Polêmica cerca cobrança do IPI para importadores
Cobrança de uma segunda parcela do IPI sobre empresas importadoras de mercadorias vem sendo discutida judicialmente e pode levar a uma revisão da legislação fiscal. Objetivo da medida, segundo o fisco, é proteger a economia nacional
Decisão tomada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) que põe fim ao pagamento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na revenda de mercadoria importada começa a lançar dúvidas. O questionamento se refere à manutenção da cobrança após o recolhimento realizado na entrada dos produtos no País. Enquanto as empresas reclamam do custo, que totaliza, em média, 10% do valor final do produto importado (valor com base na Tabela de Incidência do IPI – Tipi), o fisco se ampara no caráter regulador do tributo, responsável por garantir a competitividade interna.
O IPI integra o grupo das contribuições parafiscais, ou seja, foi criado com o objetivo de, além de suprir as necessidades arrecadatórias do País, corrigir desequilíbrios na economia. Segundo o auditor-fiscal da Divisão de Fiscalização da superintendência da Receita Federal do Brasil no Rio Grande do Sul, Jorge Lopes da Silveira, a segunda cobrança do tributo equaliza os preços no mercado interno e é crucial para a manutenção de uma indústria saudável.
Seletiva, a tarifa tem alíquota variável de acordo com a essencialidade do produto e dos interesses políticos e econômicos. Graças a isso, a alíquota do IPI sobre medicamentos, inclusive importados, é zero. Na contramão, o IPI que recai sobre o cigarro, por exemplo, corresponde a 15% do preço de venda no varejo, resultando em uma alíquota efetiva de 45% sobre o preço de venda a varejo dos produtos.
Além disso, o imposto não é cumulativo, o que garante à empresa a possibilidade de abatimento em cada etapa do processo de pagamento daquilo que já foi liquidado. Dessa maneira, a parcela cobrada na entrada do produto no País pode ser abatida no total devido ao pagar a segunda parcela.
Com tantas particularidades, não é de surpreender que o Imposto sobre Produtos Industrializados suscite muitas discussões. Aos trâmites de importação de um produto recaem, ainda, o Imposto de Importação (II), Programa de Integração Social (Pis) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
Não há dúvida quanto ao pagamento na saída de produto do estabelecimento industrial. No entanto, as importadoras – equiparadas a estabelecimento industrial através da Lei 4.502, de 1964, que serve como base para o Regulamento do IPI – estão relativizando a necessidade de se preocupar com o mecanismo de equiparação com as necessidades do mercado interno.
O recolhimento da alíquota de correção dos estabelecimentos importadores não-industriais pode ter reflexos tanto nas empresas interessadas quanto na economia do país. Todos concordam que a extinção do dispositivo corre o risco de deixar a indústria nacional vulnerável e refletir na queda da arrecadação e nos níveis de emprego.
“Com essa possível mudança, corre-se sim o risco de os preços dos produtos importados ficarem iguais ou abaixo dos nacionais”, alerta o contador Maurício Gatti, proprietário do escritório Gatti Contabilidade e diretor financeiro do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis do Estado (Sescon/RS).
Já o contador e supervisor fiscal da Gatti Contabilidade, Ademir Vanzella, defende que, em tese, não precisaria haver mais essa cobrança já que existem outros mecanismos com o papel de garantir a tributação justa dos produtos oriundos de outras nações.
Receita Federal rebate alegação de que tarifa constitui bitributação
Constantemente chamada de bitributação, a tarifa de equiparação à cobrança sobre artigos produzidos internamente não pode ser entendida como tal, explica o auditor-fiscal da Receita Federal Jorge Lopes da Silveira. Segundo ele, a bitributação só é configurada quando entes diferentes tributam duas vezes sobre o mesmo fato jurídico.
Outra confusão comum diz respeito ao “bis in idem”, quando dois impostos incidem sobre a mesma base e são destinados ao mesmo ente. “O único exemplo de Bis in Idem no Brasil é a incidência do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), em que os dois se baseiam no lucro da empresa e cabem à União”, salienta.
A exigência de IPI na revenda de mercadorias importadas por empresas importadoras não se enquadra em nenhum dos dois casos. O tributo faz parte da famílias dos parafiscais e é pago em duas parcelas com o objetivo de adequar o imposto calculado com base no valor de entrada do bem ao que deveria recair, tendo como base o valor pelo qual o produto é vendido pela empresa importadora.
Além disso, Silveira lembra que a União tem o direito de decidir sobre temas como isenção fiscal, tarifa externa e acordos comerciais. “Isso tudo faz parte da soberania nacional. São ajustes da economia que a mantém estável”, enfatiza.
“A lei é para corrigir desequilíbrios dentro da nossa economia, algo que todos os países fazem”, define o superintendente-adjunto da RFB no Rio Grande do Sul, Ademir Gomes de Oliveira. “Mas também é comum a Receita Federal se adequar às decisões judiciais”, rebate o contador Maurício Gatti, não escondendo a expectativa de um aperfeiçoamento no texto do regulamento. A decisão ainda pode ir à discussão no Superior Tribunal Federal (STF). Cabe à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) pode se manifestar colocando em xeque a resolução do STJ.
Empresas podem aproveitar abertura de precedente para debater recolhimento
Decisões recentes do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) deram novo fôlego aos questionamentos em torno do recolhimento da parcela de correção do IPI. Após anos em tramitação, empresas tiveram ganho de causa e a revogação da cobrança. A dúvida sobre uma adequação da legislação pela Receita Federal continua, mas surgem precedentes para mais empresas levarem a discussão aos tribunais.
Segundo Arthur Veirano, advogado do Veirano Advogados e presidente do Instituto de Estudos Tributários, as decisões são inovadoras na jurisprudência e podem colaborar com aqueles que desejam extinguir a prática tributária. A Sistemática dos Recursos Repetitivos, mecanismo utilizado pelo Superior Tribunal Justiça para manter a coerência entre os casos, pode dar brecha para que as outras empresas se “filiem” à decisão e conquistem a redução da alíquota.
A matéria é polêmica ainda porque, dentro do princípio da não cumulatividade, apenas as empresas tributadas pelo lucro real ou lucro presumido podem usar o crédito para abater da “segunda alíquota”, explica o supervisor fiscal da Gatti Contabilidade, Ademir Vanzella. No entanto, as empresas incluídas no Simples Nacional não podem usar o crédito do IPI.
O Regulamento do IPI (Ripi) explicita que o estabelecimento inscrito no Simples não poderá aproveitar qualquer tipo de crédito de IPI, uma vez que a inscrição em tal regime veda a apropriação ou a transferência do crédito relativo ao imposto.
Demais organizações equiparadas a estabelecimento industrial também podem discutir o recolhimento do IPI após o desembaraço aduaneiro. Para se proteger de possíveis sanções, Veirano indica que elas façam um pedido de liminar para suspensão da cobrança – ação arriscada pois, se a causa não tiver êxito, a pessoa jurídica poderá ter de recolher o valor devido com juros - ou realizem depósito em juízo do montante relativo à parcela do IPI.
Fonte: Jornal do Comércio – RS
http://www.legisweb.com.br/noticia/?id=12176
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