Mitsubishi consegue anular multa milionária
As montadoras obtiveram no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) o primeiro precedente favorável na disputa bilionária contra autuações da Fazenda Nacional por aproveitamento de incentivos fiscais federais instituídos em 1999 e 2001. Uma decisão da 1ª Turma da 2ª Seção cancelou uma multa de aproximadamente R$ 300 milhões da Mitsubishi Motors, envolvendo créditos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) utilizados entre novembro de 2003 e dezembro de 2005. Outro recurso ajuizado pela Ford, no valor de R$ 2 bilhões, aguarda julgamento no órgão. A Fazenda Nacional tentará reverter a decisão no próprio Carf, instância máxima administrativa para disputas tributárias.
As autuações fiscais discutidas no Carf envolvem dois incentivos fiscais federais aproveitados pelo setor automotivo. O primeiro, instituído por meio da Lei nº 9.826, de 1999, estabeleceu um tratamento especial para as indústrias que se instalassem na região Centro-Oeste, exceto no Distrito Federal, ou em áreas atendidas pela Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). De acordo com a norma, as empresas têm direito a um crédito presumido de 32% do IPI, a ser deduzido na apuração do imposto, incidente nas saídas de produtos. Boa parte do setor aderiu ao benefício - no caso da Mitsubishi, o parque industrial foi instalado na cidade de Catalão, em Goiás.
O outro incentivo veio em 2001 com a edição da Medida Provisória nº 2.158-35. Foi criado um regime especial de apuração do IPI para as montadoras. O regime estabeleceu um crédito presumido opcional de 3% sobre o montante do IPI destacado na nota fiscal referente ao frete cobrado no transporte de produtos. Até então, todo o serviço de frete das montadoras era terceirizado, para evitar o pagamento do IPI, já que as empresas contratadas para o serviço não são contribuintes do imposto. A intenção do governo ao conceder o crédito foi fazer com que as empresas passassem a utilizar frete próprio, para aumentar a base de cálculo do tributo. Em contrapartida, o crédito reduziria a carga tributária do setor.
Como quase todas as montadoras, a Mitsubishi aderiu ao regime especial e foi surpreendida com uma autuação fiscal anos depois. A Receita Federal alegou que a empresa estaria se aproveitando de dois benefícios fiscais ao mesmo tempo, o que é proibido pela Lei nº 9.826, e determinou a devolução do crédito presumido de 32% do IPI aproveitado pela empresa entre 2003 e 2005. A empresa alegou que não se tratavam de dois incentivos fiscais, e que apenas a Lei nº 9.826 teria instituído um benefício do IPI para atrair empresas a determinados locais. O argumento foi acatado pela maioria dos conselheiros da 1ª Turma da 2ª Seção do Carf, que decidiu cancelar o auto de infração.
De acordo com o voto do conselheiro Antônio Lisboa Cardoso, enquanto a Lei nº 9.826 instituiu um benefício fiscal, a Medida Provisória de 2001 se destinou a simplificar e racionalizar o controle fiscal, propiciando, inclusive, um incremento da arrecadação do IPI e de outros tributos.
O desfecho do processo envolvendo a Ford, que aguarda julgamento no Carf, é fundamental para que a Fazenda possa recorrer da decisão da Mitsubishi. Isso porque caso a decisão seja favorável ao Fisco, poderão ser apresentados embargos à Câmara Superior do órgão, que só pode ser acionada em caso de decisões divergentes sobre o mesmo tema. Mas, de acordo com o coordenador da atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no Carf, Paulo Riscado, apesar de se tratar de um leading case, pode ser localizado algum precedente "aproximado" da discussão. "O principal ponto do debate é saber se o crédito presumido se enquadra no gênero de benefício fiscal", diz Riscado, acrescentando que a Constituição Federal classifica crédito presumido como incentivo fiscal. Procuradas pelo Valor, Mitsubishi e Ford não quiseram comentar o assunto.
Valor Econômico
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