ICMS
e transporte rodoviário de cargas - Da (não) incidência do ICMS nos serviços de
transporte rodoviário de cargas destinadas ao exterior
Autor: Ricardo Paz Gonçalves*
Em artigo recentemente publicado manifestamos nosso entendimento e lançamos o alerta acerca das graves divergências e distorções que envolvem a não-cumulatividade do ICMS quando aplicada ao segmento de transporte rodoviário de cargas. Chegamos a afirmar que em relação a este aspecto há muito pouco consenso entre Fisco, tribunais e contribuintes.
Fonte: FISCOSOFT
Autor: Ricardo Paz Gonçalves*
Em artigo recentemente publicado manifestamos nosso entendimento e lançamos o alerta acerca das graves divergências e distorções que envolvem a não-cumulatividade do ICMS quando aplicada ao segmento de transporte rodoviário de cargas. Chegamos a afirmar que em relação a este aspecto há muito pouco consenso entre Fisco, tribunais e contribuintes.
Ganhador do prêmio Nobel de Física e tido pela
comunidade científica como o mais memorável físico de todos os tempos,
atribui-se a Albert Einstein a célebre frase segundo a qual "a coisa mais dura
de entender no mundo é o Imposto de Renda". Arriscamo-nos a afirmar sem medo
que, apesar de desvendar alguns dos mais profundos mistérios do universo, ao
cunhar a frase o gênio alemão não tinha a menor noção da capacidade do
brasileiro para criar tributos complexos. E se conhecesse esta capacidade,
certamente reveria sua frase. Quiçá diante de tal complexidade revisse algumas
de suas teorias.
Do ponto de vista fático a questão que em
breves linhas abordamos neste artigo não é complexa: trata-se da incidência do
ICMS sobre a operação de prestação de serviços de transporte rodoviário de
cargas quando o destino da carga é o exterior e o tomador do serviço situa-se no
território nacional.
Nesta circunstância o equívoco mais óbvio e
comum praticado pelas empresas é interpretar que esta operação encontra-se
abrangida pela imunidade tributária, de origem constitucional, concedida às
operações de exportação. O equívoco consiste em não diferenciar a operação de
circulação de mercadorias, essa sim protegida pela imunidade, da operação de
prestação de serviços, que no exemplo é uma operação interna, muito embora o
serviço termine em território estrangeiro. Note que em um caso há ingresso de
divisas, exportação da mercadoria, e no outro caso não há - serviço de frete.
Neste sentido já se manifestou o STF em mais de uma oportunidade (v.g. RE
340.855/2002). O que a Constituição ampara com a imunidade, portanto, são os
serviços prestados a destinatários no exterior, e não serviços que destinam
mercadorias ao exterior.
Poderia alguém perguntar: se o tomador da
operação de frete é doméstico, o destino da carga é o exterior e a operação não
está protegida pela imunidade, então incide o ICMS, certo?... Errado! É que aLei Complementar
87/96, que regulamenta o ICMS, conhecida porLei Kandir, dispõe,
com amparo Constitucional, que o imposto não incide sobre operações e prestações
que destinem mercadorias ao exterior. Este dispositivo legal é mais amplo que a
imunidade Constitucional e isenta do imposto sempre que a prestação de serviços,
ainda que interna, destine mercadorias ao exterior.
Para a Lei Complementar, portanto, é
irrelevante se o tomador do serviço é interno ou do exterior, bastando que o
destino da mercadoria esteja no exterior para que fique a operação isenta do
imposto. Com base nesta distinção, o STJ entendeu que é isento de ICMS o serviço
de transporte que destine mercadoria ao exterior, ainda que o tomador do serviço
esteja localizado no país (MC 7.584/MT j.2006).
Assim, na operação de transporte em comento,
aConstituiçãonão
afasta a incidência do imposto, mas a lei afasta. Aquele "alguém" então voltaria
a perguntar: significa dizer que "dá na mesma" certo?... Mais uma vez errado!
Não "dá na mesma" porque a imunidade, que decorre da Constituição - difere da
isenção, que decorre da lei, na medida em que aquela permite ao contribuinte
manter os créditos através de um benefício conhecido como "benefício do não
estorno", enquanto que esta compele o contribuinte a estornar os créditos na
proporção das saídas isentas ou não tributadas.
Significa dizer que na hipótese de uma
transportadora ter 50% de suas operações destinadas ao exterior com tomador
doméstico, e 50% de operações internas tributadas, ela terá que estornar, ou
seja, anular, a metade dos créditos de ICMS decorrentes da compra de
combustíveis ou do ativo imobilizado, por exemplo, apurados no período.
Com base nisso tudo e ainda com base nas
legislações estaduais que regem a matéria, é possível distinguir pelo menos
vinte hipóteses de operações de transporte rodoviário de cargas cujas distinções
são tributariamente relevantes para fins de ICMS. Ocorre que a origem da
mercadoria, o destino da mercadoria, a localização do tomador do serviço e ainda
a situação tributária e cadastral do tomador do serviço irão influenciar ou
modificar aspectos relativos à alíquota, incidência ou direito ao crédito do
imposto.
Adaptar-se a este contexto, cuja complexidade
muitos administradores desconhecem e que influencia, para o bem e/ou para o mal,
o próprio resultado da empresa, submetendo-as muitas vezes a riscos ou privando
de oportunidades que desconhecem, é um fator que pode diferenciar aqueles que
prosperam daqueles que sucumbem ao nosso paradoxal panorama econômico, de muitas
oportunidades e de grandes dificuldades.
Se tudo isso parece complicado, é porque não
abordamos aqui a incidência e o direito ao crédito de PIS e COFINS nas operações
de transporte rodoviário de carga. Mas isso já seria assunto suficiente para
muitas outras laudas.
*Advogado inscrito na OAB-RS sob nº 75.209.
Extensão em Gestão Tributária Empresarial pela FEEVALE. Consultor externo do
Sebrae-RS nas áreas de Políticas Públicas e Desenvolvimento de Metodologias.
Membro ativo da Fundação Escola Superior de Direito Tributário (FESDT). Sócio da
Affectum e SPGonçalves.
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