Não merecem análise pedidos de exploração aduaneira não examinados durante MP que perdeu eficácia
Decisão, por maioria, é do plenário do STF.
O plenário do STF julgou, nesta quarta-feira, 14, procedente a ADPF 216 para afastar a aplicação do § 11 do art. 62 da CF aos pedidos de licença para exploração de CLIA - Centro Logístico e Industrial Aduaneiro, não examinados durante a vigência da MP 320/06. O plenário seguiu voto da relatora, ministra Cármen Lúcia.
A Associação Brasileira das Empresas Operadoras de Regimes Aduaneiros e outras entidades pediram que a Corte estabelecesse, à luz da CF, o alcance da eficácia da MP 320/06, que dispõe sobre a movimentação e armazenagem de mercadorias importadas ou despachadas para exportação, o alfandegamento de locais e recintos e a licença para explorar serviços de movimentação e armazenagem de mercadorias em CLIA.
Na ADPF, as associações questionaram o que chamam de ilegítima interpretação dada aos parágrafos 3º e 11 do artigo 62 da CF. Pediram, assim, que tais dispositivos somente se apliquem aos pedidos de licenciamento de CLIA "efetivamente apreciados e deferidos durante o período de vigência da aludida medida provisória".
As entidades afirmavam que, até a edição da norma, atividades substancialmente idênticas eram desenvolvidas pelos chamados Portos Secos, registrados na Receita Federal. Esses empreendimentos eram objeto de concessão outorgada mediante licitação. A MP 320 eliminou a necessidade de licitação. Sustentaram, assim, que a posterior rejeição da MP fez com que o processamento e julgamento dos pedidos de licenciamento pendentes ficassem sem fundamento legal, o que levou várias empresas a acionarem a Justiça.
Decisão
A relatora, ministra Cármen Lúcia, votou pela procedência do pedido. Ela observou que a MP que inicialmente disciplinava o assunto não foi convertida em lei e perdeu a vigência em agosto de 2013. Neste período, havia pedidos diversos para exploração de CLIA os quais não foram apreciados RF. Antes que o problema terminasse no Judiciário, sobreveio outra medida provisória acerca do tema, a MP 612/13.
A relatora observou que a controvérsia limitou-se aos pedidos de licença para a exploração de CLIA não examinados na vigência da MP 320. "Não havia ato da RF deferindo pedido de licença para exploração de CLIA, sequer podendo-se argumentar a existência de ato jurídico perfeito, aquele já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou, nos termos do §1º art. 6º da lei de introdução às normas de direito brasileiro."
Para Cármen, não houve relação jurídica constituída que tornasse possível a invocação do §11 do art. 62 da CF para justificar a aplicação da MP rejeitada após o prazo de sua vigência.
"Interpretação diferente postergaria indefinidamente a vigência e a produção de efeitos da MP rejeitada pelo Congresso Nacional, o que ofenderia não apenas o § 11 do art. 62 da CF, mas também o princípio da separação de Poderes e da segurança jurídica."
Pelo exposto, voto no sentido de julgar procedente o pedido para afastar a aplicação do § 11 do art. 62 da CF aos pedidos de licença para exploração de CLIA não examinados durante a vigência da MP 320.
A ministra foi acompanhada pelos ministros Edson Fachin, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello.
Divergência
A divergência foi inaugurada pelo ministro Luís Roberto Barroso, para quem não tendo sido editado o decreto legislativo previsto do § 3º do art. 62 pelo Congresso Nacional, todos os interessados que, durante a vigência da MP 360/06, preencheram os requisitos normativos e requereram a concessão de licença para a instalação de centro logístico e industrial aduaneiro, deveriam ter assegurado o pedido de apreciação do seu pedido, de acordo com a regulamentação prevista na MP.
"Garantir o direito à licença apenas às pessoas jurídicas que tiveram seu requerimento apreciado pela administração pública é medida claramente anti-isonômica. A maior ou menor agilidade da RF na apreciação do requerimento administrativo não pode constituir o critério para distinguir entre quem faz e quem não faz jus à outorga da licença. Se assim fosse, a existência ou não do direito objetivo restaria não subordinada à lei, mas à arbitrariedade ou ao acaso."
O ministro apontou que a jurisprudência da Corte é no sentido de que o requerimento gera mera expectativa de direito, mas a situação examinada é diversa, porquanto o Congresso não fez a edição do decreto, por meio da qual poderia por exemplo criar condições mais rígidas para a concessão da licença. “Não existe razão de interesse público ou de deferência ao legislador que justifique a impossibilidade de análise dos requerimentos de licença nos termos da MP. Pelo contrário, a anulação das licenças obtidas com base em decisões judiciais além de produzir insegurança jurídica seria contrária ao controle do comercio exterior e prejudicial à livre concorrência."
Assim, votou pela improcedência do pedido. O ministro foi acompanhado por Rosa Weber, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski.
O ministro Toffoli sinalizou que votaria com a divergência, mas mudou de posição diante da possibilidade de empate na Corte – porquanto o ministro Alexandre estava impedido no julgamento desta ação.
Questões preliminares
Antes dos votos foram julgadas questões preliminares. A relatora acolheu a preliminar de ilegitimidade ativa suscitada pela AGU e pela PGR determinando a exclusão do polo ativo desta arguição; quanto à associação brasileira de empresas dos terminais de containers, por sua vez, entendeu pela legitimidade, razão pela qual negou a preliminar. Neste ponto, não houve divergência pelos ministros.
Em seguida, tratou da questão do cabimento de ADPF contra interpretação judicial de norma pelo Judiciário. A ministra destacou o art. 1º da lei 9.882/99, o qual estabelece que a arguição terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do poder público. Para ela, a arguente demonstrou a importância da matéria e a possibilidade de se estar diante de descumprimento de preceito fundamental, de modo que votou também por superar esta preliminar.
A relatora foi seguida pelos ministros Fachin, Fux, Gilmar Mendes, Rosa Weber e Celso de Mello.
Barroso, por outro lado, entendeu que não é caso de cabimento de ADPF. “Essa é uma briga de pretensões subjetivas em que se está utilizando uma ação direta de controle objetivo para atingir um fim subjetivo." Para o ministro, não restou comprovada a controvérsia judicial relevante.
"Destes 10 requerentes, as autoras apontaram apenas 6 ações judiciais nas quais se requereu a apreciação do pedido de licença. Conquanto se trate a controvérsia judicial relevante de um conceito indeterminado, parece-me haver uma zona de certeza negativa neste caso. Resolver a situação concreta de 6 pessoas jurídicas não caracteriza uma controvérsia judicial relevante que justifique o acionamento direto do STF por meio de ADPF. Ademais, as requerentes apontaram uma única manifestação judicial monocrática no sentido por elas defendido."
O ministro entende que a ADPF contra atos jurisdicionais caberá em casos de graves erros, não sendo possível produzir o resultado constitucionalmente adequado pelos mecanismos do processo subjetivo, "o que não me parece ocorrer neste caso".
Acompanharam Barroso os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio.
As demais preliminares foram rejeitadas por unanimidade.
Processo: ADPF 216
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