LEGISLAÇÃO

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Ministro pode mudar entendimento sobre capatazia no STJ


Ministro pode mudar entendimento sobre capatazia no STJ


Fazenda quer opinião de Francisco Falcão sobre tributação dos serviços pelo Imposto de

Livia Scocuglia


As turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) convergiram, no último ano, para a interpretação de que os serviços de capatazia – como descarregamento e manuseio de mercadorias importadas – não compõem a base de cálculo do Imposto de Importação (II). A nova composição da 2ª Turma do STJ, porém, vai rediscutir o tema a partir de provocação feita pela Fazenda Nacional.


A legislação e os argumentos da área jurídica do Ministério da Fazenda sobre o assunto não mudaram. Mas os procuradores querem ouvir a opinião do ministro Francisco Falcão, que passou a integrar a turma em 2016, depois de deixar a presidência do STJ.


Com a chegada de Falcão ao colegiado, a Fazenda interpôs novo recurso que começou a ser analisado em maio pela 2ª Turma. Na ocasião, a União apontou os mesmos argumentos dos recursos anteriores, mas ressaltou que quer ouvir a opinião do novo ministro da turma sobre o tema.


O julgamento foi interrompido por pedido de vista do próprio Falcão. Até agora, apenas o ministro Herman Benjamin votou para negar o recurso da Fazenda e manter o atual entendimento do tribunal.

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A reabertura da discussão na turma tem feito com que alguns ministros, como Mauro Campbell Marques, interrompam (sobrestem) o andamento de recursos que discutem a questão. Campbell, que defende a interpretação de que as despesas com capatazia estão fora da incidência do Imposto de Importação, sinaliza que a medida visa garantir o mínimo de segurança.


Em pelo menos dois recursos (Resp 1.618.441 e Resp 1.615.071) o ministro afirmou: “O tema se encontra em julgamento nesta Segunda Turma nos autos do REsp 1.641.228, de relatoria do Min. Herman Benjamin, e aguarda voto-vista a ser proferido pelo Min. Francisco Falcão. Em razão disso, para preservar o interesse das partes e a uniformidade na prestação jurisdicional, determino o sobrestamento do feito até a conclusão daquele julgado”.


Ainda não há um processo repetitivo sobre o tema ou mesmo orientação da 1ª Seção do tribunal, responsável por encerrar divergências entre as turmas e firmar o entendimento da Corte sobre matérias de direito público.


Sem aposta


A procuradora Lana Borges afirma que a Fazenda Nacional tenta rever o entendimento sobre a capatazia e acredita que, neste caso, há possibilidade de prevalecer uma nova interpretação, já que a turma está com uma composição diferente. A Fazenda quer ouvir o ministro Francisco Falcão, que entrou no lugar do ministro Humberto Martins, defensor da tese dos contribuintes.


“Havendo a chance de ouvir outro ministro, a parte que for vai querer ouvi-lo”, afirmou a procuradora, acrescentando: “A Fazenda não está apostando, só quer ouvir a opinião do ministro Francisco Falcão”.


A Fazenda aponta para o direito comparado e argumenta que GATT dá a opção para cada país signatário prever a inclusão ou exclusão as despesas com capatazia do valor aduaneiro. “Se não fosse opcional a inclusão do valor, a regra não precisaria ser expressa”, afirmou o procurador Clóvis Monteiro Neto.


Algumas perguntas são essenciais para a PGFN, por exemplo:


– O sistema processual hoje permite que ministros apliquem de forma monocrática decisōes do colegiado. O ministro Francisco Falcão aplicaria monocraticamente a decisão da 2ª Turma, sem dela ter participado?


– A composição nova da 2ª Turma perdurará por muito tempo. Mesmo com a composição distinta, o colegiado vai continuar aplicando o entendimento anterior?


Estudo feito pela Fazenda em 2015 aponta que, levando em conta apenas o Imposto de Importação e o IPI, seria preciso devolver R$ 12 bilhões aos contribuintes, levando em conta os últimos cinco anos. Além disso, a não incidência dos impostos implicaria numa perda anual de R$ 2 bilhões para a União. Ao total, são cinco os tributos que têm o valor aduaneiro como base de cálculo: PIS, Cofins e ICMS, além do II e do IPI.


Confronto


A discussão colocada é se a Instrução Normativa 327/2003, editada pela Receita Federal contrariou dispositivos do Acordo de Valoração Aduaneira do GATT e os incisos I e II do artigo 77 do Regulamento Aduaneiro, ao prever a inclusão no valor aduaneiro dos gastos relativos à descarga no território nacional, o que amplia a base de cálculo do Imposto de Importação.


A aplicação do acordo do GATT quanto aos gastos com capatazia, atualmente, é disciplinada pelos artigos 76 a 83 do Regulamento Aduaneiro (Decreto 6.759/2009) e pela Instrução Normativa SRF 327/03.


O GATT é um acordo internacional sobre tarifas e comércio firmado entre diversos países integrantes da Organização Mundial do Comércio (OMC). Em seu artigo 8º, o acordo estabelece que “ao elaborar sua legislação, cada membro deverá prever a inclusão ou exclusão, no valor aduaneiro, no todo ou em parte, dos seguintes elementos: a) o custo de transportes de mercadoria importadas até o ponto ou local de importação; b) os gastos relativos ao carregamento, descarregamento e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; e c) o custo do seguro.


Segundo a advogada Flavia Holanda, sócia do Gaudêncio McNaughton, são as regulamentações e acordos internacionais que devem estabelecer os elementos que compõe o valor aduaneiro.


“No momento em que você define o valor aduaneiro para fins de Imposto de Importação, é possível replicar esse conceito para outras bases, uma vez que o II vai estar na base de alguns outros tributos. Então existe repercussão sim no cálculo dos demais tributos aduaneiros, ou seja, aqueles incidentes sobre as operações de importação”, afirmou.


O STJ já discute a ideia de usar esse entendimento favorável ao contribuinte para outros tributos. No AREsp 1.066.048/RS, os ministros se referem à ampliação “ilegal” da base de cálculo dos tributos incidentes sobre o valor aduaneiro, o que atribui a exclusão para as demais espécies tributárias.


Ainda assim, a tentativa de rediscussão da capatazia é vista com desconfiança por advogados, que afirmam que a 1ª e a 2ª turmas do tribunal estão em sintonia com o entendimento de que despesas com capatazia não compõem a base de cálculo do II.


Maioria apertada


Ao julgar o recurso que, segundo os contribuintes, firmou o entendimento da 2ª Turma (Resp 1.528.204), em março, o colegiado interpretou que devido ao fato de o serviço de capatazia ser posterior à nacionalização da mercadoria, não deve incidir o Imposto de Importação. O placar foi de por 3 x 2. O caso demorou mais de um ano para ser analisado devido aos vários pedidos de vista.


Na época, apenas os ministros Og Fernandes e Herman Benjamin divergiram do relator, Humberto Martins, e votaram a favor da tese da Fazenda Nacional. Formaram a maioria os ministros Humberto Martins, Mauro Campbell e a ministra Assusete Magalhães.


Ao apresentar voto divergente, o ministro Og Fernandes citou que o Acordo de Valoração Aduaneira do GATT define que os países membros deverão estipular o que compõe o valor aduaneiro, que pode abranger gastos com carregamento, descarregamento, manuseio de mercadorias, entre outros.


A advogada Cristiane Romano, sócia do Machado Meyer Advogados, aponta prejuízos para a revisão de entendimentos consolidados.


“Rever a matéria a cada mudança de composição da turma gera uma super insegurança jurídica. Ainda mais matérias em colegiado formado por cinco ministros em que o placar ficou em 3 x 2. A 1ª turma está firme no propósito e a 2ª firmou o entendimento em maio deste ano. Outro recurso para reanalisar a matéria gera muita insegurança”, ressaltou.


Livia Scocuglia - Brasília


https://jota.info/tributario/ministro-pode-mudar-entendimento-sobre-capatazia-no-stj-21072017

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