Os navios tramps também estão ilegais e oferecem riscos
Por inúmeras vezes explicamos que outorgar autorizações para armadores estrangeiros é um dever jurídico que a ANTAQ precisa cumprir imediatamente, pois a exploração do transporte aquaviário internacional, é Competência Exclusiva da União, elencada no Art. 21 da Constituição e que nenhum acordo bilateral, ou tratado internacional se sobrepõe àquilo que determina a nossa Carta Maior. Como a ordem constitucional econômica é plural e aberta, compete ao Estado regulador cumprir o preceito que determina a outorga de autorização. Da mesma forma, explicamos que as autorizações para exploração do transporte aquaviário internacional, em que a navegação de longo curso é uma espécie/gênero, não é um ato burocrático, sendo início, meio e fim para o ordenamento eficiente da navegação de um país que possui mais de 8.000 quilômetros de costas e que serve para viabilizar negócios na América do Sul, Central e parte da América do Norte.
Além das questões de regulação econômica que norteiam as autorizações aos armadores estrangeiros, é necessário avaliarmos também aquelas que envolvem a segurança da navegação. Hoje se verifica que o mercado e até mesmo a mídia especializada, estão muito focados no segmento de containers, principalmente em relação às grandes mega carriers do setor, tais como Maersk, MSC, CMA-CGM, Hamburg Süd etc. Armadores como esses, por exemplo, são os chamados liners, que operam com serviços de linha regular. Mapear as atividades dessas empresas no Brasil, através das outorgas de autorização, com critérios de outorgas subsidiárias, inclusive dos navios registrados em bandeira de conveniência, não é algo difícil de fazer, assim como cobrar garantias etc.
Os maiores riscos que temos, e que muitos não estão prestando atenção, são relacionados aos armadores e navios que não trabalham com serviços de linhas regulares, os chamados tramps, cuja tradução para o português significavagabundos, devido às características relaxadas dos navios e por não terem rotas fixas. As mercadorias embarcadas nos navios tramps, caracterizam-se pelo fato de serem matérias primas, em quantidades enormes, que alimentarão as grandes economias industriais do mundo. O foco dos navios operando em formato tramp é a carga a granel, em grandes tonelagens que proporcionam ganho em escala, tal como petróleo, produtos químicos, grãos, minério de ferro etc.
Para que se tenha uma ideia, cerca de 60% da nossa tonelagem de mercadorias exportadas é transportada por tramps. Porém, em quantidades absolutas de embarcações que tocam os nossos portos, os tramps não representam a maioria dos navios.
A maioria esmagadora dos navios tramps está registrada em bandeira de conveniência (paraísos fiscais) e muitas embarcações pertencem averdadeiras empresas de gaveta, registradas em nome de contadores ou laranjas desses paraísos, um verdadeiro risco aos exportadores, importadores e à segurança da navegação brasileira.
Existe uma corrente que defende que, uma vez cumprido o dever jurídico de outorgar autorizações aos tramps, a atividade seria inviabilizada no Brasil. Nós discordamos em gênero, número e grau dessa corrente e estamos certos de que, feitas com as devidas antecedências, cobrando-se garantias mínimas para o Brasil, os trâmites podem funcionar perfeitamente. Afinal de contas, nenhuma empresa toma um navio em afretamento do dia para noite, sem o devido e detalhado planejamento. Ademais, os armadores trampscaracterizam-se por buscarem cargas pelo mundo, indo onde elas estiverem, e todos estão muito bem estruturados e conectados comercialmente, há anos, através de uma imensa rede de brokers. Além disso, os seus agentes marítimos no Brasil podem muito bem providenciar suas outorgas.
Muitos navios tramps que tocam nossos portos e que navegam pelo nosso mar territorial estão em situação precária, verdadeiras latas-velha. Alguns, que aqui atracam, sequer podem entrar em portos Europeus e Norte-americanos, pelo risco que trazem. Nesses países que não recebem essas embarcações, as autoridades fazem exigências de segurança. Isso somente é possível quando os governos outorgam as suas autorizações, cujo deferimento ocorre posteriormente a uma análise prévia de documentos e certificações, que também envolvem os riscos à segurança da navegação.
Independentemente de liners ou tramps, precisamos organizar a nossa navegação de longo curso. Precisamos iniciar o resgate da nossa soberania, se um dia pretendermos restabelecer a nossa bandeira brasileira de navegação e a nossa Marinha Mercante. O Brasil precisa conhecer os armadores, as empresas de navegação e os navios estrangeiros que prestam serviços de transporte marítimo aos nossos exportadores e importadores. O Brasil precisa ordenar de fato a sua navegação de longo curso, fazendo que o controle da exploração do transporte aquaviário nacional e internacional esteja nas mãos de quem compete, ou seja, da União.
Não podemos admitir que a nossa Constituição e, consequentemente, as nossas normas infraconstitucionais sejam colocadas à margem, apenas porque alguns poucos entendem o ato de outorgar autorizações é mera burocracia, quando, na verdade, é justamente o oposto. A nossa Constituição está acima de tudo e deve ser respeitada, embora isso, no governo, só funcione na teoria, contrariando o juramento à nação que todos os nossos presidentes e vices fazem: “Prometo Manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil.”
Na lógica neoliberal, o mercado precisa do Estado para maximizar os seus lucros, mas odeia que o mesmo Estado por meio da ordem constitucional o regule. Enfim, quando um país admite o desrespeito à sua Constituição, seja pelo motivo que for, tudo está perdido.
André de Seixas
Criador e Editor do Site dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro
Osvaldo Agripino de Castro Junior
Advogado, Consultor jurídico da USUPORT-SC e do UPRJ, Pós-doutor em Regulação de Transportes - Harvard University
Advogado, Consultor jurídico da USUPORT-SC e do UPRJ, Pós-doutor em Regulação de Transportes - Harvard University
http://www.uprj.com.br/os-navios-tramps-tambem-estao-ilegais-e-oferecem-riscos.html
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