LEGISLAÇÃO

terça-feira, 3 de maio de 2011

TRIBUTOS - 03/05/2011

Reforma tributária volta à pauta
Está de novo em debate a reforma tributária, um dos itens mais importantes da pauta de modernização econômica do Brasil. Ao reabrir a discussão, o governo da presidente Dilma Rousseff passa a enfrentar abertamente um de seus desafios mais difíceis.
O Brasil tem um dos piores sistemas de impostos e contribuições do mundo - com certeza, o pior em vigor nos países com elevado grau de industrialização. Grandes mudanças na economia brasileira ocorreram nos últimos 20 anos, desde os primeiros passos da abertura de mercados e da privatização e revitalização de velhos mastodontes empresariais. A hiperinflação foi vencida e novos pilares foram edificados para a política econômica. Mas a renovação tributária nunca saiu do belo mundo das boas intenções.
A discussão foi reiniciada pelo secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, em depoimento perante a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE). A audiência foi programada, inicialmente, para o exame de um projeto de alteração do ICMS. O projeto, apresentado pelo senador Romero Jucá, foi concebido como solução para um novo tipo de guerra fiscal.
Alguns governos estaduais concedem vantagens tributárias para a importação de bens industriais, favorecendo produtores estrangeiros e pondo em xeque numerosas empresas nacionais instaladas em outros Estados. O senador propôs reduzir de 12% para zero a alíquota das transações interestaduais com esses produtos importados. O secretário sugeriu uma diminuição gradual para 2%. Em qualquer caso, a mudança reduzirá o interesse do Estado importador em manter esse tipo de guerra.
A tarefa mais urgente é a eliminação dessa política predatória, altamente prejudicial a importantes setores da indústria brasileira. Mas o secretário executivo do Ministério da Fazenda aproveitou a ocasião para enumerar tópicos de reforma tributária em estudo no Executivo. A ideia, segundo Barbosa, é promover uma reforma fatiada, isto é, por meio de projetos com tramitação separada. Seria um processo mais viável - esta é a suposição - do que o envio de um projeto grande, complexo e sujeito a numerosos entraves políticos.
O secretário indicou quatro eixos de mudança. O primeiro é o da unificação e simplificação do principal tributo estadual, o ICMS. A tributação das operações interestaduais seria alterada e a cobrança migraria progressivamente da origem para o destino. O segundo eixo é a redução do peso do PIS/Cofins, de competência federal. A ideia é tornar mais veloz a devolução dos créditos fiscais, para estimular a produção e o investimento. O terceiro é o da reforma do Supersimples, com adoção de novos critérios de enquadramento de microempresas. A inovação deverá, segundos se calcula, resultar no aumento do número de empresas exportadoras. O quarto eixo corresponde à redução do custo do pessoal, com desoneração da folha de pagamento ou mudança da base de tributação. O custo da mão de obra é um importante fator de competitividade e um limitador do emprego. A relevância desse fator aumentou nas últimas duas décadas, com a crescente participação de economias da Ásia no comércio internacional.
Todos os pontos mencionados pelo secretário são relevantes. Mas será preciso mexer mais no ICMS para remover alguns dos maiores entraves à competitividade. Esse tributo onera o investimento e a operação das indústrias. Os créditos vinculados à compra de equipamentos ficam presos durante anos. Créditos de exportação também são difíceis de receber.
A Lei Kandir, em vigor a partir de setembro de 1996, deveria atenuar provisoriamente alguns desses problemas, perdendo efeito quando o sistema fosse reformado. Mas a reforma continua emperrada e a própria Lei Kandir nunca vigorou plenamente. A vigência de alguns de seus dispositivos - como a desoneração fiscal dos gastos com bens de consumo, energia e telefonia - foi adiada várias vezes. Esse dispositivo está suspenso até 2020. Sem uma firme negociação com os governos estaduais, qualquer reforma será muito limitada.
O Estado de São Paulo



Contribuinte pode se recusar a entregar extrato

Por Raul Haidar
A fiscalização tributária vem se tornando cada vez mais audaciosa na arte de desrespeitar os direitos do contribuinte, quer estes sejam pessoas físicas ou jurídicas.
Não satisfeitos em ignorar propositadamente os limites legais de sua atuação, agentes fiscais chegam ao absurdo de exigir o cumprimento de normas inexistentes, inverter o ônus da prova e até mesmo amparar suas pretensões em textos interpretados de forma totalmente distorcida.
Em determinada ocasião um contribuinte recebeu intimação assinada por um auditor fiscal da Receita Federal, onde se exigia apresentação de extratos bancários e que se comprovasse a origem dos recursos depositados ou creditados nas contas bancárias.
Na intimação, o Fisco alegava que sua pretensão estaria fundamentada nos artigos 841, 844, 904, 911, 927 e 928 do vigente Regulamento do Imposto de Renda (Decreto 3.000/99).
Todavia, o contribuinte não está obrigado legalmente ao atendimento da intimação.
Os extratos bancários não são documentos no sentido legal do termo. Não há lei que obrigue o contribuinte a conservá-los. Aliás, desses papéis invariavelmente consta a expressão “extrato para simples conferência”, o que por si só revela que se trata de um papel que não cria obrigações nem gera direitos. Tanto assim, que se alguém tiver um lançamento em seu extrato feito de forma equivocada, isso não o transforma em credor ou devedor da quantia lançada. Enganos em extratos são muito comuns, por isso que nas empresas é comum realizar-se diariamente uma conciliação das contas bancárias. As pessoas jurídicas não fazem contabilidade com base em extratos, mas tão somente através de documentos, sejam cópias de cheques, comprovantes de depósitos, avisos de lançamento, etc.
A vasta indicação de artigos do regulamento com os quais o fisco procura amparar sua atuação já demonstra, por si só, a fragilidade da forma de fiscalização. São seis artigos (841, 844, 904, 911, 927 e 928), mas nenhum deles menciona a palavra extrato.
O artigo 841 diz que pode o Fisco fazer o lançamento de ofício quando o contribuinte não apresentar declaração de rendimentos, deixar de atender ao pedido de esclarecimentos que lhe for dirigido, recusar-se a prestá-los ou não os prestar satisfatoriamente, fizer declaração inexata, não pagar o imposto corretamente, ou omitir receitas.
O artigo 844 trata do lançamento e fala em prestar esclarecimentos, não em fornecer documentos, menos ainda em relação a extratos bancários.
O artigo 904 cuida apenas da competência funcional dos servidores fazendários, em nenhum momento instituindo qualquer obrigação para o contribuinte apresentar documentos ou prestar informações.
O artigo 911 trata do objeto do trabalho fiscal, definindo quais os exames que os auditores podem fazer. Não traz nenhuma norma relacionada com a obrigatoriedade de exibição de extratos.
O artigo 927 diz que as pessoas físicas ou jurídicas, contribuintes ou não, são obrigadas a prestar as informações e os esclarecimentos exigidos pelos auditores-fiscais do Tesouro Nacional.
Prestar informações não significa entregar extratos. Dar esclarecimentos não é o mesmo que “...comprovar, mediante apresentação de documentação hábil e idônea, a origem dos recursos...” . Assim, claro está que o texto regulamentar não é o fundamento exato e preciso que possa transferir para o contribuinte uma obrigação de entregar extratos ou mesmo de “...comprovar, mediante apresentação de documentação hábil e idônea, a origem dos recursos...” o que, obviamente, não se pode confundir com “prestar esclarecimentos”...
Finalmente, o artigo 928 é muito claro ao determinar que a pessoa física ou jurídica, contribuinte ou não, deverá “fornecer, nos prazos marcados, as informações ou esclarecimentos solicitados”. Como já se demonstrou, essa obrigação não se confunde com outra, de entregar extratos bancários ou comprovar origem de supostos depósitos.
A Constituição Federal ordena, no inciso 5º , inciso II , “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.” O princípio da legalidade absoluta é cláusula pétrea da Carta Magna e de observância obrigatória pela administração pública, como expressamente determina ainda o artigo 37 . Não existe, pois, a obrigação de entregar extratos bancários, porque nenhuma lei expressamente o ordena.
O exame atento das normas regulamentares resulta em inexistência de qualquer obrigação para que o requerente forneça extratos bancários, os quais não são sequer de conservação obrigatória. O artigo 911 trata de “documentos de contabilidade”, o que, como é óbvio, não inclui os extratos.
O contribuinte não é obrigado a guardar extratos e pode após sua conferência destruí-los. Não está obrigado, ainda, a produzir prova negativa ou mesmo comprovação de origem de movimentação financeira. Cabe exclusivamente ao Fisco promover as diligências e investigações a seu cargo, nos estritos termos da lei.
Na obra coletiva “O Princípio da Moralidade no Direito Tributário” (Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1998, 2ª edição, pág. 21) ensina o eminente professor Ives Gandra da Silva Martins:
“A defesa do Erário não pode ser ilegal, nem a fiscalização arbitrária”.
Ora, ao exigir do contribuinte a exibição de extratos, sem que a lei expressamente o permita, e ainda pretender que o contribuinte comprove origem de recursos que são confundidos com suposta movimentação financeira , o Fisco viola a norma de conduta que lhe é obrigatória por força do Decreto federal 1.171/1994 que, ao fixar Código de Ética para os servidores públicos federais, determina :
“II – O servidor público não poderá jamais desprezar o elemento ético de sua conduta...”
“IX – A cortesia, a boa vontade, o cuidado e o tempo dedicados ao serviço público caracterizam o esforço pela disciplina. Tratar mal uma pessoa que paga seus tributos direta ou indiretamente significa causar-lhe dano moral...”
Se a lei determina que o Fisco deve comparecer ao domicílio do contribuinte para examinar seus livros e documentos e o agente fazendário transfere para o contribuinte um ônus de prova que a lei não lhe atribui, o elemento ético está violado.
O contribuinte não está obrigado a produzir as provas que interessam ao Fisco, nem se obriga a fazer o que a lei não ordena. Os cidadãos não estão subordinados aos funcionários públicos, senão dentro dos estreitos limites da legalidade absoluta. O relacionamento entre ambos foi bem definido pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, o ministro Edson Vidigal em conhecida manifestação:
"Quem serve ao Estado serve ao público em geral. Ninguém dentre nós, no serviço público, é inimigo de ninguém. Bastam os inimigos do Povo, só por isso, também, nossos inimigos. Contra eles é que devemos estar fortes em nossa união. O Padre Antonio Vieira dizia que os sacerdotes são empregados de Deus. Assim, da mesma forma, o dinheiro que paga o salário do Presidente da República e dos seus Ministros, dos Deputados e dos Senadores, dos Ministros dos Tribunais é o mesmo que paga o salário de todos os outros servidores, do porteiro ao assessor mais graduado, do cabo ao general. Esse dinheiro vem de um único patrão para o qual trabalhamos, do qual somos empregados. Esse patrão é o contribuinte que paga impostos. Somos empregados do Povo brasileiro." (in www. serpro. gov. notícias, 13.04.2004)
Hugo de Brito Machado em sua obra “Mandado de Segurança em Matéria Tributária” (Editora Dialética, São Paulo, 2003) em cuja página 272 dá-nos preciosa lição:
“O desconhecimento da teoria da prova, ou a ideologia autoritária, tem levado alguns a afirmarem que no processo administrativo fiscal o ônus da prova é do contribuinte. Isso não é, nem poderia ser correto em um estado de Direito democrático. O ônus da prova no processo administrativo fiscal é regulado pelos princípios fundamentais da teoria da prova, expressos, aliás, pelo Código de Processo Civil, cujas normas são aplicáveis ao processo administrativo fiscal.

No processo administrativo fiscal para apuração e exigência do crédito tributário, ou procedimento administrativo de lançamento tributário, autor é o Fisco. A ele, portanto, incumbe o ônus de provar a ocorrência do fato gerador.”
Mesmo nas relações Fisco-contribuinte o direito ao silêncio é assegurado. Veja-se a seguinte decisão do STF:
“O privilégio contra a auto-incriminação – que é plenamente invocável perante as Comissões Parlamentares de Inquérito – traduz direito público subjetivo assegurado a qualquer pessoa, que, na condição de testemunha, de indiciado ou de réu, deva prestar depoimento perante órgãos do Poder Legislativo, do Poder Executivo ou do Poder Judiciário. O exercício do direito de permanecer em silêncio não autoriza os órgãos estatais a dispensarem qualquer tratamento que implique restrição à esfera jurídica daquele que regularmente invocou essa prerrogativa fundamental. Precedentes. O direito ao silêncio – enquanto poder jurídico reconhecido a qualquer pessoa relativamente a perguntas cujas respostas possam incriminá-la (nemo tenetur se detegere) – impede, quando concretamente exercido, que aquele que o invocou venha, por tal específica razão, a ser preso, ou ameaçado de prisão, pelos agentes ou pelas autoridades do Estado” (STF, HC n. 79.812, rel. Min. Celso de Mello, DJU de 16.2.2001,)

Não cabe ao contribuinte provar que não sonegou. Cabe apenas ao Fisco a produção dessa prova e não pode o sujeito passivo ser coagido a produzir prova contra si mesmo.

Assim, qualquer contribuinte ( pessoa física ou jurídica) pode recusar-se a entregar extratos bancários (que ainda os possuir) ao Fisco.
Conjur

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