Cenário do comércio exterior gerou mais segurança jurídica
Por Carla Amaral de Andrade Junqueira Canero
O ano de 2013 foi, sem dúvida, um ano agitado para o comércio internacional brasileiro. Várias medidas anunciadas no âmbito do Plano Brasil Maior em 2011 foram efetivamente implementadas em 2013. O Plano Brasil Maior tem como objetivo promover a economia brasileira por meio de políticas industriais e de comércio exterior.
As medidas decorrentes do Plano Brasil Maior influenciaram diretamente empresários, importadores e exportadores. Um dos principais resultados do plano, na seara do comércio exterior, foi a publicação no novo Decreto Antidumping, em vigor desde 1º de outubro de 2013, que trouxe modificações substanciais para os processos de investigação antidumping no Brasil.
O novo decreto, de número 8.058 de 2013, revogou o Decreto 1.602/1995 e é mais abrangente, detalhado e traz regras claras sobre práticas que eram adotadas pelo órgão que conduz as investigações, o Departamento de Comércio (Decom) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), mas que antes não eram reguladas. É evidente que, como toda nova norma, o decreto ainda está sendo testado pelos especialistas na matéria. Apenas os casos iniciados após 1º de outubro de 2013 é que já estão sujeitos a nova normativa. Entretanto, a impressão geral é que o novo decreto trará mais segurança jurídica aos procedimentos no Decom.
Algumas mudanças importantes no procedimento de investigação antidumping foram estabelecidas. Entre elas, estão: o aumento da eficácia e a diminuição nos prazos previstos pelo Decreto anterior; a possibilidade de aplicação de direito provisório em um período mais curto de tempo após iniciada a investigação (60 dias); redução no número de informações solicitadas ao peticionário; e diminuição na burocracia dos protocolos e agilidade para abertura das investigações.
Na prática, tem-se notado que o novo decreto faz jus ao que se pretendia, as novas investigações antidumping estão sendo iniciadas apenas duas semanas depois de protocolada a petição de abertura. Uma vez apresentada a petição, a decisão do Decom é mais direta, no sentido de deferir ou indeferir simplesmente a abertura da investigação. Não há mais espaço, como havia antes, de ajustes posteriores na petição.
Na vigência do decreto anterior, a solicitação de abertura de uma investigação ocorria em duas etapas. Na primeira, o peticionário apresentava suas informações que eram analisadas previamente pelo Decom. Após uma primeira análise, o departamento solicitava os ajustes necessários na base de dados apresentada. Com a nova regra, torna-se necessário que a petição seja muito bem elaborada desde o início, pois não há mais espaço para ajustes depois do seu protocolo.
Outra novidade é o início das atividades do novo time de analistas do Decom. Noventa novos profissionais foram contratados e estão sendo treinados para condução de investigações antidumping. Com o reforço do time, a expectativa é que o departamento consiga cumprir os novos prazos, mais curtos, exigidos pela nova norma. Uma mudança importante em todo esse cenário é o aumento da complexidade dos casos. O Decom tem sido bastante rigoroso da condução dos processos e seletivo na abertura de novos casos. Casos não bem fundamentados em dano e nexo causal não têm sido aceitos pelo departamento.
No que se refere aos exportadores, também há mudanças importantes. A China ainda lidera o ranking dos países investigados pela prática de dumping, mas a diferença é que os exportadores chineses têm participado cada vez mais ativamente dos processos. O tratamento da China como economia de mercado não foi modificado com o novo decreto. O Decom ainda considera a China como uma economia de não mercado. Essa questão é bastante complexa, pois o Brasil assinou com a China em 2004 um Memorando de Entendimentos por meio do qual reconheceu expressamente a China como economia de mercado. No entanto, esse memorando não foi internalizado pelo ordenamento pátrio e, assim, não é cumprido pelo departamento do ministério.
Outra novidade de 2013 foi o anuncio do GTIP (Grupo Técnico de Interesse Público). Esse grupo, responsável pela condução de processos sobre o interesse público, iniciou suas atividades há poucos meses e ainda pairam muitas dúvidas jurídicas em como os processos serão conduzidos. O novo decreto antidumping procurou regulamentar e esclarecer o procedimento. A norma antiga apenas previa a possibilidade de a Camex (Câmera de Comércio Exterior), que é um órgão colegiado de ministros, suspender a aplicação de um direito antidumping por razões de “interesse nacional” ou recusar a aceitação de um compromisso de preços, ou ainda aplicar um direito distinto daquele recomendado pela investigação do Decom. Nesses casos, normalmente um explicação superficial era fornecida e as partes acabavam frustradas ou recorrendo ao Judiciário. O novo decreto estabelece diretrizes mais claras para a condução da análise do “interesse público”.
Com todas essas mudanças, é razoável afirmar que o cenário do comércio exterior brasileiro está evoluindo em direção a uma maior complexidade nos processos e segurança jurídica. Os problemas antes encontrados relativos à falta de transparência e margem de discricionariedade parecem estar sendo reduzidos com a vigência no novo decreto. Por outro lado, cada vez mais é fundamental a assessoria de advogados para a participação em investigações antidumping. A sofisticação técnica dos novos procedimentos deixa clara a redução do espaço para aventuras jurídicas.
Carla Amaral de Andrade Junqueira Canero é presidente da Comissão de Estudos de Comércio Internacional do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).
Revista Consultor Jurídico, 1º de janeiro de 2014
http://www.conjur.com.br/2014-jan-01/retrospectiva-2013-cenario-comercio-exterior-gerou-seguranca-juridica
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