País tem recorde de antidumping
Política de defesa comercial brasileira renova resoluções e reduz prazos para iniciar medidas provisórias que coibam a prática abusiva de preços
ANNA PAULA FRANCOO Brasil foi o país mais protecionista do mundo em 2013. O número de medidas antidumping aplicadas pelo país quase triplicou em relação ao ano anterior, passando de 16 para 43 (veja no infográfico). No total, o Brasil mantém 109 medidas de proteção comercial nas importações e protocolou 39 pedidos na Organização Mundial do Comércio (OMC) em 2013, chegando ao primeiro lugar no ranking mundial de países mais protecionistas, seguido pela Índia, com 35 ações antidumping no ano passado, Estados Unidos (34), Austrália (20) e Argentina (19).
Efeito
Ação quer incentivar desenvolvimento industrial
A previsão é de que, nos próximos anos, o descompasso entre as medidas protecionistas do Brasil e de outras grandes economias do mundo diminua. Durante a crise de 2008/2009, a Europa e os Estados Unidos investiram em compras governamentais para estimular suas indústrias e não deram atenção ao antidumping. “Com o fim desse efeito, a tendência é reequilibrar as medidas entre os mercados”, aposta Diego Bonomo, gerente da área de comércio exterior da CNI. Medidas são legais, apesar do conceito de protecionismo indicar aspectos negativos. E não devem ser encaradas como punitivas ao importador, de acordo com o advogado Pedro Bernardo Garcia, do escritório Vernalha Guimarães, de Curitiba. O instrumento, porém, não é suficiente para estimular a recuperação da indústria. “A ideia é reduzir a ameaça de dano ao preço e o atraso do desenvolvimento do mercado interno. Mas não é uma medida preventiva. Precisa estar ancorada em outros recursos, como reforma tributária, que contribuiria para o aumento da competitividade”, diz Garcia.
Para o diretor-executivo da Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Pneus do país, (Abidip), Milton Favaro Júnior, as medidas antidumping são necessárias para proteger o empresário brasileiro, mas o governo não as usa de forma adequada. “É preciso dar à indústria nacional infraestrutura para criar competitividade e não fechar mercado enquanto lá fora o desenvolvimento é competitivo. O antidumping não pode ser a única ferramenta para estimular a indústria”, diz. Outro fator importante para contribuir com o setor, segundo Favaro, é o aperto na fiscalização, como a adoção do sistema de nota eletrônica, que evita fraudes e já entrega ao fisco os valores recolhidos nas transações.
As medidas antidumping são solicitadas pela indústria nacional quando há suspeita de prática de preço abusivo, abaixo do valor de produção no mercado de origem, com a intenção de eliminar a concorrência. “Depois de formar a clientela, expulsar os concorrentes e dominar o segmento, o fabricante retoma o preço normal e o consumidor fica refém do preço reajustado”, explica Maurílio Schmitt, coordenador do Departamento Econômico da Fiep-PR.
A China e os Estados Unidos são os países contra os quais o Brasil mais impõe medidas protecionistas antidumping. Metais comuns, têxteis e plásticos e borrachas são os segmentos mais sobretaxados. Das 43 medidas publicadas em 2013, pelo menos dez foram para renovação de antigos processos, que têm duração máxima de cinco anos. Segundo informações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), a situação atual do país é resultado das petições feitas em 2011.
A defesa comercial é um dos pilares do Plano Brasil Maior, política industrial e tecnológica do governo federal. E foi o motor das alterações da nova lei antidumping brasileira, publicada em outubro. “Tivemos muitos avanços. A concentração de informações no início do processo dá ao governo a oportunidade de aplicar os direitos provisórios de antidumping, reduzindo danos”, observa Diego Bonomo, gerente-executivo de comércio exterior da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
A redução do prazo de seis para quatro meses para expedição da determinação preliminar, requisito para aplicação de direitos antidumping provisórios, também deu agilidade à medida, lembra o advogado Bruno Fonseca Marcondes, do escritório Vernalha Guimarães, de Curitiba. A legislação brasileira tem ainda mecanismos que, para a indústria, são fatores de aprimoramento das medidas antidumping, como a investigação de origem in loco, com visita às indústrias suspeitas, inclusive as nacionais, no caso de defesa do dumping contra o Brasil; e a norma antielisão, que pretende evitar a evasão tributária, com a mudança de origem de emissão do produto. Ambas são características da legislação brasileira que não estão nos procedimentos adotados pela OMC.
Investigação atrasa indústria no Paraná
Nem sempre a indústria nacional é beneficiada com as medidas antidumping. O Grupo Sumitomo, fabricante dos pneus Dunlop, instalado em Fazenda Rio Grande, aguarda o encerramento do processo, aberto em junho de 2013, que incluiu o Japão e mais cinco países – África do Sul, Coreia do Sul, Rússia, Tailândia e Taipé Chinês – na investigação de dumping na importação de pneus de carga.
A Sumitomo abriu a fábrica de pneus de passeio no Paraná em outubro do ano passado, quando anunciou o lançamento da linha de pneu de carga, em um investimento total de R$ 1,7 bilhão. Para estabelecer mercado até que a produção própria seja viável, a empresa precisa importar o produto do Japão. “Se o país for incluído na nova investigação, a sobretaxação vai inviabilizar o negócio”, prevê Renato Baroli, gerente sênior de vendas e marketing da Dunlop no Brasil. A produção de pneus de carga deve começar em 2017, com a geração de mil empregos.
Integrante da Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (ANIP) desde janeiro de 2014, a Sumitomo espera que o governo brasileiro reconheça o investimento no mercado interno. “A Dunlop está retornando ao país, depois de vender sua fábrica aqui no fim da década de 1990. Vamos substituir a importação pela produção nacional e isso deve ser avaliado”, observa Baroli.
Presidente-executivo da ANIP, autora do pedido de investigação, Alberto Mayer considera que o investimento no Paraná não está ameaçado, apesar de o Japão estar incluído na nova investigação. “A empresa tem comprometimento. Há estratégias industriais para fazer a importação necessária para a indústria, além dos mecanismos para corrigir distorções na aplicação do direito”, explica.
Os maiores fabricantes de pneus no Brasil são multinacionais que estabeleceram plantas fabris no país, como é o caso da Sumitomo. Além da produção própria, respondem por 40% do total da importação de pneus e a Dunlop é a líder do ranking. O prazo para a investigação do dumping que inclui o Japão termina em junho deste ano, mas pode ser prorrogado por mais seis meses.
Independentes
Além da indústria, os importadores independentes também estão atentos aos resultados da investigação de dumping dos pneus de carga. Para o diretor-executivo da Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Pneus (Abidip), Milton Favaro Júnior, o intervalo que está sendo investigado é muito longo – de abril de 2011 a março de 2012 – estabelecido quase no limite dos 15 meses previstos na norma.
De acordo com relatórios da Receita Federal, neste período, os preços de pneu de carga japonês, na medida 295, a mais usada no Brasil, ainda estava na faixa de US$ 300. O valor caiu para US$ 219 no primeiro trimestre de 2013 e para US$ 177, no segundo trimestre. “Esse valor é semelhante ao praticado pela China que, mesmo com a sobretaxação, também é importado pela indústria nacional. Outros países de onde a indústria importa, como a Espanha, não entraram na investigação, mas também derrubaram os preços”, compara Favaro. A Abidip estuda entrar com pedido para equiparar a taxação para as coreanas, caso o antidumping para o Japão seja afrouxado. “Não sou contra o protecionismo. Só precisamos de regra clara”, diz.
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