Pratini defende exportação com mais valor agregado
Marcelo Beledeli
Fredy Vieira/JC
Ex-ministro diz que o Brasil é muito bonzinho com parceiros comerciais
O agronegócio brasileiro vem colecionando números recordes nos últimos anos. A safra de grãos em 2012 foi a maior da história, alcançando 166 milhões de toneladas, e deve ser ultrapassada pela colheita de 2013, que pode chegar a 180 milhões de toneladas. Nas proteínas animais, o País também apresenta crescimento de exportações. Somente na carne bovina, foram US$ 5,769 bilhões em vendas externas, o maior valor já registrado. No entanto, o sucesso do Brasil é desafiado por barreiras comercias e dificuldades internas. Esse alerta vem do ex-ministro da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento (1999-2002) e de Minas e Energia (1992) Marcus Vinícius Pratini de Moraes, que esteve recentemente em Restinga Seca, no Centro do Estado, para uma palestra na Faculdade Antonio Meneghetti.
Hoje atuando como presidente dos comitês de estratégia empresarial e sustentabilidade do Grupo JBS, além de integrar outros conselhos empresariais, Pratini aponta que o Brasil precisa agir com mais firmeza em suas relações comerciais com outros países, a fim de garantir o espaço de nossos produtos nos mercados internacionais. Além disso, o ex-ministro destaca a falta de investimentos em logística de transporte para incentivar a competitividade e a necessidade de uma política de agregação de valor aos produtos nacionais.
Jornal do Comércio - As exportações do agronegócio brasileiro, especialmente as de carnes, sofrem constantemente bloqueios comerciais de países compradores devido a alegações sanitárias. Por que isso ocorre com tanta constância? A defesa sanitária brasileira realmente deixa a desejar?
Marcus Vinícius Pratini de Moraes - Acho que as restrições no mercado internacional inspiradas por argumentos sanitários são, em geral, inconsistentes. Temos que estar preparados para dar informações quando surge esse tipo de crítica ou restrição. Esclarecer, agir rapidamente, contestando aquilo que um país possa estar eventualmente levantando contra o Brasil. Rápida resposta, esse é o segredo.
JC - Alguns representantes do setor já alegaram que existe uma “má vontade” de alguns países à carne brasileira. O senhor acredita nisso?
Pratini - Eu acho que não há má vontade dos outros países. Nós é que somos muito bonzinhos com eles. Se alguns países utilizam politicas restritivas, inspiradas inclusive por questões supostamente sanitárias, temos que fazer a mesma coisa. Isso sempre deu certo. O Brasil tem sido muito bonzinho com seus parceiros comerciais, não gosta de enfrentamentos. Mas na área sanitária, para acessar mercados, é preciso ter firmeza e enfrentar os problemas. Os outros não vão ser bons conosco, e não precisamos ser com ninguém. O que precisamos é ter sempre uma boa justificativa técnica para quaisquer ações que eventualmente venhamos a tomar.
JC - Esses embargos seriam incentivados por outros países exportadores?
Pratini - Claro que parte disso é inspirada pelos nossos concorrentes na Europa, que não querem nos ver competindo naquele mercado. Por isso, costumo dizer que essa história de liberdade de mercado é tese para curso de faculdade. Na prática, todos os países defendem seus mercados com unhas e dentes. Tínhamos que fazer a mesma coisa. O Brasil é muito passivo nesse terreno. Temos que ter mais firmeza na defesa de nossos interesses. Isso eu procurei fazer quando estava no governo, e imagino que outras pessoas têm procurado fazer. Mas uma coisa é clara, temos que agir com velocidade, até para desmascarar eventuais acusações inconsistentes.
JC – Mesmo com os bloqueios recentes, as exportações brasileiras de carne têm crescido. Isso significa que esses mercados que deixaram de comprar não são mais tão importantes?
Pratini - Isso demonstra que há muito exagero no anúncio dessas restrições e na sua eficácia. Continuamos crescendo nas exportações e vamos continuar. Não podemos nos assustar. O mundo precisa do Brasil para comer, tanto em matéria de proteína vegetal como animal. Mas precisamos estar preparados para responder a acusações de concorrentes que querem tomar nosso mercado. A carne brasileira é a melhor do mundo, é a mais sadia e se desenvolve cada vez mais.
JC - No mercado interno, a recente isenção de impostos para a carne nas vendas do varejo deverá ter efeito sobre a produção?
Pratini - Na verdade, o que o Brasil mais tem é excesso de impostos, que são instrumentos que aumentam a taxa tributária sobre os mais pobres. Temos que reduzir os impostos indiretos, sobretudo sobre vendas. Com isso, vai haver aumento de consumo, influenciando a produção. A única coisa neste País que é realmente eficaz é a brutal taxação, que já representa hoje 40% da arrecadação. Se não diminuirmos isso, não voltaremos a crescer. A melhor maneira de ter crescimento é reduzindo a carga tributaria sobre a economia.
JC - Este ano a perspectiva é de uma nova supersafra de grãos. Os resultados do agronegócio deverão gerar efeitos positivos na economia?
Pratini - Teremos de novo um ano muito bom em volume e preços, e temos que continuar buscando esse objetivo. Mas não podemos só ficar dependendo disso. O que me deixa preocupado é a repetição dessa história que se a safra for boa o Brasil vai andar bem. Não é bem assim. Problemas sempre podem acontecer. Também me preocupa um pouco o fato de permitirmos que aumente nossa dependência econômica de produtos primários, para exportação. Isso não é bom.
JC – Qual a estratégia que o Brasil deveria ter, então, para o agronegócio?
Pratini - Falta para o Brasil uma política geral de industrialização da produção agrícola. A Argentina hoje tem mais uma capacidade de esmagamento de soja maior do que a nossa. Isso porque eles se deram conta de que era melhor negócio exportar farelo de soja e extrair o óleo. Por que o Brasil dá esse privilégio para nossos parceiros do Mercosul? Enquanto nós exportamos soja em grão, os outros embarcam farelo e óleo. Isso é algo que ocorre há muito tempo e tem que ser corrigido. Temos que aumentar o valor agregado das exportações. Por exemplo, temos que vender mais carne de porco, frango e bovinos. Essa deve ser nossa posição agora.
JC - Em 2012, quando o preço do milho teve alta elevação no mercado internacional, alguns representantes das cadeias de aves e suínos chegaram a defender a imposição de barreiras à exportação do grão para atender à alimentação dos animais. O senhor acha que essa seria uma medida válida para incentivar a agregação de valor?
Pratini - Do ponto de vista estratégico, sou contra esse tipo de restrição contra as exportações. Mas se for necessário fazer isso para defender os interesses brasileiros, que se estabeleçam embargos. No final, temos que fazer as contas, o que é melhor para o Brasil? Restringir a exportação? Não podemos ter medo nem preconceito de fazer nada. O que precisamos é buscar a eficácia da ação do setor público para maximizar renda e criação de oportunidade de trabalho.
JC - Qual é o maior gargalo para o crescimento do agronegócio brasileiro? A falta de investimentos em logística?
Pratini - Nossa maior restrição hoje são as dificuldades de logística e transporte, do interior ao porto, e do porto ao mercado consumidor. Esse problema no Brasil é dramático. Historicamente nos ocupamos pouco do tema e demoramos para tomar decisões. Agora há um novo horizonte nessa área, com projetos da União e dos estados, que espero que funcionem e aliviem os custos de transporte das zonas produtoras até o embarque. Mas não dá para esperar que o governo faça isso, pois nunca cumpre tudo o que promete. Então é preciso que os produtores e empresários ajam no sentido de melhorar a condições de frete de transporte, assim como investimentos em armazenagem.
JC - Diz-se que o produtor brasileiro é eficiente dentro de sua propriedade, mas que os problemas começam a partir da saída da porteira. O senhor concorda com essa visão?
Pratini - Sempre fui acusado de otimista. Quando falava que o Brasil ia produzir 100 milhões de toneladas de grãos, disseram que eu estava maluco. Passamos disso, hoje produzimos quase 200 milhões de toneladas. Somos imbatíveis nas áreas de proteínas animais e vegetais. O que precisamos é investir exatamente na parte de logística e transporte. E também muito em marketing, criar nossas marcas e agregar valor em produtos. Não somos muito bons nisso ainda, mas podemos e precisamos melhorar.
http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=119877
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