LEGISLAÇÃO

quarta-feira, 21 de março de 2012



Banco Central aumenta lista de operações suspeitas

Depósitos em notas úmidas, malcheirosas ou mofadas deverão ser obrigatoriamente comunicados ao Banco Central como operações suspeitas, tal qual pagamentos a pessoas no exterior que não estejam diretamente vinculados a importação ou exportação. As ordens vêm do Banco Central, que mais que duplicou (de 43 para 106) a lista das chamadas “movimentações atípicas”.
O aumento do número de ações consideradas suspeitas se deu no último dia 12 de março, por meio de uma carta-circular (3.542/12). As situações passam a ser obrigatoriamente comunicadas ao BC que, por sua vez, poderá encaminhar relatórios ao Ministério Público ou à Polícia Federal, responsáveis por abrir investigação.
As investigações criminais, porém, muitas vezes são feitas sem fundamento, afirma o criminalista Jair Jaloreto. Segundo ele, muitas das situações listadas são subjetivas ou acabam “extrapolando” o universo da lavagem de dinheiro. “Com o aumento do rol de atividades suspeitas, empresas pequenas e pessoas físicas vão acabar se tornando suspeitas de lavagem de dinheiro”, diz.
Segundo ele, mesmo com a intenção declarada de coibir a lavagem de dinheiro, que é essencial ao tráfico de armas e de drogas, o mecanismo poderá tratar como suspeitas pessoas e empresas sem relação com crimes financeiros, mas que deixaram de observar uma dessas novas normas, que não foram divulgadas.
A subjetividade dos novos critérios também preocupa o criminalista Edward Rocha de Carvalho do escritório J. N. Miranda Coutinho & Advogados. Segundo ele, o aumento das movimentações atípicas classificadas pelo BC mostra a adoção da “presunção da ilegalidade em todo e qualquer ato, um controle total do Estado na vida do cidadão.”
Entre os critérios que podem ser apontados como subjetivos está a “alteração inusitada nos padrões de vida e de comportamento do empregado ou do representante [de instituições financeiras], sem causa aparente”.
Segundo Carvalho, os critérios pouco palpáveis fazem com que processos criminais possam ser usados como instrumentos de perseguição a cidadãos e empresas. “Em vez de ter um fato determinado para investigar, comunicam uma operação atípica, instauram um inquérito policial, quebram sigilos e deixam o cidadão à mercê do Estado.”
O procurador-geral do Banco Central, Isaac Sidney Menezes Ferreira, concorda que o BC vai passar a ter maior acesso a informações protegidas pelo sigilo, uma vez que esmiuçou uma série de operações consideradas suspeitas. Para ele, porém, isso não configura um aumento da quebra de sigilo, porque nenhum sigilo pode ser posto ao BC desde 2001, quando foi sancionada a Lei Complementar 105, que dispos sobre sigilo das operações de instituições financeiras.
Ferreira explica que a nova listagem foi motivada por estudos técnicos, experiências no próprio mercado financeiro brasileiro e recomendações internacionais para o combate à lavagem de dinheiro. Ele afirma, porém, que isso não significa que pessoas sem ligação com o crime terão problemas com o Banco Central. “As operações são classificadas como suspeitas para serem acompanhadas e tratadas”, explica.
Agências no exterior
Além da Carta-Circular 3.542, a diretoria do BC também aprovou no dia 12 de março as de número 3.583 e 3.584. A primeira determina que instituições financeiras não devem iniciar qualquer relação de negócio com clientes, ou dar prosseguimento a relação já existente, se não for possível identificá-lo plenamente. As normas, segundo o documento, devem ser estendidas à agências subsidiárias no exterior.
Apesar de o BC não ter poder para determinar como funciona uma agência em outro país — que deve obedecer às leis da nação em que está —, a instituição determinou que as instituições informem sobre os locais em que as normas não possam ser cumpridas. “Assim, quando o cliente preferir colocar o dinheiro lá fora em vez de no Brasil, ele entrará no nosso ‘radar’”, diz Ferreira.
Já a 3.584 afirma que as instituições financeiras brasileiras autorizadas a operar no mercado de câmbio no Brasil com instituições financeiras do exterior devem se certificar de que a sua contraparte no exterior tenha presença física no país onde está constituída, evitando o uso de empresa fantasma.
Marcos de Vasconcellos é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 20 de março de 2012

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