terça-feira, 11 de outubro de 2016
Importador sob análise da Receita não pode ser sempre remetido para "cor cinza"
Importador sob análise da Receita não pode ser sempre remetido para "cor cinza"
Por Augusto Fauvel de Moraes e Heloisa Santoro de Castro
Quando alguma pessoa jurídica faz a Declaração de Importação (DI) no Siscomex (sistema eletrônico do governo federal para controlar exportações e importações), o registro é distribuído para um dos canais de conferência aduaneira: verde, amarelo, vermelho ou cinza.
É no canal cinza que a autoridade aduaneira faz o exame documental e a verificação da mercadoria, podendo instaurar procedimento especial de controle visando analisar eventuais indícios de fraude.
Nesse sentido, a Secretaria da Receita Federal editou a Instrução Normativa 228/02, que tem por finalidade, justamente, coibir irregularidades praticadas no âmbito do comércio internacional, dispondo sobre o procedimento especial de verificação da origem dos recursos aplicados nas operações e quanto ao combate à interposição fraudulenta de pessoas.
Entretanto, frequentemente os importadores sob fiscalização têm se deparado com a parametrização automática para o canal cinza.
Explico. É certo que não há disposição legal que determine a seleção automática para o canal cinza. Entretanto, a autoridade aduaneira tem, reiteradamente, direcionado para o canal cinza as importações realizadas por empresas que possuem procedimentos administrativos em andamento.
Essa seleção automática pode causar efeitos nefastos à atividade da empresa, tendo em vista que, na melhor das hipóteses, uma vez instaurado o procedimento administrativo, este poderá ter duração de 90 dias, prorrogáveis por mais 90 dias, tendo apenas o importador a possibilidade de liberar suas mercadorias mediante caução.
O prazo supramencionado nem sempre é respeitado pela autoridade aduaneira, causando ainda mais danos ao desenvolvimento da atividade da empresa importadora.
Todavia, entendemos que cada DI deve ser processada de forma individualizada, de modo que a eventual seleção para o canal cinza não impeça que futura importação seja parametrizada para outro canal.
Ainda, tem-se que a parametrização automática para o canal cinza representa violação ao devido processo legal, bem como fere princípios constitucionalmente garantidos como o da motivação, razoabilidade e proporcionalidade. A conduta abusiva viola o direito de propriedade sobre as mercadorias que foram importadas para o livre desenvolvimento das atividades da empresa.
Em decisão em sede de Agravo de Instrumento 2008.01.00.064121-6, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região se pronunciou da seguinte forma:
“ (...) Embora a atuação da autoridade fiscal possa ocorrer de ofício, in casu, de acordo com os autos, vislumbro, em especial na documentação referente ao Procedimento Criminal, que os indícios que levaram a participação da empresa agravante nas supostas fraudes não são suficientes a justificar a conduta do Fisco em reter TODAS suas operações no canal cinza.
A pretensão da empresa de não ter suas Declarações de Importação direcionadas para o canal cinza não implica na impossibilidade de fiscalização, assim como não há justificativa hábil para que tal canal de conferência aduaneira seja utilizado indiscriminadamente, como, no presente caso, inviabilizando a concretização das operações de importação e exportação da agravante.
O procedimento especial realizado na conferência aduaneira denominada canal cinza demanda longo período de tempo – 90 dias prorrogáveis por mais 90 -, inviabilizando e prejudicando sobremaneira o regular funcionamento da empresa, sem que haja, a princípio, fundados indícios de eventual prática de fraudes pela agravante.
O periculum in mora decorre, evidentemente, do fato de que a agravante está totalmente impossibilitada de dar prosseguimento às suas atividades, nem cumprimento a seus contratos, uma vez que as mercadorias importadas estão automática e indistintamente sendo retidas pela fiscalização.
Ante o exposto, defiro parcialmente o pedido de atribuição de efeito suspensivo ativo, para determinar que as futuras importações realizadas pela agravante sejam submetidas à parametrização do canal vermelho de conferência aduaneira, desde que, para cada situação concreta, não haja fundamentos suficientemente hábeis a conduzi-las ao canal cinza, nos termos expressos na IN 206/2002, em consonância com a MP 2.158/2001 (...)”.
Portanto, a parametrização para o canal cinza somente se justifica diante do fundado receio ou indícios de irregularidades nas importações. A seleção discriminatória, a bem da verdade, acaba por parametrizar o importador, desconsiderando a eventual presença ou não dos elementos indiciários de fraude.
Nesse sentido, observe a jurisprudência abaixo colacionada.
TRIBUTÁRIO. ADUANEIRO. PARAMETRIZAÇÃO AUTOMÁTICA PARA O CANAL CINZA DE CONFERÊNCIA ADUANEIRA. ILEGALIDADE.
1. No caso em comento, a justificativa para a seleção automática para o canal cinza, no que toca às importações procedidas pela empresa impetrante, é a existência de processos administrativos, entre os quais está Representação Fiscal para Fins de Inaptidão de CNPJ.
2. Não há disposição legal determinando a seleção automática para o canal cinza, na pendência de Representação Fiscal para fins de Inaptidão do CNPJ da empresa importadora.
3. Os elementos do § 1º do artigo 21 da Instrução Normativa n.º SRF n.º 680/06 não foram considerados pela autoridade coatora, em flagrante ilegalidade, mormente em face da decisão administrativa favorável à impetrante, proferida pela Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento e ainda não reformada.
4. Não se pode olvidar, que o encaminhamento de toda e qualquer importação efetivada pela impetrante para o canal cinza de conferência, sem a verificação de indícios concretos de fraude em cada operação, além de contrariar a Instrução Normativa em questão, fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, implicando sérios prejuízos ao desenvolvimento das atividades normais da empresa. (APELREEX, processo n.º 5002398-62.2010.404.7200, PRIMEIRA TURMA, SC, data da decisão: 19/09/2012).
Assim, cabe ao importador que se encontra “enquadrado” na parametrização automática do canal cinza buscar a devida tutela jurisdicional , a fim de fazer valer os princípios constitucionalmente garantidos e ter suas mercadorias liberadas sem a parametrização automática ao canal cinza.
Augusto Fauvel de Moraes é advogado, sócio do escritório Fauvel e Moraes Sociedade de Advogados. Presidente da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB-SP.
Heloisa Santoro de Castro é advogada, integrante da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB-SP.
Revista Consultor Jurídico, 9 de outubro de 2016, 7h09
http://www.conjur.com.br/2016-out-09/importador-analise-receita-nao-ir-sempre-cor-cinza
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