Cenário de exportação muda com alta para EUA e Europa e queda para China
Os dados da balança comercial do último quadrimestre mostram uma mudança nos destinos da exportação brasileira. Há recuperação nos embarques para Estados Unidos e União Europeia e uma inédita queda nas vendas para a China, além do aprofundamento da retração no comércio com a Argentina. E como a parte benigna desse cenário - a melhora da atividade nos países desenvolvidos - continuará presente em 2015, ela pode ajudar a economia brasileira.
Depois de anos de crescimento, as vendas para a China recuaram, influenciadas pela queda no preço da soja e do minério de ferro, movimento que também é reflexo do menor crescimento do país asiático. De janeiro a abril deste ano (sobre igual período de 2013), as exportações para a China ainda cresceram 13%, mas no segundo quadrimestre recuaram 8,8%. No acumulado do ano, o resultado é um pequeno crescimento de 0,9%, muito abaixo da alta de dois dígitos dos últimos anos
Parte da diferença entre os quadrimestres decorre da antecipação dos embarques de soja (após crescer 42% nos primeiros quatro meses, a exportação do grão recuou 13% de maio a agosto, sempre em relação a 2013), mas nos últimos meses há recuo em outras commodities, como minério de ferro e açúcar.
"A queda no preço das commodities foi generalizada e afetou o comércio com a China", observa Fabio Silveira, economista-chefe da GO Associados. Mais que a desaceleração da economia chinesa, a retração decorre da expectativa de alta dos juros americanos. A tendência, diz Silveira, é de novos recuos nas cotações desses itens.
Luís Afonso Lima, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e Globalização Econômica (Sobeet), afirma que 70% da exportação brasileira para a China é de soja e minério de ferro. Este ano, em média, o preço de exportação da soja foi 4% menor, enquanto a queda no minério passa de 15%, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex).
"O comércio com os chineses está desacelerando por fatores não tão conjunturais, pois envolve tanto preço como volume", diz Lima. Segundo ele, o menor crescimento em quantidade está relacionado à transição que o governo chinês está fazendo na economia e que visa aumentar o peso do consumo doméstico no Produto Interno Bruto (PIB).
Se a exportação para a China perde fôlego e os embarques para a Argentina caem cada vez mais, há sinais de recuperação das vendas para os mercados mais ricos. Sem petróleo, a venda de produtos brasileiros para os Estados Unidos manteve, nos dois quadrimestres, alta de 14% sobre o ano passado, o que indica uma recuperação bem consistente.
Com petróleo, o aumento foi de 16% no primeiro quadrimestre e 5,3% no segundo, mas como o volume do produto é muito volátil, ele esconde, um pouco, a recuperação nos outros itens. O Brasil está vendendo mais aviões, produtos de ferro e aço, celulose, máquinas e motores para os americanos.
"Nas exportações para os americanos, ocorre o inverso da China, pois o Brasil está vendendo mais celulose, soja e café", diz Silveira, listando diferentes commodities. Esse aumento, que também inclui alguns manufaturados, já é reflexo da retomada da economia americana, acrescenta o economista. "Qualquer suspiro no mercado internacional nos ajuda", afirma.
Também para a União Europeia há uma reversão positiva. Nos primeiros quatro meses do ano, a exportação para a região caiu quase 11%, em relação a igual período de 2013. Mas no segundo quadrimestre (sobre o segundo do ano passado), o resultado se inverte e vira um pequeno crescimento de 1,3%. Em bens intermediários, a exportação caiu 7,7% nos primeiros quatro meses e cresceu 7% no período de maio a julho (o dado desagregado de agosto não está disponível), sempre em relação ao mesmo período do ano passado.
A recuperação para os mercados desenvolvidos, diz Bruno Lavieri, economista da Tendências Consultoria, está relacionada com a recuperação das respectivas economias, por enquanto mais forte nos Estados Unidos. "O Brasil poderia estar surfando mais nessa onda, mas isso não acontece pela falta de acordos internacionais. A política comercial dos últimos anos ficou muito focada no Mercosul", afirma.
Por conta dessa orientação o país foi tão fortemente atingido pela crise argentina. As exportações para o vizinho estão caindo cada vez mais. De janeiro a abril, a retração foi de 17,3%. No segundo quadrimestre, a queda subiu para 30%. Em valores, no ano, o Brasil perdeu US$ 3,2 bilhões em vendas para o parceiro do Mercosul.
O quadro por destino desenhado no segundo quadrimestre mostra uma mudança em relação ao ano passado e aponta, um pouco, o cenário que pode ser esperado para o próximo ano, especialmente quanto à recuperação dos embarques para as economias desenvolvidas.
Pelo critério de média diária, no ano passado, o Brasil vendeu 10,8% mais para a China e 8,1% mais para a Argentina, enquanto as exportações para Estados Unidos e União Europeia recuaram, 8,1% e 3,5%, respectivamente. No caso dos EUA, descontando o petróleo, o resultado de 2013 foi de estabilidade: 0,2% a mais em relação a 2012.
Para os economistas, a recuperação para os países desenvolvidos pode ser mais permanente na pauta exportadora e a tendência para a China é de crescimento, ainda que em ritmo menor que o registrado nos últimos anos. Além do câmbio, que ajudou a melhorar um pouco a competitividade do exportador brasileiro, e deve ajudar ainda amais no próximo ano, a própria retração do mercado brasileiro pode incentivar exportações em 2015.
"O que realmente determina o comércio é a demanda, e ela está em recuperação nos EUA e em alguns países europeus, enquanto o modelo de foco no mercado interno brasileiro está comprometido", afirma Lima, da Sobeet. Para a Europa ele espera reforço da exportação de carnes, entre outros itens.
Silveira, da GO Associados, lembra que no próximo ano a saída para a economia brasileira passa pelo setor externo. "A própria crise doméstica, aliada a um câmbio mais desvalorizado, vai ajudar na melhora da balança comercial", diz. "As empresas, diante do esgotamento da demanda interna, vão começar a olhar mais para o mercado externo."
Outra ajuda, avalia o economista, virá do petróleo, que já está ajudando as exportações este ano e que continuará um ponto positivo em 2015. Silveira projeta déficit comercial de US$ 1 bilhão este ano e saldo positivo de US$ 3 bilhões em 2015, com aumento de 3% nas exportações e câmbio na faixa de R$ 2,40 a R$ 2,45.
Nas projeções da Tendências, a exportação brasileira encerrará 2014 com queda de 1% em relação ao ano passado. Nesse cenário, o comércio com a China se mantém semelhante à media do ano, quando aumentou apenas 0,9%, explica Lavieri.
Fonte: Valor Econômico\Denise Neumann | De São Paulo
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