Dúvidas frequentes sobre a aplicabilidade da alíquota de 4% nas operações interestaduais com mercadorias importadas
Fonte: FISCOSOFT
Joana Bete Chaves de Azevedo*
Com o objetivo de por fim à "Guerra dos Portos", a Resolução do Senado Federal nº 13/2012 determinou a aplicabilidade, desde 1º.01.2013, da alíquota de 4% (quatro por cento) nas operações interestaduais com mercadorias importadas que, após seu desembaraço aduaneiro não tenham sido submetidos a processo de industrialização, ou ainda que submetidos a qualquer processo de transformação, beneficiamento, montagem, acondicionamento, reacondicionamento, renovação ou recondicionamento, resultem em mercadorias ou bens com Conteúdo de Importação superior a 40% (quarenta por cento).
De início, conforme já foi aclarado em outros artigos e matérias publicadas, a referida Resolução determinou a inaplicabilidade da alíquota de 4%:
a) nas operações interestaduais aos bens e mercadorias importados do exterior que não tenham similar nacional, definidos em lista constante na Resolução Camex nº 79/2012;
b) aos bens produzidos em conformidade com os processos produtivos básicos de que tratam o Decreto-Lei nº 288/1967, e as Leis nºs 8.248/1991, 8.387/1991, 10.176/2001 e 11.484/2007;
c) às operações que destinem gás natural importado do exterior a outros Estados.
Sem entrar no mérito das noções introdutórias do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), o presente artigo tem por objetivo esclarecer dúvidas quanto à aplicabilidade da referida alíquota, em situações diárias, por parte dos profissionais que atuam, efetivamente, com operações interestaduais com produtos importados.
I - Operações internas e desembaraço aduaneiro das mercadorias
Conforme determina o artigo 155, § 2º, inciso IV da Constituição Federal, as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação podem ser estabelecidas por meio de resolução do Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros.
A alíquota estabelecida pela Resolução do Senado Federal nº 13/2012é aplicável somente em relação às operações interestaduais. A competência para estabelecer alíquotas aplicáveis às saídas internas é pertencente aos Estados e Distrito Federal. Desta forma, as alíquotas utilizadas nas operações internas ou no desembaraço aduaneiro das mercadorias importadas são aquelas previstas na legislação interna de cada UF.
II - Diferencial de alíquotas
Em consonância com o artigo 155, § 2º, inciso I da CF, o artigo 19 da Lei Complementar nº 87/1996 dispõe que o ICMS é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.
O artigo 20 da referida lei assegura ao contribuinte do ICMS o direito ao crédito do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
O diferencial de alíquotas é recolhido quando das aquisições interestaduais por contribuintes do imposto de bens e mercadorias destinadas ao uso, consumo ou ativo permanente do estabelecimento adquirente, quando a alíquota interna aplicável à operação com a mercadoria adquirida for superior à alíquota aplicável à operação interestadual.
Após a entrada em vigor da alíquota interestadual de 4% dúvidas surgiram no tocante à alíquota a ser considerada no cálculo do diferencial de alíquotas nas aquisições de bens importados de outras Unidades da Federação. Tal questionamento decorre do fato de algumas UF's, como por exemplo, São Paulo e Minas Gerais, anteriormente ter como aplicável nas aquisições interestaduais apenas a alíquota interestadual de 12%, inclusive, internalizando tal previsão em seus dispositivos que tratam sobre diferencial de alíquotas.
Diante da previsão de aplicabilidade de nova alíquota interestadual, em obediência à LC nº 87/1996, que dispõe que "o imposto a pagar será o valor resultante da aplicação do percentual equivalente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual", bem como em cumprimento do princípio da não-cumulatividade do imposto, no cálculo do diferencial de alíquotas o contribuinte adquirente da mercadoria observará a alíquota interestadual que foi aplicada à operação. Logo, em se tratando de operação interestadual com produtos importados sujeitos à alíquota de 4%, esta será a alíquota a ser utilizada para fins de créditos da operação anterior.
II.1 - Diferencial de alíquotas - Simples Nacional
Os profissionais que atuam na área tributária deparam-se com dúvida semelhante na entrada de mercadoria destinada a industrialização ou comercialização, material de uso e consumo ou bem do ativo permanente, remetido por contribuinte localizado em outro Estado ou no Distrito Federal, em estabelecimento de contribuinte sujeito às normas do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - "Simples Nacional".
Tal incerteza poderá ser aclarada ao consultar o artigo 13, § 1º, inciso XIII e o § 5º da Lei Complementar nº 123/2006. Referida lei determinou que a diferença entre a alíquota interna e a interestadual nas aquisições interestaduais será calculada tomando-se por base as alíquotas aplicáveis às pessoas jurídicas não optantes pelo Simples Nacional.
Desta forma, está claro que o recolhimento será da "diferença entre a alíquota interna e a interestadual". Uma vez que foi adotada a alíquota interestadual de 4%, o imposto a ser recolhido corresponderá a diferença entre a aplicabilidade desta alíquota e da alíquota interna aplicável à operação.
III - Operações interestaduais subsequentes
A aplicabilidade da alíquota interestadual de 4%, nos termos da Resolução do Senado Federal nº 13/2012, não se limita apenas a primeira saída interestadual, não custando esclarecer que, uma vez que o referido ato estabeleceu a aplicabilidade nas operações interestaduais, conclui-se que o contribuinte de São Paulo ao remeter a mercadoria importada para contribuinte mineiro aplicará a alíquota de 4% e este, por sua vez, também aplicará a alíquota de 4% na operação destinada a contribuinte capixaba ou localizado em outra Unidade da Federação.
Caso o contribuinte que recebeu a mercadoria de outra UF resolva comercializá-la no mercado interno, aplicará a alíquota interna da UF em que o produto for comercializado.
IV - Destinatários não contribuintes, inclusive empresas de construção civil
Em relação às operações interestaduais destinadas a não contribuintes do imposto, o artigo 155, § 2º, inciso VII da Constituição Federal estabelece que nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outra Unidade da Federação, será adotada:
a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto;
b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele.Logo, não há aplicabilidade de alíquotas interestaduais quando o destinatário da mercadoria não for contribuinte do ICMS, consumidor final.
No tocante às empresas de construção civil, o fato de possuir Inscrição Estadual não prova a sua condição de contribuinte do imposto. Logo, do mesmo modo que foi disposto anteriormente, em regra será aplicável na operação, mesmo que praticada com mercadoria importada, a alíquota interna da UF remetente.
Cabe ao remetente da mercadoria questionar se de fato o adquirente é contribuinte do imposto, ou seja, se realmente pratica operações com destaque do ICMS ou se a Inscrição Estadual é apenas para transporte de materiais de uma obra para outra. Caso o adquirente localizado em outra UF comprove a sua condição de contribuinte do imposto, será aplicável na operação interestadual com produtos importados a alíquota de 4%.
É importante observar que a Nota Técnica 2012/005 tratou da repercussão da aplicabilidade da alíquota de 4% nas operações interestaduais sobre a NF-e, basicamente pela alteração do campo de Origem da Mercadoria, que passou a assumir novos valores, bem como pela criação de regra de validação específica conferindo a aplicação da alíquota de 4% definida na legislação para as operações interestaduais com mercadorias e bens importados.
Visando permitir a validação da NF-e com data de emissão igual ou superior a 01.01.2013, na operação de saída para outra UF (CFOP inicia por 6), hipótese em que não será utilizada a alíquota interestadual de 4%, referida Nota Técnica determinou que no preenchimento do campo Inscrição Estadual conste a informação "ISENTO" ou nulo quando a origem da mercadoria for 1, 2 ou 3 e o CST de ICMS igual a 00, 10, 20, 70 ou 90. Cumpre-nos informar que, considerando que as empresas de construção civil possuem Inscrição Estadual, mesmo que informada a IE do destinatário, a regra de validação aceita a alíquota diversa de 4% nas operações com os CFOP 6107, 6108 (utilizados nas operações interestaduais destinadas a não contribuinte).
V - Cálculo da substituição tributária
O artigo 8º, § 5º da LC nº 87/1996 determina que o imposto a ser pago por substituição tributária, corresponderá à diferença entre o valor resultante da aplicação da alíquota prevista para as operações ou prestações internas do Estado de destino sobre a respectiva base de cálculo e o valor do imposto devido pela operação ou prestação própria do substituto.
Logo, se a operação do substituto está sujeita a aplicabilidade da alíquota de 4%, este será o percentual a ser utilizado no cálculo para fins de abatimento do ICMS da operação própria, bem como no cálculo da MVA Ajustada.
VI - Benefícios fiscais
O Convênio ICMS nº 123/2012 determinou que na operação interestadual com bem ou mercadoria importados ou com conteúdo de importação, sujeitos à alíquota do ICMS de 4%, prevista na Resolução do Senado Federal nº 13/2012, não se aplica benefício fiscal, anteriormente concedido, exceto se:
a) de sua aplicação em 31 de dezembro de 2012 resultasse carga tributária menor que 4% (quatro por cento);
b) tratar-se de isenção.
Da leitura do referido Convênio, entende-se que continuarão a ser aplicados os benefícios fiscais que já estabeleciam tratamento tributário para operações interestaduais com produtos importados, quando mais benéficos do que a aplicação da alíquota interestadual de 4%.
VII - Manutenção de crédito
Em relação à manutenção do crédito pago por ocasião do desembaraço aduaneiro, quando a operação posterior for tributada pela alíquota de 4%, no Estado de São Paulo o artigo 71, inciso I do RICMS/SP determina a constituição de crédito acumulado do imposto, dentre outras hipóteses, o decorrente de aplicação de alíquotas diversificadas em operações de entrada e de saída de mercadoria.
Anteriormente, se o consulente adquirisse a mercadoria importada tributada pela alíquota interna de 18% e comercializasse na operação interestadual pela alíquota de 7% ou 12%, em razão do princípio da não-cumulatividade, também era assegurada a manutenção do crédito da aquisição.
Logo, no que diz respeito à manutenção do crédito, entendemos que o consulente continuará creditando nos termos da legislação interna de sua UF, da forma vigente antes da aplicação da alíquota interestadual de 4% com as mercadorias importadas.
VIII - Considerações finais e legislação
Um assunto de interesse dos profissionais encarregados de aplicar, efetivamente, as novas alterações nas operações interestaduais, diz respeito ao cálculo do conteúdo de importação. O Ajuste SINIEF nº 19/2012 determinou que considerasse valor total da operação de saída interestadual, o valor total do bem ou da mercadoria incluídos os tributos incidentes na operação própria do remetente, entretanto, não informou se antes de efetuar o cálculo o contribuinte deverá formar o preço utilizando a alíquota interestadual de 4% ou 12%, deixando de levar em consideração que o ICMS é um imposto calculado "por dentro" e tal critério poderá ser definidor da alíquota que será aplicável.
Outra questão não menos relevante é a determinação, nos termos da cláusula sétima do Ajuste Sinief nº 19/2012, da informação do valor da importação em campo próprio da Nota Fiscal Eletrônica - NF-e. A nosso ver, tal determinação não levou em consideração a abertura do preço de aquisição, fato este de alta relevância para a atividade econômica do contribuinte do imposto.
Sem estender-se ainda mais no assunto, entendemos que as legislações que foram publicadas até a presente data visaram aclarar a aplicabilidade da referida alíquota, entretanto, ainda há procedimentos a serem praticados pelos contribuintes que não foram devidamente definidos ou situações que, da forma como foram disciplinadas, deixaram lacunas a serem preenchidas por meio de novas determinações legais.
*Advogada. Pós-graduanda em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC. Consultora Júnior de Tributos Indiretos da Thomson Reuters - FISCOSoft.
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