Para atender o Fisco, empresas brasileiras terão dois balanços
Por Fernando Torres | Valor NOVA YORK – A Receita Federal surpreendeu a todos nesta terça-feira ao decidir ressuscitar o padrão contábil brasileiro antigo, vigente até o fim de 2007. Sem chegar a um acordo com as empresas sobre como tratar do ponto de vista tributário as mudanças trazidas pela migração para as normas internacionais de contabilidade (IFRS), iniciada em 2008, o Fisco optou pelo caminho mais fácil — para ele — e decidiu obrigar as empresas a manter duas contabilidades separadas: uma para os acionistas e outros interessados, seguindo o IFRS, e outra para fins tributários, pelo modelo contábil que vigorava no Brasil até a edição da Lei 11.638/07. Nunca antes na história do país se viu algo assim, apesar das diferenças de critérios sempre presentes. A novidade, chamada de Escrituração Contábil Fiscal, consta da Instrução Normativa 1.379 da Receita Federal, publicada hoje no Diário Oficial da União, e que vale para os balanços de 2014. No documento, o Fisco deixa claro também que só será isenta a distribuição de dividendos feita com base no “lucro fiscal”, apurado conforme legislação vigente até 2007, e não o lucro apurado no IFRS, como muitos entenderam que seria e alguns vinham distribuindo desde 2008. A Receita Federal também diz que a dedutibilidade do juro sobre capital próprio (uma forma de pagamentos aos acionistas) será calculada pela incidência da Taxa de Juros de Longo Prazo sobre o “patrimônio líquido fiscal”, e não sobre o patrimônio societário ajustado pela conta de “ajustes de avaliação patrimonial”, presente apenas no IFRS, como prevê a Lei 11.941, que instituiu o Regime Tributário de Transição (RTT). Há dúvidas entre especialistas se a Receita entenderá que as determinações referentes a dividendos e JCP vão valer a partir de 2014, ou se incluem também o período de 2008 a 2013, o que pode abrir espaço para questionamentos legais. “Se for daqui para frente, ainda que se possa questionar a decisão, será uma evolução, porque resolverá uma pendência tributária com as empresas. Caso contrário, será um retrocesso”, diz o professor de contabilidade Eliseu Martins, da FEA-USP. A Escrituração Contábil Fiscal será uma demonstração financeira completa, com direito a balanço patrimonial, conta de resultados e mutação do patrimônio líquido. Tudo duplicado, para atender o Fisco. De acordo com Alexsandro Broedel, ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e professor da FEA-USP, o caminho de se criar uma segunda contabilidade, que ele classificou como uma “revolução”, deve garantir a neutralidade fiscal, que era uma demanda das empresas na época da adoção do IFRS. Ou seja, elas só aceitavam adotar um novo sistema contábil se isso não significasse mudança na carga tributária vigente até então. Por outro lado, Broedel entende que a opção adotada pelo Fisco, que venceu a ideia de se fazer apenas ajustes a partir do lucro societário, elevará muito o custo das empresas. “Não sei se é a decisão mais eficiente do ponto de vista econômico”, diz ele. Atualmente, no âmbito do RTT, as empresas fazem o balanço em IFRS, apuram o lucro societário, e apenas ajustam as diferenças em relação à regra contábil vigente em 2007 por meio de um sistema chamado FCont. O resultado final é o mesmo, mas agora as empresas vão ter que preparar balanços completos, linha a linha, no padrão antigo. O mercado esperava que o fim do período de transição fosse marcado com uma regulamentação desses ajustes. E não com a exigência de um novo balanço, o que exigirá investimentos em sistemas e processos internos.
Fonte: Valor EconômicoAssociação Paulista de Estudos Tributários
http://www.apet.org.br/noticias/ver.asp?not_id=18705
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