LEGISLAÇÃO

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Custo Brasil



O peso do Custo Brasil: Imposto e logística podem ‘morder’ até 70% do preço dos produtos



Segundo especialistas em macroeconomia, a carga tributária está entre os gargalos que colocam o Brasil na berlinda quando o assunto é competitividade


Perla Ribeiro (perla.ribeiro@redebahia.com.br)


No carrinho do supermercado está parte dos produtos para a ceia do Natal. Tem peru, panetone, arroz, queijo, nozes, bombons, vinho, cerveja e refrigerante. Ao pagar a conta, além do custo dos produtos, o consumidor que levar esses itens para casa terá embutido na conta impostos que chegam a 55,6% do valor do produto (cerveja), além de custos logísticos que podem chegar a 20%. E se ele decidir incluir nas compras uma cachaça, aí serão 82% só de tributos.


Não é à toa que, segundo especialistas em macroeconomia, a carga tributária está entre os gargalos que colocam o Brasil na berlinda quando o assunto é competitividade. Somada a ela, entra a infraestrutura precária, a baixa qualificação profissional e a burocracia. E isso afeta toda uma cadeia de produção. É imposto sobre imposto, custo sobre custo e os preços vão lá para cima. Outro problema é a distorção na tributação: o imposto cobrado para um cachorro- quente (15%) é menor do que o arroz, o feijão e a carne (cada um com imposto de 17%).


Levantamento realizado pela Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba) na última safra mostra que os produtores baianos do Oeste têm um custo entre 20% a 30% mais alto do que o de outros estados do país. Atualmente, 100% da produção é escoada via transporte rodoviário.


Além do modal ter custos mais altos do que o ferroviário e o hidroviário, os produtores baianos ainda precisam encontrar saídas para manter-se competitivos convivendo com estradas muitas vezes esburacadas, deixando parte da safra pelo caminho. De acordo com o diretor de projetos e pesquisa em agronegócio da Aiba, Ernani Saboia, a saída tem sido as parcerias público-privadas (PPP) para a melhoria das rodovias.


Produtores entram com diesel, alojamento, caminhões para transporte dos trabalhadores e alimentação e os prefeitos com pessoal específico, máquinas e massa asfáltica. “Nossa região chove bastante e as vias estão há muito tempo sem manutenção adequada. As estradas são refeitas, mas não suportam, porque a malha asfáltica é muito antiga”, explica o diretor Ernani Saboia.


Ainda segundo ele, há lugares que os proprietários das transportadoras não querem ir buscar a carga por conta da situação das estradas, que não são boas. “O anel da soja é bastante deteriorado. Isso causa sérios problemas: acidentes, morosidade para retirada de produtos. Aumenta o consumo de combustível e influencia no custo”, avalia o diretor da Aiba.





Foto: Arte CORREIO


Custos extrasMas essa conta eles não pagam sozinhos. Quando colocam os números no papel, os produtores vão dividir esses custos com o consumidor. “Por conta de uma logística mais cara, nosso farelo fica mais caro e isso vai impactar no preço da carne”, acrescenta. Na prática, significa que, na outra ponta, a dona de casa também vai sentir o baque nas compras.


De acordo com o professor de cenários macro econômicos de MBAs da Fundação Getulio Vargas (FGV), Mauro Rochlin, o conjunto de problemas como logística, infraestrutura, burocracia e falta de mão de obra qualificada acaba se traduzindo no chamado Custo Brasil.


“A estrada ruim torna o transporte mais caro e, no final das contas, é o consumidor que paga esse custo. A mercadoria chega ao porto e tem que esperar dias para ser transportada, isso também significa custos com armazenagem”, explica Rochlin.


Segundo o especialista, o exportador de milho, por exemplo, paga pelo frete o mesmo valor que desembolsa pela mercadoria. “Os tributos também pesam. A cadeia toda sofre o peso do tributo, que é excessivo e maior do que o dos concorrentes externos. A mão de obra brasileira não tem o mesmo nível de qualificação de outros países. Por isso, a produtividade tende a ser menor e, quanto menor a produtividade, maior o custo”, explica o especialista.


Para Mauro Rochlin, esse foi um dos motivos para que o Brasil perdesse espaço para seus principais concorrentes no cenário global. “O custo da Coreia, da China e da Alemanha, por exemplo, é o mais baixo que o Custo Brasil. Isso incide nos preços”, explica.


Estudo do Fórum Mundial, que mede a competitividade levando em conta três indicadores referentes a eficiência e inovação, coloca o Brasil na 57ª posição no universo de 144 países. Dentre os membros dos Brics (grupo de países emergentes), só a Índia ficou num ranking pior. A África do Sul, a China e a Rússia ocupam posições melhores do que a do Brasil.


GargalosDe acordo com o superintendente de Desenvolvimento Industrial da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Marcus Verhine, a pesquisa atribui esse desempenho levando em consideração os principais gargalos do Brasil, a exemplo da ineficiência dos portos, da excessiva regulação tributária, da baixa qualificação no mercado de trabalho, da precária infraestrutura e dos elevados impostos. Se no Brasil o cenário ainda precisa melhorar, na Bahia, o cuidado deve ser ainda maior. “A Bahia está em desvantagem em relação ao Brasil”, destaca Verhine.


Estudo indica que pobres pagam mais impostos do que os ricosA carga tributária é alta e quem paga a maior parte da conta é quem tem menos poder aquisitivo. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), mais de 79% da população brasileira, que recebe até três salários mínimos por mês, contribui com 53% da arrecadação tributária total no país. Presidente executivo do IBPT, João Eloi Olenike diz que o sistema tributário brasileiro prioriza tributos em cima do consumo e muito pouco sobre a renda, o lucro e o patrimônio. Diferente de outros países, onde a tributação parte do ganho.

A consequência disso, segundo Olenike, é que o pobre acaba pagando muito imposto. “Como o sistema tributário brasileiro é extremamente concentrado no consumo, o pobre acaba, proporcionalmente, pagando mais. Isso faz com que a população de menor poder aquisitivo tenha um custo tributário muito elevado”. Com salário menor, o percentual pago com imposto acaba sendo maior do que quem tem melhor renda.


O especialista chama atenção ainda para o fato de que no Brasil a tributação incide em cascata. “Todas as etapas têm tributação que vão passando para a seguinte e fazem com que os produtos encareçam muito. A maior carga tributária é a da cachaça, que é 82%, por ser considerada um item supérfluo, assim como acontece com artigos de luxo e eletrônicos”, informa, acrescentando que o Brasil está entre os 30 países com pior retorno à população em função do bem- estar e retorno em serviços.


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