LEGISLAÇÃO

quinta-feira, 27 de abril de 2017

ICMS na exportação (final)




ICMS na exportação (final)


José Alexandre Saraiva


Estamos concluindo a série sobre imunidade do ICMS na exportação, iniciada no dia 2 de abril.


ICMS na exportação (I)

ICMS na exportação (II)

ICMS na exportação (III)



Conforme já esclarecemos, estes comentários têm por base parecer elaborado pelo tributarista Heron Arzua, emitido em consulta formulada por empresa cujas operações de exportação são feitas assumindo-se referida imunidade, o que ensejou a instauração de contenciosos administrativo-fiscais, com risco a seu patrimônio.


De fato, entre as imunidades específicas instituídas pela Constituição (CF), encontra-se à relativa às exportações de mercadorias para o exterior e serviços prestados a destinatários fora do país, isso no âmbito do imposto estadual sobre circulação de mercadorias e serviços indicados (ICMS).


A seguir, as conclusões elencadas no mencionado parecer do jurista Arzua, que contou também com a colaboração do advogado e economista Murilo de Oliveira Schmitt.


“Numa palavra, a imunidade do ICMS nas operações de exportação para o exterior é ampla, abrangendo toda a cadeia produtiva(ab ovo).


Impede, pois, a incidência do imposto não só não última operação (exportação propriamente dita), como também desde a comercialização da matéria prima até a sua industrialização.


Com a imunidade ampla, todas as mercadorias e serviços integrantes do processo de exportação estão agasalhados pela norma constitucional, inclusive os bens do ativo fixo, de uso e consumo, energia elétrica, serviços de comunicação, transporte etc., que concorrem para colocar o produto no mercado externo.


Essa inteligência é a única que atende ao princípio do destino ou princípio do País de destino, pelo qual a transação internacional deve ser tributada uma única vez, no País importador, com a retirada de toda a carga tributária incidente no País de origem.


Na hipótese de incidência do imposto nas operações anteriores, o direito ao crédito contempla não só os créditos físicos, como os denominados financeiros, porquanto a Emenda Constitucional 42, de 2003, assegurou a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores, sem anotar quaisquer reduções.


Como averba a jurisprudência dos Tribunais pátrios, as restrições trazidas pela Lei Complementar nº 87, de 1996,que limitou temporalmente os créditos financeiros, não têm cabida, ao depois da EC42-03, para as operações e prestações vinculadas à exportação.


A crescente consolidação, na jurisprudência brasileira, do entendimento acerca da imunidade em toda a cadeia produtiva de mercadoria destinada à exportação, conforme aqui exposto, acaba por reduzir a inexpressivo o risco patrimonial da Consulente. No caso concreto, é remotíssima a possibilidade de os créditos tributários consignados em seu passivo serem submetidos à exigência, ao final. De conseguinte, o seu patrimônio, pela causa enunciada, não há de ser desfalcado e, por isso mesmo, tem-se que não há e nem pode ser depreciado.”


http://www.gazetadopovo.com.br/economia/colunistas/de-olho-no-leao/icms-na-exportacao-final-5qd7wppxv1tjgq9hvugu7f2yd?utm_source=akna&utm_medium=email&utm_campaign=Press+Clipping+Fenacon+-+24+de+abril+de+2017

Transporte Marítimo 2



Por fim, na apresentação do livro, publicado pela Editora Renovar, Rio de Janeiro, 2016, com 286 páginas, fizemos a seguinte introdução ao tema da obra, inédita no direito latino-americano:
“O conceito de limitação da responsabilidade civil permite aos proprietários de navios e outras pessoas envolvidas na aventura marítima efetuarem o gerenciamento do risco marítimo por meio da limitação da sua exposição financeira em relação às reclamações marítimas (maritime claims) até uma soma máxima independente do valor da quantia demandada a eles.
Este conceito, ainda polêmico entre os maritimistas, especialmente os brasileiros, é bastante usado na indústria do transporte marítimo, existe de duas formas básicas:
(i) uma limitação de responsabilidade que objetiva proporcionar uma cobertura total para a exposição financeira do proprietário do navio em relação a todas as reclamações de um caso específico (“limitação global da responsabilidade”); e
(ii) uma limitação da responsabilidade em relação a um tipo específico de reclamação (“regimes particulares de responsabilidade”). Esses regimes de responsabilidade específicos fazem parte de muitas convenções internacionais de responsabilidade, que variam desde as convenções que regulam o transporte de mercadoria pelo mar, o transporte de passageiros e suas bagagens pelo mar, bem como as que regulam a responsabilidade e compensação por danos decorrentes de poluição e a responsabilidade pela remoção de cascos soçobrados.
Considerando-se o importante papel que a limitação da responsabilidade civil tem no transporte marítimo, um importante e inédito projeto de pesquisa em países de tradição romano-germânica (civil law tradition) foi efetuado entre 2011 e 2012, para estudar o impacto que as convenções internacionais que regulam o tema causam ou podem causar no Direito Marítimo brasileiro.
Este projeto de pesquisa teve patrocínio da Capes, no Programa Professor Visitante do Exterior (PVE/CAPES), e implementado por meio da cooperação com o Programa de Mestrado e Doutorado em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí (PPCJ/Univali) coordenado pelos Profs. Dr. Osvaldo Agripino de Castro Junior e Dr. Norman Augusto Martínez Gutiérrez do IMO International Maritime Law Institute (IMLI), Malta.
O objetivo geral do citado projeto é realizar pesquisa a fim de contribuir para o aprimoramento do conhecimento dos aspectos jurídicos que envolvem a regulação do comércio internacional com ênfase no transporte marítimo, tendo em vista que esse modal transporta 95 % do comércio exterior brasileiro.
A execução deste projeto abrange uma série de seminários no PPCJ/Univali e no IMLI, palestras no Tribunal Marítimo, aulas, cursos e seminários no Brasil e no exterior, e a publicação de artigos jurídicos tratando de vários aspectos da limitação da responsabilidade civil no transporte marítimo em diversos periódicos jurídicos e revistas do setor no Brasil, dentre as quais Revista Direito e Política e Novos Estudos Jurídicos, ambas no PPCJ, e Revista de Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário, da IOB/Síntese, bem como esse livro.
Nesse cenário, escrevemos essa obra, em quatro capítulos, sobre os aspectos jurídicos da limitação da responsabilidade civil no transporte marítimo com ênfase na limitação global da responsabilidade civil, limitação da responsabilidade civil em relação ao transporte de mercadoria pelo mar e em relação ao transporte de passageiros e sua bagagem pelo mar.
Ademais, o estudo aqui apresentado também contribuirá para a limitação da responsabilidade civil nos demais modais de transporte, como o aéreo, rodoviário e ferroviário.
Vale mencionar que a limitação da responsabilidade civil foi tratada, de forma inédita na doutrina brasileira, na obra Direito Portuário e a Nova Regulação, 486 páginas, de autoria de Osvaldo Agripino, publicado pela Aduaneiras em 2015, que analisa a reforma portuária efetuada a partir de dezembro de 2012.
Assim, para melhor compreensão do tema, o Capítulo 1 apresenta o instituto da limitação global da responsabilidade civil, com foco na Convenção de 1924 (Bruxelas) para, em seguida, no Capítulo 2, discorrer sobre a Convenção Internacional sobre a Limitação de Responsabilidade Relativa às Reclamações Marítimas, 1976 (Convenção LLMC), emendada pelo Protocolo 1996.
Essa convenção regula a limitação global da responsabilidade civil e se trata da norma supranacional mais aceita no mundo, vez que em 25de junho de 2014, 54 Estados Partes com 54,55 % do total da tonelagem mundial dela faziam parte (49 Estados são Partes do Protocolo 1996 LLMC com 45,30 % do total da tonelagem mundial).
Dessa forma, esse livro discute os principais dispositivos da Convenção LLMC com a emenda Protocolo 1996 LLMC, que evidenciará as diversas vantagens que o Brasil teria se fizesse parte dos principais instrumentos legais que regulam essa matéria.
O Capítulo 3 aborda a limitação da responsabilidade civil no transporte marítimo de mercadorias, por meio das convenções internacionais já mencionadas que regulam o tema (Haia, Haia-Visby, Hamburgo e Rotterdam), com ênfase no direito brasileiro (legislação, doutrina e jurisprudência).
Na sequência, o Capítulo 4 discorre sobre a limitação responsabilidade civil no transporte de passageiros e suas bagagens pelo mar, à luz da Convenção de Atenas emendada pelo Protocolo 2002.
Por fim, esperamos que a obra possa lançar novas luzes sobre esse polêmico instituto, que, para nós, é um incentivo para o desenvolvimento do transporte marítimo, que contribui para o aumento do comércio exterior e, por sua vez, maior inclusão da economia brasileira no comércio internacional.
Rio de Janeiro/Malta, verão de 2015 (no Brasil)
Osvaldo Agripino de Castro Junior
Norman Augusto Martínez Gutiérrez
https://www.portosenavios.com.br/colunista-osvaldo-agripino/38433-limitacao-da-responsabilidade-civil-no-transporte-maritimo-o-que-e-isso-parte-2?utm_source=newsletter_8186&utm_medium=email&utm_campaign=noticias-do-dia-portos-e-navios-date-d-m-y


PGR pede exclusão do ICMS do cálculo da CPRB




PGR pede exclusão do ICMS do cálculo da CPRB

Contribuição é devida por setores da economia em substituição ao INSS sobre folha de salários


Livia Scocuglia


Após decisão do Supremo Tribunal Federal que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, a Procuradoria Geral da República (PGR) pediu à Corte que também declare inconstitucional a inclusão do ICMS no cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB).

Criada pela Lei 12.546/2011, a CPRB é devida por alguns setores da economia em substituição à contribuição ao INSS exigida sobre a folha de salários.

O caso chegou ao Supremo em março deste ano após o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (sul do país) ter negado o pedido da Bouton Indústria e Comércio de Artigos de Cama e Banho Ltda. que queria afastar o ICMS da base de cálculo da contribuição previdenciária.


O TRF-4 entendeu que o valor do ICMS já está embutido no preço, sendo destacado para simples controle fiscal, a fim de se indicar o quanto a ser compensado, se for o caso, pelo comprador, em função da não-cumulatividade. “É a chamada cobrança por dentro”, diz trecho do acórdão.

No Supremo, a PGR opinou pelo provimento do recurso extraordinário e, portanto, pela exclusão do ICMS da base de cálculo da CPRB porque, segundo a procuradoria, a questão discutida neste caso é a mesma debatida em relação ao PIS/Cofins.

“O presente caso não versa sobre PIS e Cofins, mas o problema nele suscitado é essencialmente idêntico ao abordado no julgamento da repercussão geral: inclusão do ICMS na base de cálculo de contribuição sobre receita”, afirmou o subprocurador-geral da República Odim Brandão Ferreira, que assina a manifestação.

Segundo Brandão, embora o caso não verse sobre base de cálculo de PIS e Cofins, seu desfecho deve ser orientado pela solução adotada na decisão proferida no RE 754.706, em repercussão geral.

“Afinal, as mesmas razões que levaram à conclusão de que a base de cálculo do PIS e da Cofins não compreende o ICMS, sob pena de sua ampliação indevida, valem para afastar a inclusão do aludido imposto na quantificação da contribuição previdenciária substitutiva da Lei 12.546/2011”, conclui.

O caso está sob relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, que, no RE 754.706, votou a favor da tese defendia pelos contribuintes a favor da exclusão do imposto estadual do cálculo do PIS/Cofins.

PIS/Cofins

No dia 15 de março, o STF determinou que o ICMS difere dos conceitos de faturamento e de receita. Daí a inconstitucionalidade da inclusão do tributo, na base de cálculo do PIS e da Cofins.

Mais de 10 mil processos estavam com o andamento interrompido à espera da decisão do Supremo, que foi proferida em repercussão geral. A tese firmada pela Corte foi de que o “ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da Cofins”.

Além de Lewandowski, os ministros Cármen Lúcia, Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio e o decano Celso de Mello votaram pela exclusão do ICMS na base do PIS/Cofins.

A presidente do tribunal, relatora do caso, utilizou como principal argumento o fato de o ICMS não ser uma receita própria da empresa, mas um valor repassado ao Estado. Por conta disso, não seria possível incluir o imposto no conceito de faturamento, que é a base de cálculo do PIS e da Cofins.

Os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes ficaram vencidos. Eles entenderam que o faturamento “engloba a totalidade do valor auferido com a venda de mercadorias e a prestação de serviços”, o que incluiria o ICMS.

Leia a manifestação da PGR

Livia Scocuglia - Brasília

https://jota.info/tributario/pgr-pede-exclusao-do-icms-do-calculo-da-cprb-24042017

quarta-feira, 26 de abril de 2017

ICMS na exportação (III)


ICMS na exportação (III)


José Alexandre Saraiva


A coluna prossegue com a complexa temática das imunidades nas exportações, com base em parecer do jurista Heron Arzua.


ICMS na exportação (I)


ICMS na exportação (II)


“Se a interpretação teleológica do art. 153, § 2º, X, “ a”, da CF, leva à compreensão de que a imunidade nele prevista abrange todas as operações e pessoas que, de algum modo, concorram para que se perfaça a venda para o exterior, então todo o ciclo está desonerado da percussão do imposto.


Somente em caso de pagamento do imposto (por não se conhecer, por exemplo, à época, da destinação do bem), é que ter-se-ia o legítimo direito ao crédito daí decorrente e(ou) direito à devolução do montante do ICMS. Nesta última hipótese, é que teria cabida a regra da manutenção e aproveitamento do imposto cobrado nas operações anteriores, a que alude o texto constitucional.


Em efeito, o contribuinte que comprovar que a mercadoria irá para o exterior tem o direito de não pagar o imposto específico, como se recobrar do montante que porventura tenha sido pago nas operações anteriores. Daí a importância da cláusula final do texto que assegura a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores.


Com isso, há de se reconhecer que todas as mercadorias e serviços integrantes do processo de exportação estão agasalhadas pelo dispositivo constitucional, inclusive, por exemplo, os bens do ativo fixo, de uso e consumo, serviços de comunicação, transporte, energia elétrica etc.,que concorrem para colocar o produto no mercado exterior.


A aquisição desses bens, para que haja um ganho de produtividade na concorrência internacional, já há de se fazer sob o manto protetor da imunidade.


Em caso de pagamento do imposto pelas operações anteriores, iterativas decisões dos Tribunais de Justiça dos Estados asseguram, no tópico em que há liame com a exportação, o amplo direito ao crédito do imposto referente à aquisição de todas as mercadorias, bens de uso e consumo, bens do ativo fixo, serviços de comunicação etc.


As restrições da Lei Complementar 87, de 1996 – arts. 20 e 33 -, relativamente à postergação do direito ao crédito de mercadorias destinadas a uso e consumo (os denominados “créditos financeiros”)e outras hipóteses , não tem pertinência ao depois da Emenda Constitucional nº 42, de 2003.


Tais amesquinhamentos dos créditos, trazidos por lei complementar, perderam a validade diante do Texto Constitucional da EC 42-03, continuando reconhecidos tão somente para as operações no mercado interno, não obstante boa parte da doutrina pátria entenda que mesmo nessa hipótese o direito ao crédito flui da Carta Constitucional e não poderia ser limitada por lei infraconstitucional.


Mas, o tema aqui é a imunidade do ICMS nas exportações e o direito a crédito por todas as operações vem ganhando o prestígio do Poder Judiciário.”


Continua na próxima coluna.



http://www.gazetadopovo.com.br/economia/colunistas/de-olho-no-leao/icms-na-exportacao-iii-epwjr17u0z7ogp84330bx1t0z

Bill of Lading, Sea Waybill e a Receita Federal do Brasil




Bill of Lading, Sea Waybill e a Receita Federal do Brasil
Data de publicação:26/04/2017

Recentemente, escrevemos um artigo sobre a forma como o Brasil funciona quanto ao conhecimento de alguns intervenientes no comércio exterior. Isto é, nem sempre funciona. E a cada dia que passa nos surpreendemos mais com a forma como a própria Receita Federal do Brasil (RFB) age. Desconhecendo quase tudo que é vital para o bom funcionamento do comércio exterior do País.
A RFB age neste país apenas como arrecadadora de impostos e controladora das empresas que fazem comércio exterior. Ela parece não existir para ajudar, mas para tratar exportadores e importadores como não confiáveis. Sem falar que cada fiscal é uma Receita Federal. O Regulamento Aduaneiro publicado é um, mas sua interpretação é feita de milhares de maneiras. É só ver e perguntar a cada um que transita pela área. E, mais que isso, é só ver quantos controles existem para o comex. Bastaria um e temos aos borbotões. O resto, para ela, parece não ter muita importância.
O sentido de arrecadação fica patente quando olhamos para trás, ao longo dos anos, e vemos os absurdos já perpetrados. Em especial, importadores tendo de colocar no valor aduaneiro as despesas com capatazia ou THC - Terminal Handling Charge. Nomenclaturas utilizadas para movimentação de carga geral ou granel no primeiro caso e containers no segundo caso, nos terminais portuários. Esta é uma despesa portuária, portanto, no País, após o desembarque da mercadoria. Nem o próprio Regulamento Aduaneiro fala sobre isso. Ele apenas fala em despesas relacionadas com embarque e desembarque de mercadoria. É o desvirtuamento das nossas próprias normas. Embora saibamos que essa descrição é para evitar problemas internacionais.
E, ao longo do tempo, vemos os absurdos transcorrerem. Há alguns anos, vimos essa mesma RFB dispensar o conhecimento de embarque para retirada da mercadoria nos armazéns após o seu despacho. Mostrando novamente sua simples face arrecadadora. Em que para ela bastava o pagamentos dos impostos e "tchau".
Assim, prejudicando enormemente os intervenientes do comex, em especial os NOVCCs - Non Vessel Operating Commom Carrier, que passaram a não ter controle sobre seus créditos com os importadores. Visto que mesmo não os pagando, poderiam retirar a mercadoria. E prejudicando também os exportadores estrangeiros, pois os importadores poderiam retirar a mercadoria mesmo que os exportadores não tivessem enviado o conhecimento de embarque ao Brasil, por falta de recebimento pela sua venda. O que foi mudado depois de bastante tempo, mas não da forma adequada pela RFB.
Agora nos deparamos com mais uma coisa absolutamente inacreditável. E mais inacreditável se torna, pois vindo, novamente, da Receita Federal do Brasil. Não se consegue entender como ela não evolui para facilitação e ajuda ao nosso comércio exterior, que piora a cada dia.
Ela resolveu que apenas o Bill of Lading é um documento de transporte marítimo. E o documento hábil para o despacho e retirada da mercadoria. Que o Sea Waybill não é nada além de nada. Os dois documentos são contratos de transporte, recibo de carga e, respectivamente, título de crédito e título de propriedade. Não fosse assim, por que os armadores dariam um Sea Waybill como prova da entrega de carga a eles para o transporte? Sendo entregue como essa prova, e não servindo para despacho e, consequentemente, para retirada da mercadoria, para que ele serve? Nunca se viu os armadores entregando um Sea Waybill e, ao mesmo tempo, um Bill of Lading. O que seria um contrassenso sem precedentes.


Autor(a): SAMIR KEEDI
Bacharel em economia, professor da Aduaneiras e universitário de MBA, especialista em transportes e logística internacional, consultor e autor de diversos livros em comércio exterior, tradutor oficial para o Brasil do Incoterms 2000 e representante brasileiro para revisão do Incoterms 2010.

http://www.aduaneiras.com.br/Materias?email=true&origemEmail=resenha_comex&guid=aef5e4ae1a077a8972e4cad2d5bad577

De multa qualificada à multa empalhada




De multa qualificada à multa empalhada


Há relação entre agravamento da multa fiscal e constatação da prática de crime de sonegação?


Fernanda Regina Vilares
James Siqueira

A Lei 9.430/96, que trouxe diversas disposições gerais sobre a legislação tributária federal, regulamentou, em seu artigo 44, a aplicação das multas no lançamento de ofício, o qual se aperfeiçoa pela via do auto de infração. A redação desse preceito foi alterada algumas vezes nos últimos vinte anos, sendo certo que estas breves reflexões terão como base o texto mais recente, com as devidas remissões ao passado, quando necessário.


De acordo com inciso I do dispositivo legal, a multa será “de 75% (setenta e cinco por cento) sobre a totalidade ou diferença de imposto ou contribuição nos casos de falta de pagamento ou recolhimento, de falta de declaração ou declaração inexata”. Considerando que atualmente só se observa o lançamento por meio de auto de infração nas hipóteses descritas nesse preceito, é possível afirmar que esse percentual sancionatório é automático nos casos em que há sua lavratura.


Contudo o atual § 1o do referido artigo 44 prevê a possibilidade de duplicar esse valor, indicando as situações em que essa medida deve ser levada a cabo, quais sejam, as previstas nos artigos 71, 72 e 73 da Lei 4.502/64: sonegação, fraude e conluio. Note-se que foi mantida a técnica legislativa de remissão a outro diploma legal constante da redação original para se definir as situações em que a multa poderá atingir o patamar de 150% do valor do tributo devido. A única alteração no decorrer dos anos foi alusiva à exclusão da exigência de “evidente intuito de fraude”.


Na realidade, em que pese o fato de ser um conceito jurídico indeterminado, a noção axial de “evidente intuito de fraude” bem representava o contexto para o qual o legislador vislumbrava o agravamento da penalidade. A conexão entre os dispositivos legais foi apenas uma forma de conferir densidade semântica à circunstância que se quis censurar. A supressão da expressão pareceu ter a finalidade de proporcionar coordenadas cartesianas à autoridade administrativa. Noves fora, a eliminação da locução “evidente intuito de fraude” resultou no dever objetivo de duplicar o valor da multa quando for identificada uma das situações previstas naqueles dispositivos legais. Não há margem para discricionariedade interpretativa.


Os artigos 71, 72 e 73 da Lei 4.502/64 preveem três situações em que o contribuinte agiria de maneira desleal perante o Fisco: sonegação, fraude e conluio. Segundo Paulo Coviello Filho, sonegação seria a criação de embaraços para a fiscalização tomar conhecimento do fato gerador do tributo e seus aspectos de forma dolosa. Já a fraude seria a adulteração do fato gerador de modo doloso, o que poderia se caracterizar como simulação absoluta ou relativa. Nos termos do autor, a multa poderia ser qualificada por conta do artigo 72 quando identificado “ato doloso do agente que objetiva encontrar economia fiscal por meio de atos conhecidamente ilícitos”. Por fim, o conluio restaria configurado quando houvesse ajuste de vontade entre duas partes ou mais para o cometimento de sonegação ou fraude. Não seria possível o agravamento da penalidade pelo simples fato de haver um acordo entre partes[1].


Diante da clara ideia de que as condutas que ensejassem o agravamento da multa poderiam também configurar crimes contra a ordem tributária nos termos da Lei 8.137/90, já que representavam uma grave transgressão da ordem jurídica, as autoridades administrativas frequentemente representavam ao Ministério Público para a propositura da ação penal cabível quando aplicavam a multa qualificada.


Eis o primeiro flerte entre o tributário e o penal.


Ato contínuo, os advogados tributaristas, em tom de heureca, passaram a importar, no âmbito do processo administrativo fiscal, conceitos da parte geral do Código Penal. O silogismo que passou a imperar foi: se a multa indica a ocorrência de crime, basta demonstrar a inexistência de dolo para afastar a sanção tributária.


O “match” entre tributário e penal se deu quando o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), em reiterados julgados, abraçou a lógica defendida pelos contribuintes, atrelando a multa qualificada à presença do “dolo” em sua acepção criminal. Em que pese o fato de haver vertente bastante fiel à aplicação da multa qualificada entre as autoridades administrativas responsáveis pelos lançamentos de ofício, alguns precedentes do CARF são expressos em diferenciar o conceito de fraude civil e fraude penal para, então, concluir que, na ausência dessa última, não se admitir o agravamento da multa[2].


É comum a transcrição de trecho da obra de Marco Aurélio Greco afirmando que, embora o planejamento possa ser inoponível ao Fisco por não possuir propósito negocial e motivo extra-tributário, não há que se falar em sonegação ou fraude se o contribuinte apresenta todos os documentos solicitados pelo Fisco, assumindo uma postura transparente. Assim, ainda que constatada a existência de um planejamento tributário abusivo, se os conselheiros não identificam o “dolo” compatível com o elemento subjetivo exigido para a configuração do crime de sonegação fiscal, frequentemente equiparado ao não fornecimento dos documentos e informações exigidas pela administração tributária (ou o fornecimento com falsidade patente), a multa é afastada.


É claro que a Lei 4.502/64 exige que a conduta do contribuinte seja dolosa para configurar uma dessas “circunstâncias qualificativas”. Mas tal exigência leva à conclusão de que o dolo exigido para a qualificação da multa seria o mesmo elemento subjetivo necessário para a configuração de crime contra a ordem tributária?


Estamos seguros de que não.


O raciocínio elaborado pelos advogados — e largamente acatado pelo tribunal administrativo — reflete a intrigante arte de criar efeito sem causa.


No mínimo, por três razões.


Em primeiro lugar, com relação à enaltecida transparência do contribuinte que oferece ao Fisco a documentação, na esteira das lições de Marco Aurélio Greco, mencionadas parágrafos acima, entendemos que deva existir um corte entre a operação alegada pelo sujeito passivo e aquela que ele pretende encobrir.


A apresentação de documentos que pretensamente comprovariam a operação que o contribuinte diz ter realizado — o que é diferente da operação que de fato ele realizou — significa, na prática, o reforço da fraude ou, em termos mais diretos, a tentativa de induzir novamente o Fisco, agora com documentos que pouco ou nada dizem sobre o negócio jurídico eclipsado.


Sob tal perspectiva, o gesto de entregar documentos, por si só, não é sinal de boa-fé; a depender do contexto, pode ser o desdobramento da má-fé, porque concorre para o mascaramento da operação subjacente ou ao menos a tentativa de levar o embuste adiante.


Além disso, a legislação instituidora das hipóteses de incidência da multa não faz qualquer “tentativa de sinapse” com a legislação penal, mesmo após as inúmeras reformas. Foi mantida a opção de eleger como situações aptas a qualificar a penalidade aquelas previstas em uma legislação da década de 60 relativa a imposto sobre consumo. Embora os artigos 71 a 73 da Lei 4.502/64 integrem parte do regramento que tratava das infrações, isso não significa que seu conteúdo seja penal. Ao contrário, são previstas como circunstâncias qualificativas de multa fiscal, que fala muito mais perto do direito tributário do que do direito penal.


É certo que dolo é elemento subjetivo da conduta na estrutura do tipo penal, indispensável para configurar a tipicidade de acordo com a sistemática de nosso Código Penal e a teoria finalista (artigo 18, especialmente). Todavia, dolo também pode ser o vício do negócio jurídico firmado quando uma das partes foi levada a erro pela outra (artigo 145 do Código Civil). Ou seja, o conceito de dolo não é monopólio do direito penal; antes disso, é um conceito geral do direito, caracterizado, de forma tão simplificada quanto exata, como a vontade dirigida a um fim não tolerado pelo ordenamento.


A exigência da configuração do dolo no sentido penal para a aplicação de uma sanção tributária fecha todas as caçapas da mesa de sinuca, tornando o jogo impossível.


O direito tributário se pretende objetivo: o fato se subsume à regra matriz de incidência, não se exigindo do intérprete maiores compromissos com o exame da intencionalidade do sujeito passivo da relação jurídico-tributária. A própria exclusão da exigência do “evidente intuito de fraude” reafirma essa premissa. Noutro giro, totalmente inverso, o direito penal é francamente inspirado pelo princípio da culpabilidade, não se podendo enquadrar uma conduta no tipo sem aferir os elementos subjetivos envolvidos na situação.


O desencaixe do raciocínio fica patente se atentarmos para o fato de que, na grande maioria das vezes, as questões relativas a planejamento tributário envolvem apenas pessoas jurídicas, cuja responsabilidade penal no âmbito tributário não existe no ordenamento brasileiro.


Chegamos, assim, à última volta do parafuso, a terceira e final razão pela qual não se pode validar o sincretismo entre as formas de raciocinar as sanções tributária e penal: o fato de que se está a examinar, na maior parte das vezes, operações negociais e societárias praticadas por pessoas jurídicas, o que inviabiliza a análise do elemento intencional do sujeito passivo.


O máximo que se pode aferir com base no tipo de prova é se a pessoa jurídica atingiu um resultado compatível com a causa típica do negócio apresentado e, eventualmente, concluir pela existência de uma simulação com base em indícios. Mas parece óbvio que a transposição de conceitos é extravagante[3], considerando a necessidade de individualização da conduta dos administradores (pessoas físicas), de tal modo que seja possível cogitar de responsabilidade penal e, consequentemente, de crime contra a ordem tributária.


Ao se tornar inaplicável, mesmo em situações em que teria lugar, a multa qualificada caiu em desuso no tribunal administrativo e, por via de consequência, perdeu o viés disciplinador, subvertendo-se num instituto jurídico meramente retórico.


Pela avaliação que fazemos, essa é a síntese de um processo histórico decorrente da insondável associação entre regimes jurídicos lastreados em premissas bastante singulares, que nem sempre são miscíveis, resultando no esvaziamento da multa qualificada — um instrumento que, se bem concebido e aplicado, seria caro aos operadores da norma tributária, por desestimular práticas deliberadamente fraudulentas.


Verdade seja dita: apesar de válida e eficaz, a multa qualificada é uma peça empalhada, hoje exposta nas paredes do direito tributário, que mais ornamenta o sistema do que inibe malfeitos.


Não se desconhece e nem se ignora a difícil posição dos julgadores, às voltas de uma luta titânica entre a severidade de uma norma extrema e os sempre necessários chamados do bom senso. É possível, talvez provável, que os conselheiros do CARF se sensibilizem com o elevado valor da multa qualificada e desejem encontrar uma solução salomônica que não torne o ilícito inexpressivo, mas que também não onere o sujeito passivo de forma desproporcional, sobretudo quando os fatos julgados estão nas franjas da licitude com a má-fé.


Todavia, da mesma forma que eventual falta de temperamentos na aplicação da multa qualificada produz o efeito psicológico próprio das injustiças, a sua abstração deixa atrás de si um remanso de impunidade.


O problema parece ser de margem de atuação, já que não existe gradação para a multa qualificada que permita sua efetiva individualização, condição que, de fato, pode levar a injustiças. No entanto, essa é uma solução que deve ficar a cargo do legislador.


Enquanto estiverem em vigor os dispositivos legais regulamentadores do instituto, parece que, caracterizada a presença de dolo — que não é aquele sorvido do direito penal, mas a orquestração de condutas voltadas para um fim ilícito, tributário inclusive —, é imperiosa a aplicação da multa qualificada em todos os casos em que o planejamento tributário for desleal e nos quais forem observados atos de sonegação ou fraude nos termos das definições acima propostas. A análise da vontade dirigida ao fim de suprimir tributos por parte dos administradores, isto é, do dolo criminal, só poderá ser efetuada no âmbito da persecução penal.


Por último, uma rápida digressão.


Fosse legítimo o exercício de criar um diálogo de fontes entre direito tributário e direito penal, mais recomendável que a apropriação do conceito de dolo seria o aproveitamento das noções inerentes à dosimetria na pena, que, para avaliação da conduta do agente, leva em conta elementos atenuantes e agravantes descritos objetivamente na norma, de modo a traduzir o grau de censura para o ilícito. Ao que tudo indica, a carência vivenciada no direito tributário diz com a ausência de técnicas mais sofisticadas para a individualização da sanção — o que passa pela concepção de fórmulas descritivas que sirvam ao intérprete no momento de avaliar a conduta — e não com a sanção em si, que não pode ser rebaixada à condição de peça ornamental.


Seja como for, apesar de técnicas mais lúcidas para a gradação da multa qualificada ainda estarem pendentes de elaboração, o esvaziamento do instituto, pela radicalização da noção de dolo, deixa no palato o gosto metálico da impunidade.


————————————————-
[1] COVIELLO FILHO, Paulo. A multa qualificada na jurisprudência administrativa. Análise crítica das recentes decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. In Revista Dialética de Direito Tributário, n. 218, 2013, p; 132.


[2] Exemplo disso é o recente Acordão 1401-001.675, proferido no processo n. 10925.723080/201249 “No presente caso, a fiscalização sustenta a qualificação das multas com base na imputação de conduta dolosa ao planejamento tributário engendrado. Mas, não aponta qualquer falseamento ou manipulação de aspectos relevantes nessa situação. Nem mesmo a DRJ identificou problemas dessa natureza. Nada obstante, como já exposto, se isso não aconteceu, não posso concordar com a qualificação da conduta nas figuras da sonegação ou da fraude penais. O superfaturamento das operações de industrialização por encomenda está maculado pelo vício da causa. Mas daí não decorre que houve falsidade material na sua execução. Muito menos que houve conduta concretizada após a ocorrência do fato gerador (sonegação ou segunda parte da fraude) ou conduta concretizada no iter formativo do fato gerador (primeira parte da fraude).”


[3] Sobre a transposição de conceitos do direito penal para o processo administrativo tributário de forma equivocada, vale mencionar a ideia constantemente repetida de que o erro de proibição excluiria o dolo no planejamento tributário. No entanto, o artigo 21 do Código Penal é claro em dizer que o erro de proibição apenas isenta de pena, sendo excludente de culpabilidade.


Fernanda Regina Vilares - Procuradora da Fazenda Nacional da Divisão de Acompanhamento Especial da 3a. Região, Mestre e Doutora em Processo Penal pela Faculdade de Direito da USP. Especialista em Direito Penal Econômico IBCCRIM/COIMBRA. Colaboradora do IBCCRIM – Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Professora de Direito Penal Tributário na GVLaw


James Siqueira - Procurador da Fazenda Nacional lotado em São Paulo. Formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Especialista em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Milita na Divisão de Acompanhamento Especial (DIAES) da Procuradoria Regional da Fazenda Nacional na 3ª Região


https://jota.info/colunas/contraditorio/de-multa-qualificada-a-multa-empalhada-17042017

terça-feira, 25 de abril de 2017

ICMS na exportação (II)


ICMS na exportação (II)


A coluna anterior versou sobre a primeira parte da consulta formulada por uma empresa acerca da imunidade de ICMS na exportação. A consulente afirma que suas operações com tais mercadorias são feitas assumindo-se referida imunidade, o que ensejou a instauração de contenciosos administrativo-fiscais, com risco a seu patrimônio.


Leia mais: ICMS na exportação (I)


O assunto foi, recentemente, objeto de alentado parecer da lavra do tributarista Heron Arzua, em cujas ensinanças esta coluna louva-se, sempre que possível, para esclarecer dúvidas de seus leitores, notadamente quanto a temática envolve tributos estaduais e municipais.


Vamos à segunda parte do aludido parecer, aqui reproduzido de forma resumida:

“É que a imunidade, como fixou o Supremo Tribunal Federal, interpreta-se de forma ampla, de modo a transparecer os princípios e postulados consagrados na Constituição. (STF, Pleno, RE 87.049-4, SP, rel. Min. Xavier Albuquerque, j. 13.04.78, DJ 01.09.78; STF, 2ª. T., RE 102.141-1, RJ, re. Min. Carlos Madeira, j. 18.10.1985, DJ 29.11.1985.)


Impende noticiar recente decisão do Tribunal de Justiça do Paraná, a qual confirma a exegese da doutrina de que as operações de exportação de mercadorias para o exterior abrangem toda a cadeia produtiva. Ipsis:


“Operações de exportação de mercadorias em relação ao icms (art. 155, §2º, x, “a”, da cf) que possivelmente abrange toda a cadeia produtiva, inclusive a venda primitiva da matéria-prima pelo produtor rural à indústria de beneficiamento – precedente do STF – periculum in mora consubstanciado na oneração da mercadoria, prejudicando sua competitividade no mercado externo.“(Apelação Cível 893.466-3, da 4ª. Vara da Fazenda Pública da Comarca de Curitiba. Rel. Juíza Josely Dittrich Ribas)


E no corpo do Acórdão, a d. Relatora anota o precedente jurisprudencial da Suprema Corte, ipsis:


“De fato, é relevante o argumento de que aimunidade constitucional das exportações de mercadorias (art. 155, §2º, X,“a”, da CF/88 e art. 3º, II, da LC nº 87/96) impede a incidência do ICMS nãosó na última operação (exportação propriamente dita), como também emtoda a cadeia produtiva, ou seja, desde a comercialização da matéria prima(“tabaco cru”) pelo produtor rural à indústria de beneficiamento até aefetiva exportação da mercadoria já industrializada/beneficiada.O STF já adotou esse entendimento:TRIBUTO. ICMS. Exportação de produtos industrializados.Imunidade. Limitação apenas às operações realizadascom moeda estrangeira. Restrição imposta pelo DecretoEstadual nº 7.004/90 e Convênio ICMS nº 4/90.Inadmissibilidade. Recurso Extraordinário não provido. Aimunidade do ICMS relativa à exportação de produtosindustrializados abrange todas as operações quecontribuíram para a exportação, independentemente danatureza da moeda empregada.(STF, RE 248499, Relator Ministro Cezar Peluso, 2ª. Turma, j. 27.10.2009).”


Outro acórdão consagra a inteligência da Justiça Paranaense:


“Apelação cível e reexame necessário - ação declaratória - prestação de serviço que antecede a exportação que deve ser abrangida pela isenção do icms - art. 155, § 2º, x, cf e art. 3º, ii da lc 87/96 - imunidade tributária conferida a todas as etapas do processo de exportação - prestação de serviço destinada à zona franca de manaus que também é isenta do recolhimento do ICMS - art. 4º do decreto -lei 288/67 - precedentes dos tribunais superiores e desta corte - sentença mantida em reexame necessário - recurso desprovido.A teleologia da exoneração tributária na exportação é tornar o produto brasileiro mais competitivo no mercado internacional e alberga todas as etapas do processo produtivo, inclusive o transporte e outros.” (TJPR - 2ª C.Cível - ACR - 920355-4 - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Cunha Ribas - Unânime - - J. 16.10.2012).


O Tribunal de Justiça de Minas Gerais tem idêntica compreensão do assunto:


“A imunidade conferida no artigo 155, §2º, X, “a”, da CF/88 estende-se a qualquer participante da cadeia produtiva de mercadoria destinada à exportação, razão pela qual faz-se irrelevante eventual beneficiamento do café adquirido pela exportadora antes de seu envio ao mercadoexterno (Ap.Cív. 1.0003.07.023864-1/001, Relator: Des. Dídimo Inocêncio de Paula , 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 18/08/2011, publicação da súmula em 26/08/2011.).”


De igual teor, a determinação do TJ de São Paulo:


“Ação Anulatória de lançamento fiscal - ICMS Imunidade tributária - A imunidade concedida às exportações beneficia toda a cadeia produtiva, eliminando do campo de incidência do ICMS todo o ciclo de exportação, desde as operações de aquisição de matéria prima e insumos, até o fim do ciclo, quando a pessoa física ou jurídica estrangeira toma a mercadoria ou serviço. (TJSP - 2ª Câm. Dto. Públ.–Ap. Cív. 0019522-68.2011. 8.26.0053 - Comarca de São Paulo - Rel.: Alves Bevilacqua - Unânime - - J. 19.02.2013)


Continua.


http://www.gazetadopovo.com.br/economia/colunistas/de-olho-no-leao/icms-na-exportacao-ii-bdgr5rnfdcp9yzvyocde4q61w

Software de Prateleira

Receita muda tese sobre IRPF em licenciamento de "software de prateleira"

No dia 5 de abril de 2017, foi publicada a Solução de Divergência 18, através da qual a Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) da Receita Federal do Brasil (RFB) reformou entendimento proferido anteriormente relacionado à incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre remessas ao exterior envolvendo a licença de direitos de comercialização de software.
Em 2008, em função das divergências de interpretação no âmbito da própria RFB, foi emitida a Solução de Divergência Cosit 27, que determinou que “os valores remetidos ao exterior em pagamento pela aquisição ou pela licença de direitos de comercialização de software sob a modalidade de cópias múltiplas (software de prateleira)” não estariam sujeitas ao IRRF e à Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) de que trata a Lei 10.168/00.
Tal Solução de Divergência foi emitida à época para uniformizar o entendimento acerca da incidência de IRRF (e da CIDE) sobre pagamentos ao exterior envolvendo o licenciamento do denominado “software de prateleira” e foi pautada na interpretação dada em 1998 pelo Supremo Tribunal Federal  no julgamento do Recurso Extraordinário 176.626-3, onde se discutiu a incidência do ICMS na operação interna de licenciamento de software.
Naquela decisão, o STF fez uma distinção entre o “software de prateleira” (off the shelf) e o “software feito sob encomenda”, entendendo que o primeiro, por ser um software padrão, comercializado em larga escala para uma pluralidade de usuários seria equiparável à uma mercadoria para fins de incidência do ICMS. Já o “software feito sob encomenda” ou “à medida do cliente” não seria equiparável à mercadoria, por ser desenvolvido para atender necessidades específicas de um determinado usuário/cliente.
Assim, a RFB se baseou nesses conceitos dados pelo STF para proferir o entendimento exarado através da Solução de Divergência 27/08 de que não haveria incidência de IRRF no caso de remessas pela licença de direitos de comercialização de “software de prateleira”. A lógica desse entendimento é a de que nas situações em que o software tem a natureza de “mercadoria” (“software de prateleira”), o que se pagaria na operação de “aquisição”/licenciamento não teria a natureza de rendimento para fins de incidência do IRRF, mas de preço.
Pois bem. A recente publicada Solução de Divergência Cosit 18/17 reformou a Solução de Divergência Cosit 27/08, estabelecendo o seguinte:
“As importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas a residente ou domiciliado no exterior em contraprestação pelo direito de comercialização ou distribuição de software, para revenda a consumidor final, o qual receberá uma licença de uso do software, enquadram-se no conceito de royalties e estão sujeitas à incidência de Imposto sobre a Renda na Fonte (IRRF) à alíquota de 15% (quinze por cento). SOLUÇÃO DE DIVERGÊNCIA QUE REFORMA A SOLUÇÃO DE DIVERGÊNCIA Nº 27, DE 30 DE MAIO DE 2008. Arts.1º e 2º da Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998; art. 7º, inciso XII, da Lei nº 9.610, de 2 de fevereiro de 1998; art. 710 do Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999.”
 Dessa forma, de acordo com o novo entendimento da RFB, os valores devidos ao exterior relacionados ao licenciamento para comercialização ou distribuição de software caracterizam pagamento de royalties e, como tal, sujeitam-se à incidência do IRRF à alíquota de 15% nos termos do artigo 710 do Regulamento do Imposto de Renda (RIR/99), ainda que o software objeto da contratação tenha a natureza de “software de prateleira”.
A RFB se baseou em artigos da Lei 9.609/98 (Lei de Software) e da Lei 9.610/98 (Lei de Direitos Autorais) para distinguir os contratos de licença de uso de software dos contratos de licença de comercialização de software, justificando a mudança de entendimento no fato de que a decisão de 1998 do STF que fez a distinção entre o “software de prateleira” e o “software por encomenda” teria analisado apenas os contratos de licença de uso.
Na fundamentação apresentada na Solução de Divergência 18/17, a Cosit menciona que os contratos de licença de uso estão previstos no artigo 9º da Lei de Software, enquanto que os contratos de licença de comercialização estão previstos em seu artigo 10. Outra forma de contratação tendo o software como objeto é aquela que envolve a transferência de tecnologia (transferência do código-fonte, em especial) e, que por sua vez, está prevista no artigo 11 da Lei de Software.
No entendimento da Cosit, na relação entre a empresa estrangeira que detém os direitos de propriedade intelectual sobre o software e o “distribuidor”/“revendedor” no Brasil, haveria apenas a licença para comercialização. A contratação de uma licença de uso do software propriamente ocorreria apenas “no percurso entre o distribuidor ou revendedor e o cliente, ou seja, no momento em que o distribuidor ou revendedor fornece as licenças de uso de software a seus clientes”.
Cabe mencionar que a publicação da Solução de Divergência 18 se fez necessária em função da publicação da Solução de Consulta Cosit 154, de 18 de novembro de 2016.
O texto, ao analisar a incidência de IRRF em remessa pelo direito de duplicação e comercialização de software, a partir de uma fita master fornecida pelo seu autor, para revenda a cliente, entendeu que o valor devido se enquadra no conceito de royalties sujeito ao IRRF nos termos do artigo 710 do RIR/99. Reconhecendo que essa decisão estava em dissonância com o entendimento anterior contido na Solução de Divergência Cosit 27/08, a RFB resolveu reformar a decisão, emitindo a Solução de Divergência nº 18.
Esse novo entendimento da RFB, proferido através da Solução de Divergência 18, apesar de estar bem fundamentado nas disposições legais que regulam os contratos envolvendo o uso e licenciamento de software, pode ser objeto de debates e raciocínios.
Se é possível entender que na licença de uso do “software de prateleira” a cliente/consumidor final, o software tem a natureza de mercadoria, porque o mesmo entendimento não poderia ser aplicado na licença de comercialização do software entre o licenciante no exterior e a “distribuidora”/“revendedora” no Brasil?
Possivelmente, se esta pergunta fosse direcionada ao Fisco, o mesmo argumentaria que a “aquisição” do “software de prateleira” se daria apenas na relação com o usuário efetivo do software (consumidor/cliente) e que a empresa brasileira que recebe a licença para comercialização do software não “adquire” propriamente o software, mas apenas recebe o direito de comercializá-lo.
Todavia, pode-se pensar também que, diante de sua natureza de obra intelectual protegida pelas normas de direitos autorais, o software licenciado não é de fato “adquirido” pelo consumidor/cliente. E se é possível aplicar nessa relação de licenciamento de uso entre o “distribuidor”/“revendedor” (autorizado a sublicenciar o software) e o consumidor/cliente, a ficção jurídica de que o que se está transacionando seria uma “mercadoria” objeto de compra e venda (raciocínio do STF no RE 176.626-3), por que a mesma ficção jurídica não poderia se aplicar na relação entre o licenciante no exterior e a licenciada (“distribuidor” / “revendedor”) no Brasil? Afinal, em ambos os casos, nos termos da Lei de Software, a forma de contratação se dá através de uma licença.  
De todo modo, cabe lembrar que as Soluções de Divergência da Cosit tem efeito vinculante no âmbito da RFB, devendo obrigatoriamente ser observadas pelos seus auditores fiscais. Assim, não obstante seja sempre possível discutir administrativamente ou judicialmente a matéria, é fato de que diante desse novo posicionamento da RFB, a ausência de recolhimento do IRRF sobre as remessas a título de direitos de comercialização de “software de prateleira” implicará riscos de autuação fiscal.
Finalmente, cabe comentar que a reforma da Solução de Divergência 27/08 não traz implicações em relação à não incidência da CIDE sobre os valores devidos ao exterior pela licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de software, que advém de lei (§ 1º-A, do art. 2º da Lei 10.168/00, incluído pela Lei 11.452/07). A CIDE continua sendo devida apenas nos contratos que envolverem a transferência da tecnologia (código-fonte). 
 é advogada, sócia júnior de Direito Tributário do Demarest e Almeida Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 16 de abril de 2017, 11h07

Importação Paralela

Na importação paralela, benefícios tendem a ser menores que malefícios

A proteção conferida a todos os bens industriais decorre da necessidade de se garantir o retorno do investimento feito por aqueles que realizam pesquisas e promovem o desenvolvimento de produtos e serviços que melhoram a vida da sociedade. Não fosse essa proteção, inexistiria interesse no progresso, salvo os de forma altruísta que em razão dos altos custos envolvidos são demasiadamente escassos, ou os para utilização na guerra.
Há pesquisas, inclusive, que apontam que, em mercados nos quais as marcas e patentes têm proteção relevante, a média de qualidade dos produtos é maior.
Atento a essa situação, o constituinte originário previu expressamente a necessidade de se garantir essa proteção no artigo 5º, inciso XXIX, da Constituição da República.
No que concerne especificamente à marca, para que ela seja protegida, deve ser registrada e, portanto, dotada de novidade relativa (basta que seja relativa em razão de a proteção ser em regra conferida apenas no segmento mercadológico em que o produto está inserido), não colidir com notoriamente conhecida (artigo 126 da Lei 9.279/96) e não incorrer em impedimento (artigo 124 da Lei 9.279/96). Em regra, feito esse registro, surge para o titular da marca o direito de proteção contra o seu uso por terceiros sem autorização.
A doutrina do first sale combinada ao princípio da exaustão estabelece que essa proteção da propriedade intelectual contra venda ou utilização do produto ou serviço sem a autorização do titular do direito restringe-se à primeira venda, exaurindo-se na sequência. Melhor explicando, após a introdução pelo titular do direito industrial do produto ou serviço protegido no mercado, qualquer pessoa pode aliená-lo, encerrando-se o direito de proteção.
O objetivo da utilização do princípio da exaustão é exatamente promover um equilíbrio entre os interesses do titular do direito industrial e os interesses do mercado e dos consumidores.
É nesse contexto que se insere a importação paralela, objeto específico do presente artigo. Ela, segundo Edson Takeshi Nakamura e Eduardo Kenji Goto, diz respeito a produtos e serviços vendidos inicialmente fora do Brasil e que são introduzidos aqui por meio de importação feita por pessoa distinta do titular da propriedade industrial ou que não detenha o direito de uso dessa propriedade. Os bens importados dessa maneira recebem o nome de grey goods.
A exaustão, nessa conjuntura de limitação à proteção da propriedade intelectual e importação paralela, conforme a advogada Maristela Basso e também a juíza de Direito Helena Cândida Lisboa Gaede, pode ter seu conceito tomado em âmbito nacional, internacional ou regional.
Na exaustão nacional, a venda de um produto protegido em determinado país não gera efeitos extintivos da proteção do direito industrial em outro país, ou seja, feita a venda do produto no país “X”, a revenda interna e internacional passa a ser livre, porém, o produto vendido no exterior não poderá entrar no país importador sem a autorização do titular da marca ou do seu representante nesse país. Trata-se de hipótese em que a importação paralela é claramente proibida.
Na exaustão internacional, as importações paralelas são permitidas, desde que o ingresso do produto no mercado, nacional ou internacional, tenha sido feito inicialmente pelo detentor do direito de propriedade industrial ou por alguém autorizado por ele.
Finalmente, na exaustão regional, aplica-se o mesmo conceito da exaustão internacional, mas agora não considerando apenas um país, e sim um conjunto deles, como no caso da União Europeia.
A base constitucional que fundamenta a proteção da propriedade industrial está inserida nos artigos 5º, inciso XXIX, 170, inciso IV e 219, todos da Constituição da República.
Como se depreende dos referidos dispositivos, busca-se proteger tanto o direito à propriedade industrial, até como forma de promover o desenvolvimento científico e tecnológico nacional, quanto a livre concorrência.
Logo, cabe ao intérprete, objetivando manter a coerência constitucional e tendo em vista o princípio da unicidade, fazer a interpretação no caso concreto de forma a garantir a harmonização constitucional.
Infraconstitucionalmente e dando concretude ao artigo 5º, inciso XXIX, da Constituição Federal foi editada a Lei 9.279/96, cujo destaque neste momento é voltado para os seus artigos 129, 130 e 132. Da leitura desses dispositivos é fácil constatar a proteção conferida à propriedade industrial.
No que diz respeito à importação paralela, importante verificar que o artigo 130, inciso III oferece o fundamento para que o titular do direito de propriedade industrial evite a diluição da sua marca ou daquela que representa, seja em razão da sua falsificação, seja em razão do seu uso não autorizado.
Já o artigo 132, inciso III impõe um limite ao exercício do direito de propriedade sobre a marca.
Conforme bem explanado por Maristela Basso, "no que diz respeito aos limites no exercício dos direitos de marca, o Brasil incorporou o conceito de exaustão de direitos em nível nacional, com expressa ressalva das situações previstas nos §§3º e 4º do art. 68 da LPI". Tal conclusão também vem exposta no artigo A (i)licitude das importações paralelas frente às práticas de concorrência desleal, de Ricardo Minner, e no artigo Importação paralela e concorrência desleal, da juíza de Direito Helena Cândida Lisboa Gaede.
No mesmo sentido é entendimento do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.200.677/CE, de relatoria do ministro Sidnei Beneti, julgado em 18/12/2012:
No tocante ao regramento dado pelo sistema jurídico brasileiro às hipóteses de "importação paralela", deve-se indicar que o art. 132, III, da Lei n. 9.279/1996 proíbe que o titular da marca impeça a livre circulação de produtos originais colocados no mercado interno por ele próprio ou por outrem com o seu consentimento. Ou seja, permitiu-se a chamada comercialização paralela interna ou nacional, hipótese em que, após a primeira venda do produto no mercado interno, o direito sobre a marca se esgota, de modo que o titular da marca não poderá mais invocar o direito de exclusividade para impedir as vendas subsequentes. Com isso, a nova Lei da Propriedade Industrial incorporou ao sistema jurídico brasileiro o conceito de exaustão nacional da marca, segundo o qual o esgotamento do direito sobre a marca somente se dá após o ingresso consentido do produto no mercado nacional, o que implica afirmar que o titular da marca ainda detém direitos sobre ela até o ingresso legítimo do produto no país. Dessa maneira, o titular da marca internacional tem, em princípio, o direito de exigir o seu consentimento para a "importação paralela" dos produtos de sua marca para o mercado nacional (grifo nosso).
A adoção do conceito de exaustão nacional, portanto, fica evidenciada em razão de o texto do artigo 132, inciso III, da LPI expressamente prever que o titular da marca não pode impedir a circulação de produtos que tenham sido introduzidos por ele ou por outrem com o seu consentimento no mercado interno. A contrário senso, ele pode impedir a primeira venda (first sale) no mercado interno, sem o seu consentimento, de produtos que ostentem a marca registrada por ele ou cuja autorização de uso lhe pertença.
Sendo assim, as condições para aplicação do princípio da exaustão e, portanto, para vedação do exercício de qualquer direito protetivo por parte do titular da marca são: a) mercado interno; e b) produto colocado no mercado interno pelo titular da marca ou com o seu consentimento claro e inequívoco.
Inexistindo qualquer dessas condições, não se aplica o princípio da exaustão e, consequentemente, o titular da marca ou o seu representante autorizado possuem direito de restrição do comércio dos seus produtos no mercado nacional.
A questão que se levanta neste ponto é sobre a conformidade com a intenção do constituinte e do legislador de se permitir que produtos adquiridos por importadores paralelos no exterior e introduzidos no mercado nacional tomem mercado de empresas que tem autorização da marca para importar, contratam pessoas para o desenvolvimento dos trabalhos, investem em marketing, tecnologia, pós-venda, promoções, informações, dentre outros.
A título de exemplo, pode-se citar o caso de uma empresa, representante exclusiva da marca “X” no Brasil, que ao promover o recall do equipamento “y” descobriu que apenas 22% dos produtos enviados pelos consumidores tinham sido adquiridos no país. Os outros 78% foram adquiridos no exterior, mas os consumidores, por óbvio e pela seriedade do trabalho, procuraram a empresa brasileira no momento do recall, e não os importadores paralelos que colocaram esses produtos no mercado (a empresa concordou em divulgar as informações, mas não concordou com a divulgação de dados que pudessem identificá-la no mercado).
A aceitação dessa nova realidade pode fazer com que não seja economicamente viável investir em contatos, pesquisa e desenvolvimento, mas tão somente trazer o produto para o país da forma mais econômica possível, com menor responsabilidade, o que pode gerar, além de prejuízo para o mercado e para os consumidores, o incremento na prática do crime de descaminho tipificado no artigo 334 do Código Penal.
A chance de isso ocorrer decorre do fato de que os importadores paralelos compram produtos legítimos no exterior, mas os trazem sem a sua oficial internalização.
Afora isso, há a possibilidade de configuração do crime tipificado no artigo 195 da Lei 9.279/96, ou seja, da prática do crime de concorrência desleal, na medida em que o terceiro não autorizado pela marca estará utilizando-se de meio fraudulento para retirar a clientela do real legitimado à realização da primeira venda do produto no mercado nacional.
Um ponto muito comum de equívoco no que diz respeito à importação paralela é o pensamento de que elas são sempre boas para o consumidor na medida em que permitem que ele compre produtos com preços mais baixos.
O primeiro problema de se considerar isso totalmente correto é que os produtos importados paralelamente muitas vezes não estão sujeitos à tributação, seja porque vendidos em pequenas quantidades pela internet, seja porque o importador paralelo subfatura os produtos e paga menos impostos. Além disso, o importador legal muitas vezes tem que certificar o produto perante o Inmetro, o que gera maiores custos. Esse procedimento não é feito pelos importadores paralelos. Logo, a base comparativa de preços já tem início em premissa equivocada de que tanto o importador legal quanto o importador paralelo pagam o mesmo preço pelos produtos.
Afora isso, o propósito dos importadores paralelos é obter maiores lucros. Logo, possivelmente quando retirarem o importador legal do mercado, aumentarão os preços para lucrar mais.
No mais, como já exposto anteriormente, os importadores paralelos não investem em pesquisa e desenvolvimento, diferente dos importadores legais.
Conclui-se, portanto, que os benefícios eventualmente gerados pela autorização da importação paralela, em regra, tendem a ser muito menores que os malefícios causados por ela.
Valho-me, neste ponto, dos argumentos favoráveis e contrários à importação paralela expostos por Maristela Basso.
Argumentos favoráveis à importação paralela:
a) obstáculo à segmentação do mercado e, portanto, à cobrança de preços diferenciados em diversos mercados;
b) bem estar do consumidor com acesso a produtos mais baratos com a mesma qualidade;
c) restrição à discriminação geográfica de preços; e
d) incentivo ao livre comércio.
Argumentos contrários à importação paralela:
a) manutenção da consistência e da qualidade do produto ou serviço, na medida em que as exigências técnicas de um mercado podem não ser as mesmas de outro e importadores paralelos podem não ter os cuidados necessários no transporte ou embalagem dos produtos;
b) serviços de assistência e manutenção pré e pós-vendas, além de treinamento de vendedores, fornecimento de informações técnicas aos consumidores, show-room, garantia, dentre outros;
d) em um território no qual se permita a importação paralela fica mais difícil ao importador legal/produtor prever a capacidade de êxito dos seus investimentos o que, por consequência, diminui esses investimentos;
e) as importações paralelas geram uma dificuldade maior na revelação de cópias ilícitas como, por exemplo, de produtos pirateados ou contrafeitos, ou seja, essas cópias podem entrar no país como importações paralelas; e
f) importações paralelas desfavorecem a pesquisa e o desenvolvimento o que, ao final, pode gerar menores possibilidades de escolhas e disponibilidade de produtos aos consumidores, além de diminuição da qualidade dos produtos oferecidos.
Logo, apesar da restrição à importação paralela poder aparentar ter um aspecto restritivo e limitador da concorrência, ela impede a ocorrência do free rider, ou seja, que determinadas empresas se aproveitem dos investimentos feitos por outra (seja ela fabricante ou importador autorizado) sem que tenham contribuído com trabalho ou dinheiro para o desenvolvimento da marca e incremento da qualidade dos produtos e do atendimento ao consumidor.
Evitar o free rider é forma de garantir empregos no Brasil, a qualidade dos produtos e os investimentos feitos em marketing, pós-venda e garantia (atentando-se para o fato de que a garantia de produtos importados onera aquele que a presta, já que ele tem custos com frete internacional, por exemplo), além de assegurar a manutenção de investimentos na marca e informações técnicas adequadas aos consumidores.
De todo o exposto, fica a reflexão acerca dos rumos que se pretende dar ao mercado nacional: favorecer as empresas que investem em pesquisa e desenvolvimento ou importam legalmente suas mercadorias, proibindo as importações paralelas e mantendo-se a adoção do princípio da exaustão nacional; ou liberar integralmente as importações paralelas, acolhendo-se os pontos favoráveis a ela como os mais importantes no equilíbrio buscado e para o maior bem-estar dos consumidores nacionais, seguindo-se, então, o regime da exaustão internacional.
Faz-se necessária, porém, uma definição, para que todos os agentes atuantes no mercado, sejam importadores ou representantes legalmente autorizados pela marca, sejam os atuais importadores paralelos e até mesmo os consumidores, tenham conhecimento exato do mercado em que estarão atuando e dos seus direitos e deveres nesse mercado.

Referências bibliográficas
BASSO, Maristela. Propriedade intelectual e importação paralela. São Paulo: Atlas, 2011.
COELHO, Fábio Ulhoa. Direito Comercial, volume 1. 16 ed., São Paulo: Saraiva, 2012.
GAEDE, Helena Cândida Lisboa. Artigo: importação paralela e concorrência desleal.
NAKAMURA, Edson Takeshi e GOTO, Eduardo Kenji. Artigo: importação paralela à luz da legislação de propriedade intelectual e da concorrência.
MINNER, Ricardo. Artigo: a (i)licitude das importações paralelas frente às práticas de concorrência desleal.
 é juíza federal substituta.

Revista Consultor Jurídico, 18 de abril de 2017, 6h14

IPI importação: novas perspectivas




IPI importação: novas perspectivas


Tadeu Puretz


Durante muitos anos, prevaleceu a tese no sentido de que a incidência do IPI na importação de bens para uso próprio violaria o princípio da não-cumulatividade, motivo pelo qual restaria afastada a tributação na modalidade.

O IPI na modalidade importação vem sendo objeto de intensos debates entre contribuintes e fisco nos últimos tempos. Um dos mais interessantes tem por objeto a incidência de IPI importação sobre bens importados para uso próprio que, diante da recente alteração de entendimento1 do STF, merece ser objeto de reflexão, principalmente no que se refere ao alcance daquele precedente.

No julgamento do RE 723.651/PR, cuja repercussão geral foi reconhecida pelo tribunal, restou definida a incidência do IPI na importação de veículos automotores por pessoas físicas, posição que se contrapõe ao longo período de decisões proferidas de forma favorável aos contribuintes.

Durante muitos anos, prevaleceu a tese no sentido de que a incidência do IPI na importação de bens para uso próprio violaria o princípio da não-cumulatividade, motivo pelo qual restaria afastada a tributação na modalidade. Ante o julgamento do precedente em comento, o entendimento do STF foi diametralmente alterado, passando a acolher a tese sustentada pelo fisco, sob o fundamento de que a não tributação das operações desta natureza colocaria o produto estrangeiro em situação de vantagem em comparação ao produto nacional.

Nesse sentido, este trabalho busca trazer algumas reflexões, de forma breve e concisa, acerca do alcance do entendimento firmado naquela corte, especialmente sob o fundamento de que a tese de repercussão geral firmada naquela oportunidade está limitada às operações de importação de veículos automotores por pessoas físicas, não se estendendo aos outros bens importados por não contribuintes, especialmente quando o bem importado não encontra similar produzido dentro do território nacional.

O IPI é tributo de competência da União Federal previsto no art. 153, IV da CRFB/88, cujos critérios especiais estão estabelecidos no §3º do mesmo dispositivo. O Código Tributário Nacional, por seu turno, foi o diploma eleito para regulamentar os aspectos gerais relacionados ao tributo, através dos artigos 46 e seguintes.

O imposto em questão tem por base econômica as operações com produtos industrializados, especificamente sobre o resultado do processo produtivo, ou seja, a operação jurídica que envolve "a prática de um ato negocial do qual resulte a circulação econômica do produto industrializado2". O próprio legislador constituinte determinou, ao elencar no §3º do art. 153 os critérios constitucionais3 para a instituição do IPI, características essenciais como a não cumulatividade, seletividade e extrafiscalidade.

Dentre as características apresentadas, nos dedicaremos à primeira, na medida em que foi o fundamento sob o qual o entendimento dos tribunais superiores se manteve, por muitos anos, favorável aos contribuintes4.

Conforme mencionado, a não cumulatividade constitui técnica de tributação que tem por objetivo impedir a oneração tributária excessiva sobre operações que, por sua essência, ocorrem em cadeia. Assim, sendo o tributo não cumulativo, o constituinte autorizou a dedução dos valores devidos nas fases posteriores da cadeia com os valores suportados nas operações anteriores5.

O próprio texto constitucional dispõe nesse sentido, ao asseverar que o tributo se torna não cumulativo "compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores" (art. 153 §3º, II, da CRFB/88). A incidência do IPI sobre a importação, por seu turno, está prevista no artigo 51, I do CTN6 e no decreto 7.212/10 – RIPI. A não cumulatividade deve ser igualmente observada nas operações de importação, na medida em que tais operações constituem modalidade de incidência do referido tributo, atraindo a aplicação de todos os aspectos básicos desenhados na Carta Magna de 1988."7

A aplicação da não cumulatividade, especificamente na modalidade importação, autoriza que o importador acrescente ao preço do produto vendido para o próximo elo da cadeia o valor recolhido a título de tributo no desembaraço aduaneiro, através do fenômeno jurídico-tributário conhecido como repercussão tributária.

O tema passou a ser objeto de discussão na doutrina e da jurisprudência nas operações realizadas por pessoas físicas ou jurídicas que importam para uso próprio, ou seja, sem repasse do ônus fiscal para os elos seguintes da cadeia produtiva, hipótese que, segundo os contribuintes, violaria a não cumulatividade.

Nesse aspecto, a jurisprudência enfrentou tema semelhante quando analisou a incidência do ICMS sobre a importação, imposto também submetido a não cumulatividade. Naquela oportunidade, restou consignado que a cobrança apenas seria possível se a Carta Magna fosse modificada através de emenda, passando a prever exceção à regra da não cumulatividade. Tal hipótese se consolidou com a publicação da EC 33/01, que assegurou a incidência do ICMS na importação – ainda que o importador fosse pessoa física ou não contribuinte do ICMS – através da autorização expressa da incidência cumulativa em tal operação8.

Repita-se, o mesmo entendimento foi, até o julgamento do RE 723.651/PR, aplicável aos julgamentos sobre o tema pelos tribunais brasileiros, não somente no caso de importação de veículo por pessoas físicas, mas também na importação de outros bens, inclusive por pessoas jurídicas.



Nesse sentido o precedente abaixo:

"A hipótese dos autos cuida da incidência do IPI nos casos de importação de equipamentos médicos por pessoa jurídica prestadora de serviço, para uso próprio(...) 3. Não há previsão constitucional expressa que ampare a incidência do IPI na importação, diferentemente do que ocorre com o ICMS, a que se refere o art. 155, § 2º, inciso IX, alínea a, da Constituição Federal, com a redação da EC 33/01. 4. Agravo regimental não provido."9


Ante as questões preliminares, cumpre analisar o julgamento do RE 723.651/PR, cuja repercussão geral foi reconhecida pelo STF, especialmente para sustentar a aplicação restritiva do entendimento firmado àquelas operações realizadas por pessoas físicas nas importações de veículos, diante da tese minimalista ali sustentada, levando a crer que a tese não se aplicaria, portanto, às demais operações de importação realizadas por não contribuintes.


Naquela oportunidade, os ministros decidiram que os importadores de veículos pessoa física, ainda que não realizassem operação comercial posterior, deveriam recolher o IPI, sob o argumento de que a não incidência ofenderia a isonomia e a extrafiscalidade.


A afronta, segundo os julgadores, se daria pela incidência do IPI sobre os bens produzidos dentro do território nacional, não podendo deixar de incidir nas operações realizadas sobre produtos estrangeiros, sob pena de homenagear o produto estrangeiro em detrimento daquele produzido em território nacional.


Ademais, suscitaram os integrantes do pretório que o valor despendido com o produto importado surge como próprio à tributação, sem distinção dos elementos que, porventura, o tenham norteado. Sustentaram, por fim, que a não-cumulatividade não estaria ofendida nos casos onde há tão somente um elo na cadeia produtiva (incidência isolada), na medida em que tal princípio não visa combater a incidência do tributo propriamente dita, mas tão somente sua cobrança em cascata, inexistente em operações onde há incidência única.


Note-se, contudo, que a tese firmada naquela oportunidade pode ser questionada em relação às demais operações realizadas por não contribuintes, na medida em que se aplicam exclusivamente às importações de veículos automotores por pessoas físicas.


Isso porque durante o julgamento do acórdão paradigma, os ministros se manifestaram pela limitação do conteúdo a casos idênticos àqueles analisados no julgamento, adotando tese minimalista, receosos dos efeitos decorrentes da aplicação ampla da nova tese a todas as operações de importação.


Importa trazer à baila, para melhor compreensão do tema, alguns fragmentos do diálogo entre os julgadores, especificamente no que se refere à limitação do alcance dos efeitos da tese em julgamento, especialmente no que toca ao desenvolvimento do atendimento médico no país.



"O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (PRESIDENTE) - E aí, ministro Marco Aurélio, quando o ministro Fux estava se pronunciando, eu me lembrei - e também estou extremamente preocupado - da questão dos equipamentos médicos. Mas, na área acadêmica também, há equipamentos importantíssimos para laboratórios físicos, químicos, para equipamentos de astronomia, etc. Realmente, se nós generalizarmos a tese, nós podemos prejudicar setores de ponta que dependem de equipamentos não fabricados no Brasil e que podem inviabilizar, inclusive, a pesquisa científica, ou dificultar sobremaneira.(...)O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO - por isso, eu quase fiz a exceção para os equipamentos médicos, mas achei que era um avanço de sinal pelo Judiciário, porque, na verdade, nós estamos estabelecendo uma tese. Qual é a tese? Paga-se IPI na importação por não contribuinte, essa é a nossa tese.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) – Não, não, quanto a veículo. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - É, quanto a veículo.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Quanto a veículos.(...)O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Eu não proponho a adição, eu proponho uma postura afirmativa: Incide IPI na importação de veículo automotor por não contribuinte, por pessoa física. O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (PRESIDENTE) - E minimalista.(...)O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - O Rio de Janeiro, agora, importou um equipamento de tomografia cerebral, inaugurou um hospital, digamos assim, singular em termos de América Latina, que é capitaneado pelo professor Paulo Niemeyer Filho; esse equipamento foi uma fábula em milhões de dólares.
O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO - É, se for do SUS, tem um tratamento diferenciado. O problema dos equipamentos médicos é para as clínicas privadas; os hospitais universitários e as entidades filantrópicas em geral, portanto, quem trabalha para o SUS, não enfrenta esse problema. Eu também me interessei por isso. Mas, olha, embora eu ache que a tese jurídica seja correta e valha para todas as hipóteses, eu me sensibilizo com uma tese mais restrita, se esse for o entendimento. Eu acho difícil de sustentá-lo dogmaticamente, mas acho moralmente defensável. Então, está bem!
O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Senhor Presidente, dou provimento no sentido de que há incidência de IPI na importação de veículo automotor.
O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Neste sentido. Mas adstringindo a essa tese.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (PRESIDENTE) - Mas fica com a tese minimalista, que nós só estamos examinando o caso de importação de veículos. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) – É a tese do Relator."


Seguindo esta orientação, o tribunal delimitou o alcance da decisão e publicou a tese nos seguintes termos:


"Decisão (...)o Tribunal fixou a seguinte tese: 'Incide o imposto de produtos industrializados na importação de veículo automotor por pessoa natural, ainda que não desempenhe atividade empresarial e o faça para uso próprio'"


Mais forte se torna a tese em questão nos casos em que o bem importado não encontre similar fabricado dentro do território nacional, hipótese em que se afasta o argumento acolhido pela maioria dos ministros no julgamento do em análise, no sentido de que a não incidência afronta o princípio da livre concorrência e à isonomia.


Ainda que não se pretenda encerrar os debates acerca da matéria, faz-se o convite à reflexão, em atenção ao cuidado do plenário em delimitar a tese de repercussão geral, que enseja, através do questionamento judicial, a possibilidade de ver reconhecida a não incidência do IPI na importação de bens por não contribuintes, ressalvada a operação realizada para importação de veículos para uso próprio, expressamente consignada naquela oportunidade.


A janela de discussão que se abre deve ser observada pelo contribuinte, que tem presenciado um cenário em que a União Federal compensa a má gestão, a corrupção, e a interpretação equivocada da legislação - esta última reconhecida no recente julgamento que definiu o afastamento do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins10 - em aumento de carga tributária suportada pelo cidadão que tenta, bravamente, sobreviver ao verdadeiro caos tributário vivido em nosso país.


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1 STF. RE 723.651/PR. Rep. Geral Rec. Rel. Min. Marco Aurélio. Pub. 05.08.2016

2 TRF 4. 1ª Seção, EINF 5002923-29.2010.404.7205. Rel. Vânia Hack de Almeida. Pub. Fev/2013

3 Constituição Federal de 1988. Art. 153 § 3º O imposto previsto no inciso IV: I - será seletivo, em função da essencialidade do produto; II - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores; III - não incidirá sobre produtos industrializados destinados ao exterior. IV - terá reduzido seu impacto sobre a aquisição de bens de capital pelo contribuinte do imposto, na forma da lei.
4 Nesse sentido, são diversos os precedentes das cortes superiores. Destacamos: RE 550170 AgR, RE 550170 AgR, RE 255090 AgR, RE 501773 AgR, RE 615.595, RE 627.844 e RE 643.525 e, inclusive, um julgamento do STJ sob rito dos recursos repetitivos (REsp 1396488/SC)

5 CTN: "Art. 49. O imposto é não-cumulativo, dispondo a lei de forma que o montante devido resulte da diferença a maior, em determinado período, entre o imposto referente aos produtos saídos do estabelecimento e o pago relativamente aos produtos nele entrados. Parágrafo único. O saldo verificado, em determinado período, em favor do contribuinte transfere-se para o período ou períodos seguintes"

6 CTN. "Art. 51 Contribuinte do imposto é: I - o importador ou quem a lei a ele equiparar;

7 PAULSEN. Leandro. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 9ª Ed. rev e atual. Editora dos Advogados. Porto Alegre: 2015. p.119: "O critério da não cumulatividade é de aplicação obrigatória, inclusive na importação. Desse modo, o importador que paga IPI sobre a entrada de produto industrializado, quando sujeito ao pagamento do IPI em futuras operações internas por ser industrial, equiparado ou comerciante de produtos sujeitos ao imposto que os forneça a industrial ou equiparado (art. 51, II e III do CTN) pode creditar-se do respectivo valor para desconto posterior quando do pagamento de IPI na saída de seus produtos no mercado interno

8 STF. RE 255.682/RSAgR, Segunda Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 10.02.06. "Para viabilizar a cobrança do ICMS, em caso tal, foi promulgada a EC 33, de 12.12.2001, que alterou a redação da alínea 'a' do inciso IX, do art. 155 da CF. Com relação ao IPI, entretanto, não há disposição igual. O que há, simplesmente, é o dispositivo constitucional que estabelece o princípio da não cumulatividade, de obediência obrigatória, evidentemente, pelo legislador ordinário (CF ., art. 153, IV, §3º, II)"

9 STF. AG. REsp 643.525. 1ª turma. Rel. Min Dias Toffoli. Pub. 26.02.2013

10 STF. RE 574.706. Rel. Min Carmen Lucia. Pub.20.03.2017


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*Tadeu Puretz é advogado do escritório Salusse Marangoni Advogados.


http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI257201,101048-IPI+importacao+novas+perspectivas