimentos e Logística, o governo federal apresentou o que deve se tornar o novo modelo do setor portuário. Acompanhando o anúncio, na sexta-feira, 7 de dezembro, foram publicadas a Medida Provisória 595 (MP) e os Decretos 7.860 e 7.861.
Com objetivo claro e declarado de aumentar a movimentação de cargas, com a menor tarifa possível, as medidas aparentam estar apropriadas à solução de uma série de entraves existentes na organização do setor portuário.
Talvez a maior ousadia da MP 595 seja a eliminação da distinção entre cargas próprias e cargas de terceiro, que inviabilizavam quase que na totalidade a exploração dos chamados Terminal de Uso Privativo (TUP) exclusivo e misto. A partir deste novo modelo setorial os agora denominados Terminais de Uso Privado poderão ser explorados livremente, mediante autorização concedida pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). O potencial desta mudança é de proporções expressivas, na medida em permite a criação de verdadeiros portos privados, trazendo concorrência para os portos organizados, cuja complexidade setorial e de infraestrutura dificultava o atendimento adequado à demanda já existente.
Para fazer jus à competição com os vindouros portos privados, o governo sinaliza claramente que o medo — fundado em fatores de segurança nacional — da administração privada nos portos organizados também está praticamente ultrapassado. A concessão da administração portuária à iniciativa privada, que atualmente gere apenas um porto organizado (Imbituba), já tem sinal verde para três projetos que estavam à deriva: o novo porto de Manaus, o porto de Águas Profundas, no Espírito Santo, e o Porto Sul, na Bahia, além de outros portos já existentes que poderão ser concedidos. Somados os investimentos em portos públicos e privados, o governo estima um volume, até 2017, de R$ 54,2 bilhões.
Outra ineficiência na administração portuária é a gestão exercida pelas Companhias Docas. Imaginando que permaneçam no setor, a MP 595 também busca incentivar o aprimoramento da Docas, determinando que a Secretaria de Portos da Presidência (SEP) firme com elas, compromissos de metas e desempenho. A SEP, portanto, terá papel fundamental no desenvolvimento e na competitividade do setor, pois no caso de falência deste sistema, o risco de esvaziamento de portos organizados será acentuado. Por esta razão, a MP traz inclusive incentivos econômicos, além das metas e padrões de desempenho, para que a gestão das Docas seja eficiente e permita que arrendatários de terminais em portos organizados não restem prejudicados pela ineficiência dos portos em que instalados.
O modelo de arrendamento para os terminais portuários também permanecerá existindo, mas a possibilidade de perpetuação dos arrendamentos parece não mais estar em pauta. A MP impõe a licitação dos contratos vencidos e vincendos, permitindo apenas a prorrogação contratual quando expressamente prevista. Neste caso, contudo, o risco é a imposição de regras que possam causar impacto tal qual o percebido no setor elétrico, pois a MP deixa claro que haverá revisão de valores e novas obrigações de investimento e movimentação de cargas.
Outro aspecto de suma relevância é o chamado Programa Nacional de Dragagem, que dividirá os portos organizados em grupos definidos de acordo com a demanda de serviços. Estes grupos poderão contratar, por prazo de 10 anos e sob as regras do Regime Diferenciado de Contratações (RDC) — ao invés da Lei 8.666/93 — serviços de dragagem e manutenção das áreas portuárias e hidroviárias. O sucesso neste programa é de fundamental importância para o aprimoramento dos portos organizados, pois facilitará o acesso e manobra de navios, melhorando o fluxo e a eficiência da operação portuária.
A organização do setor portuário continua complexa, mas talvez seja este um fado pouco solucionável no setor. As preocupações de segurança nacional, o serviço alfandegário, a vigilância sanitária, dentre outros, tornam o ambiente necessariamente pluriparticipativo. No entanto, com a concentração dos portos na SEP (inclusive lacustres e fluviais) e a definição de atribuições claras e relevantes à Antaq, a organização começa a ficar mais transparente. Além disso, o Decreto 7.861 criou o Conaportos, órgão de participação dos múltiplos agentes de governança do setor, que poderão desenvolver métodos e soluções mais eficientes para a operação portuária.
Assim, superadas as inseguranças ainda vigentes por conta do necessário processo de conversão da MP em lei ordinária — o que pode até desconfigurar o novo marco regulatório —, o aprimoramento do setor portuário parece certo. Por óbvio, outros tantos aspectos poderiam ser aprimorados, mas este primeiro passo parece firme e para frente. Soma-se a isso os correlatos investimentos em ferrovias, rodovias e aeroportos, que poderão tornar o setor de transporte e logística um setor efetivamente existente, importante e que funcione em benefício nacional. A situação atual é grave e merece muito investimento e boa gestão.

Rosane Menezes Lohbauer é advogada, sócia do escritório Madrona Hong Mazzuco Brandão – Sociedade de Advogados.
Rodrigo Sarmento Barata é advogado, associado do escritório Madrona Hong Mazzuco Brandão – Sociedade de Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 3 de janeiro de 2013

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