LEGISLAÇÃO

terça-feira, 3 de maio de 2011

EXPORTAÇÃO

Sem isenção dos EUA, Rio Grande do Sul perde receitas

Patrícia Comunello
Os exportadores gaúchos precisam se benzer. Além de ter de fazer contorcionismo para lidar com a desvalorização cambial, as empresas agora calculam o custo de perder as vantagens tributárias da não renovação do Sistema Geral de Preferências (SGP) pelos Estados Unidos (EUA). O sistema expirou em dezembro e até agora o Congresso do país não decidiu sobre a continuidade. Sem os benefícios de redução ou tarifa zero na importação para segmentos de manufaturados, a disputa com adversários como chineses e europeus já está mais difícil. Para piorar as condições de competição externa das empresas, a União Europeia (UE) já deu sinais de que pretende alterar sua plataforma de preferências, que vence neste mês.
Estudo da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) estima que a retirada das isenções prejudique 25,31% da receita gerada em vendas ao país. O dano local é muito superior aos 10,9% dos negócios brasileiros que são beneficiados pela SGP americana. Segundo a federação, pelo menos US$ 302,2 milhões dos US$ 1,2 bilhão das divisas obtidas em 2010 com os EUA se enquadraram nas regras de redução tarifária. A conta foi obtida ao analisar os 50 maiores exportadores, que ultrapassaram US$ 1 bilhão em 2010. No elenco dos maiores favorecidos, estão armas, veículos, tratores, couro, plásticos, joias e ferramentas e cutelaria.
O coordenador do Conselho de Relações Internacionais e Comércio Exterior da entidade, Cezar Muller, diz que as empresas economizaram US$ 8,4 milhões em tributos. "Os americanos sempre fazem pressão interna para não renovar seu SGP, mas nunca havíamos ficado sem os benefícios", ressalta o dirigente. A Fiergs integra o grupo de entidades nacionais que atua diretamente no Congresso dos Estados Unidos com lobby para assegurar a preferência. "Até os clientes têm interesse e fazem pressão, mas desta vez está mais difícil", admite. A preocupação é com maiores perdas diante do tamanho do ganho com o sistema. Os EUA foram o terceiro principal destino das exportações do Estado em 2010. Já o bloco europeu somou US$ 3,08 bilhões.
O diretor de Relações Governamentais da Câmara Americana de Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham), entidade que integra a interlocução com os parlamentares americanos, Eduardo Fonseca, indica que o maior adversário da renovação é a conjuntura econômica do parceiro. "O Departamento de Comércio dos EUA é favorável ao sistema, mas o nosso maior problema é a agenda interna. Hoje não há espaço para colocar o assunto na pauta de votação", explica o diretor da Amcham. "O SGP não é prioridade", resume Fonseca, que adverte para necessidade de maior pressão e mobilização das entidades brasileiras.
O diretor das Peles Pampa, que exporta 90% da produção, Leogenio Luiz Alban, já registra disputa mais acirrada com italianos, por exemplo. Os EUA compraram 25% das peles da fábrica em Portão, no Vale do Sinos. O impacto da perda do benefício começou a ser sentido em março, com os novos pedidos. "Estamos tendo de renegociar com os importadores e absorver o peso das novas tarifas", informa Alban, que estava acostumado com imposto zero em alguns itens. "É mais uma dificuldade para quem vende mercadoria com valor agregado como nós", lamenta o diretor do curtume, que teve receita de US$ 80 milhões com exportações no ano passado.
O presidente-executivo da Associação das Indústrias de Curtume do Rio Grande do Sul (AICSul), Moacir Berger, espera um duro golpe sem o tratamento especial. O mercado europeu é o maior cliente dos curtumes gaúchos e os EUA ficam com quase 30% das vendas. Metade das 40 milhões de peles industrializadas em 2010 foram para o exterior. "Uma redução de três pontos percentuais já afeta bastante".
Crise econômica faz com que nações endureçam regras

A crise econômica desponta como razão para o comportamento das nações mais ricas. Uma alegação que surgiu nas últimas semanas é que o crescimento da economia do Brasil, que saiu quase ilesa das turbulências de 2008 e 2009, justificaria retirada de benefícios. "O SGP é coisa do passado e problema menor. Hoje há uma guerra maior, que é a das moedas", alerta Antonio Carlos Fraquelli, economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE). Para Fraquelli, a convivência com o mercado global implica ônus, como a perda de vantagens, e vê como maiores problemas a agenda interna, com a volta da inflação, indefinição da reforma tributária e juros elevados. Os exportadores gaúchos, adverte o especialista da FEE, devem agregar ainda restrições da Argentina e concorrência da China. "Das economias estaduais, a gaúcha é a mais aberta e está mais sujeita a prejuízo", confronta.
Os SGPs são herança dos anos de 1960 e constituíram ajuda das economias desenvolvidas para as mais pobres. No caso americano, também pesa a pressão de setores internos sobre o Senado, que deve votar a renovação. Trata-se de interesses de segmentos produtivos que são afetados pela entrada de importados, não necessariamente produtos brasileiros. Qualquer mudança, mesmo na vigência, não poder ser feita contra uma economia específica, conduta que pode gerar contestação na Organização Mundial do Comércio (OMC).
O diretor do Departamento Econômico do Ministério das Relações Exteriores, Paulo Estivallet de Mesquita, ressalta que o governo brasileiro já reiterou até ao presidente Barack Obama, em sua visita ao País em março, a importância da renovação das condições tarifárias. Mesquita aponta que há interesse na manutenção das regras e que as dificuldades se repetiram seis a sete vezes nos últimos 15 anos. O diplomata esclarece que a renovação, caso ocorra, será retroativa. "Não há muito o que fazer. Mesmo o governo americano que quer não consegue." O diretor do ministério concorda que os países desenvolvidos atuam para defender os seus mercados.
No passado, lembra o diplomata, era mais fácil dar os benefícios. Em relação à UE, Mesquita diz que o Brasil "está atento aos sinais e indicações de que a região pode restringir o acesso brasileiro ao SGP". "O Brasil só poderá se manifestar quando houver algo concreto. Não houve comunicado oficial."
Especialistas advertem para busca de maior competitividade

A coordenadora do Centro de Comércio Exterior da Fundação Getulio Vargas (FGV), Lia Valls Pereira, aponta outro face da moeda do Sistema Geral de Preferências (SGP). Para a especialista, as dificuldades instauradas com a não renovação do sistema norte-americano poderiam ser amenizadas se as empresas brasileiras tivessem aproveitado o tratamento diferenciado em vigor há mais de quatro décadas para elevar a competitividade. Ela concorda que há custos internos que estão fora do controle dos empresários, como a precária infraestrutura e a alta tributação, mas ressalta que o modelo de tratamento especial se justificava no passado. Lia considera natural que o crescimento brasileiro gere mudanças na visão dos parceiros, que passam a cogitar a retirada de taxação menor ou zero.
Mas, seguindo outros analistas, a economista detecta na conjuntura interna de prolongamento da crise nos Estados Unidos, com o agravante do alto déficit interno, e no bloco europeu como razão plausível para um reexame das regras. "Num momento como esse, aumenta o protecionismo", adverte Lia, lembrando que o SGP é voluntário e foi instaurado nos anos de 1960 pelas economias ricas para alavancar as nações subdesenvolvidas. Para Lia, a saída pode ser negociar acordos específicos, que incluem a tratativas entre Mercosul e UE. "Mesmo que haja corte de vantagens, a diferença tarifária não é muito alta na maior parte dos produtos." Estabelecer parâmetros diferentes para excluir alguns países do SGP europeu não é novidade. Já há limitações para a China, devido aos grandes volumes de exportações para a região, e para outros asiáticos, como Coreia do Sul e Cingapura.
Rogério César Souza, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), espera perda de espaço na disputa mundial por venda de produtos. Hoje a fatia brasileira é acanhada, ficando em 1,2% em 2009, e que pode subir a 1,35% em 2010 (os números não foram divulgados), sob efeito do bom momento de preços das commodities. "A situação se agravará, já que há o fator cambial pesando cada vez mais", justifica Souza. O economista-chefe do Iedi aponta que a saída será os exportadores investirem em inovação. "Para ter maior produtividade, será preciso aumentar a qualidade."
Para Honório Kume, coordenador de comércio exterior da diretoria de Estudos Internacionais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as posturas americana e da UE podem mirar ganhos em outras áreas de negociação, como na Rodada de Doha. "Eles querem obter maior abertura em demandas que são pautadas nestas negociações", sugere Kume, que mostrou em estudo de 2006 que o Brasil era o quarto país no mundo a se beneficiar do SGP dos EUA. O coordenador do Ipea vislumbra ainda que o quadro atual de revisão das vantagens é prenúncio de que em seis a oito anos esse tipo de concessão deve ser extinto para países como o Brasil.
Empresas mostram reações diferenciadas ao risco de perdas

A retirada das vantagens tarifárias provoca reações e impactos diferenciados no Estado. De um lado novatas no mercado mundial, como a Solarium Revestimentos, com sede em Porto Alegre, e de outro a gigante Randon, com sua subsidiária Fras-le. A presidente da indústria de pisos, com quatro fábricas no País, sendo uma em Porto Alegre, Ana Cristina de Souza Gomes, lamenta a medida dos EUA, onde a empresa briga por espaço desde 2004. Já Daniel Randon, diretor de relações com investidores da Fras-le, tem uma carta na manga caso a União Europeia (UE) mexa em seu Sistema Geral de Preferências (SGP).
Randon espera ainda ganhar tempo para compor o novo fluxo de remessa de mercadorias, pois as alterações nas regras europeias só entram em vigor após um prazo de adaptação, prática que deve adiar para 2012 a eventual nova realidade. A base chinesa de produção, inaugurada em 2009 e responsável por apenas 5% de tudo que é internacionalizado pela marca, será a plataforma para contornar o maior custo tarifário. "Vamos complementar pela China. A estratégia de sermos um fornecedor global ajuda muito numa hora dessas", salienta. No mercado americano, a indústria já tem tarifa zero de importação devido a outros programas. Hoje 15% a 20% da receita líquida da Fras-le no exterior é obtida nos Estados Unidos, com 90% dos produtos oriundos de plantas brasileiras.
A direção da Solarium, que tenta com grande custo administrar o impacto da valorização cambial nas tabelas de preços, aposta na qualidade e em diferenciais dos produtos. Ana Cristina explica que a empresa foca regiões que valorizam o perfil dos revestimentos da categoria de atérmicos, ideal para climas quentes. A marca tem showroom em Miami e se prepara para chegar à Califórnia. "Atuamos muito com arquitetos. No entanto, hoje há muita cotação, mas pouca venda", descreve a presidente da Solarium. A empresa tem vendas esporádicas, que só não decolam mais devido aos custos. "Nosso produto chega a dobrar de valor frente ao dos chineses, mas acreditamos nos diferenciais", contrasta a executiva. "Os clientes ficam loucos pelo piso, pois não há similar. Mas na hora do preço é o problema." A esperança da empresária é o reaquecimento da construção civil americana, que já está ocorrendo. Com produção de 150 mil e 200 mil metros quadrados anuais de pisos, as fábricas na Capital gaúcha, em São Paulo, em Recife e em Brasília estão prontas para receber pedidos. Neste ano a meta é crescer 17%.
Sem isenção dos EUA, Rio Grande do Sul perde receitas




Patrícia Comunello



Os exportadores gaúchos precisam se benzer. Além de ter de fazer contorcionismo para lidar com a desvalorização cambial, as empresas agora calculam o custo de perder as vantagens tributárias da não renovação do Sistema Geral de Preferências (SGP) pelos Estados Unidos (EUA). O sistema expirou em dezembro e até agora o Congresso do país não decidiu sobre a continuidade. Sem os benefícios de redução ou tarifa zero na importação para segmentos de manufaturados, a disputa com adversários como chineses e europeus já está mais difícil. Para piorar as condições de competição externa das empresas, a União Europeia (UE) já deu sinais de que pretende alterar sua plataforma de preferências, que vence neste mês.





Estudo da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) estima que a retirada das isenções prejudique 25,31% da receita gerada em vendas ao país. O dano local é muito superior aos 10,9% dos negócios brasileiros que são beneficiados pela SGP americana. Segundo a federação, pelo menos US$ 302,2 milhões dos US$ 1,2 bilhão das divisas obtidas em 2010 com os EUA se enquadraram nas regras de redução tarifária. A conta foi obtida ao analisar os 50 maiores exportadores, que ultrapassaram US$ 1 bilhão em 2010. No elenco dos maiores favorecidos, estão armas, veículos, tratores, couro, plásticos, joias e ferramentas e cutelaria.





O coordenador do Conselho de Relações Internacionais e Comércio Exterior da entidade, Cezar Muller, diz que as empresas economizaram US$ 8,4 milhões em tributos. "Os americanos sempre fazem pressão interna para não renovar seu SGP, mas nunca havíamos ficado sem os benefícios", ressalta o dirigente. A Fiergs integra o grupo de entidades nacionais que atua diretamente no Congresso dos Estados Unidos com lobby para assegurar a preferência. "Até os clientes têm interesse e fazem pressão, mas desta vez está mais difícil", admite. A preocupação é com maiores perdas diante do tamanho do ganho com o sistema. Os EUA foram o terceiro principal destino das exportações do Estado em 2010. Já o bloco europeu somou US$ 3,08 bilhões.



O diretor de Relações Governamentais da Câmara Americana de Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham), entidade que integra a interlocução com os parlamentares americanos, Eduardo Fonseca, indica que o maior adversário da renovação é a conjuntura econômica do parceiro. "O Departamento de Comércio dos EUA é favorável ao sistema, mas o nosso maior problema é a agenda interna. Hoje não há espaço para colocar o assunto na pauta de votação", explica o diretor da Amcham. "O SGP não é prioridade", resume Fonseca, que adverte para necessidade de maior pressão e mobilização das entidades brasileiras.



O diretor das Peles Pampa, que exporta 90% da produção, Leogenio Luiz Alban, já registra disputa mais acirrada com italianos, por exemplo. Os EUA compraram 25% das peles da fábrica em Portão, no Vale do Sinos. O impacto da perda do benefício começou a ser sentido em março, com os novos pedidos. "Estamos tendo de renegociar com os importadores e absorver o peso das novas tarifas", informa Alban, que estava acostumado com imposto zero em alguns itens. "É mais uma dificuldade para quem vende mercadoria com valor agregado como nós", lamenta o diretor do curtume, que teve receita de US$ 80 milhões com exportações no ano passado.



O presidente-executivo da Associação das Indústrias de Curtume do Rio Grande do Sul (AICSul), Moacir Berger, espera um duro golpe sem o tratamento especial. O mercado europeu é o maior cliente dos curtumes gaúchos e os EUA ficam com quase 30% das vendas. Metade das 40 milhões de peles industrializadas em 2010 foram para o exterior. "Uma redução de três pontos percentuais já afeta bastante".



Crise econômica faz com que nações endureçam regras

A crise econômica desponta como razão para o comportamento das nações mais ricas. Uma alegação que surgiu nas últimas semanas é que o crescimento da economia do Brasil, que saiu quase ilesa das turbulências de 2008 e 2009, justificaria retirada de benefícios. "O SGP é coisa do passado e problema menor. Hoje há uma guerra maior, que é a das moedas", alerta Antonio Carlos Fraquelli, economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE). Para Fraquelli, a convivência com o mercado global implica ônus, como a perda de vantagens, e vê como maiores problemas a agenda interna, com a volta da inflação, indefinição da reforma tributária e juros elevados. Os exportadores gaúchos, adverte o especialista da FEE, devem agregar ainda restrições da Argentina e concorrência da China. "Das economias estaduais, a gaúcha é a mais aberta e está mais sujeita a prejuízo", confronta.



Os SGPs são herança dos anos de 1960 e constituíram ajuda das economias desenvolvidas para as mais pobres. No caso americano, também pesa a pressão de setores internos sobre o Senado, que deve votar a renovação. Trata-se de interesses de segmentos produtivos que são afetados pela entrada de importados, não necessariamente produtos brasileiros. Qualquer mudança, mesmo na vigência, não poder ser feita contra uma economia específica, conduta que pode gerar contestação na Organização Mundial do Comércio (OMC).



O diretor do Departamento Econômico do Ministério das Relações Exteriores, Paulo Estivallet de Mesquita, ressalta que o governo brasileiro já reiterou até ao presidente Barack Obama, em sua visita ao País em março, a importância da renovação das condições tarifárias. Mesquita aponta que há interesse na manutenção das regras e que as dificuldades se repetiram seis a sete vezes nos últimos 15 anos. O diplomata esclarece que a renovação, caso ocorra, será retroativa. "Não há muito o que fazer. Mesmo o governo americano que quer não consegue." O diretor do ministério concorda que os países desenvolvidos atuam para defender os seus mercados.





No passado, lembra o diplomata, era mais fácil dar os benefícios. Em relação à UE, Mesquita diz que o Brasil "está atento aos sinais e indicações de que a região pode restringir o acesso brasileiro ao SGP". "O Brasil só poderá se manifestar quando houver algo concreto. Não houve comunicado oficial."



Especialistas advertem para busca de maior competitividade

A coordenadora do Centro de Comércio Exterior da Fundação Getulio Vargas (FGV), Lia Valls Pereira, aponta outro face da moeda do Sistema Geral de Preferências (SGP). Para a especialista, as dificuldades instauradas com a não renovação do sistema norte-americano poderiam ser amenizadas se as empresas brasileiras tivessem aproveitado o tratamento diferenciado em vigor há mais de quatro décadas para elevar a competitividade. Ela concorda que há custos internos que estão fora do controle dos empresários, como a precária infraestrutura e a alta tributação, mas ressalta que o modelo de tratamento especial se justificava no passado. Lia considera natural que o crescimento brasileiro gere mudanças na visão dos parceiros, que passam a cogitar a retirada de taxação menor ou zero.



Mas, seguindo outros analistas, a economista detecta na conjuntura interna de prolongamento da crise nos Estados Unidos, com o agravante do alto déficit interno, e no bloco europeu como razão plausível para um reexame das regras. "Num momento como esse, aumenta o protecionismo", adverte Lia, lembrando que o SGP é voluntário e foi instaurado nos anos de 1960 pelas economias ricas para alavancar as nações subdesenvolvidas. Para Lia, a saída pode ser negociar acordos específicos, que incluem a tratativas entre Mercosul e UE. "Mesmo que haja corte de vantagens, a diferença tarifária não é muito alta na maior parte dos produtos." Estabelecer parâmetros diferentes para excluir alguns países do SGP europeu não é novidade. Já há limitações para a China, devido aos grandes volumes de exportações para a região, e para outros asiáticos, como Coreia do Sul e Cingapura.



Rogério César Souza, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), espera perda de espaço na disputa mundial por venda de produtos. Hoje a fatia brasileira é acanhada, ficando em 1,2% em 2009, e que pode subir a 1,35% em 2010 (os números não foram divulgados), sob efeito do bom momento de preços das commodities. "A situação se agravará, já que há o fator cambial pesando cada vez mais", justifica Souza. O economista-chefe do Iedi aponta que a saída será os exportadores investirem em inovação. "Para ter maior produtividade, será preciso aumentar a qualidade."



Para Honório Kume, coordenador de comércio exterior da diretoria de Estudos Internacionais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as posturas americana e da UE podem mirar ganhos em outras áreas de negociação, como na Rodada de Doha. "Eles querem obter maior abertura em demandas que são pautadas nestas negociações", sugere Kume, que mostrou em estudo de 2006 que o Brasil era o quarto país no mundo a se beneficiar do SGP dos EUA. O coordenador do Ipea vislumbra ainda que o quadro atual de revisão das vantagens é prenúncio de que em seis a oito anos esse tipo de concessão deve ser extinto para países como o Brasil.



Empresas mostram reações diferenciadas ao risco de perdas

A retirada das vantagens tarifárias provoca reações e impactos diferenciados no Estado. De um lado novatas no mercado mundial, como a Solarium Revestimentos, com sede em Porto Alegre, e de outro a gigante Randon, com sua subsidiária Fras-le. A presidente da indústria de pisos, com quatro fábricas no País, sendo uma em Porto Alegre, Ana Cristina de Souza Gomes, lamenta a medida dos EUA, onde a empresa briga por espaço desde 2004. Já Daniel Randon, diretor de relações com investidores da Fras-le, tem uma carta na manga caso a União Europeia (UE) mexa em seu Sistema Geral de Preferências (SGP).



Randon espera ainda ganhar tempo para compor o novo fluxo de remessa de mercadorias, pois as alterações nas regras europeias só entram em vigor após um prazo de adaptação, prática que deve adiar para 2012 a eventual nova realidade. A base chinesa de produção, inaugurada em 2009 e responsável por apenas 5% de tudo que é internacionalizado pela marca, será a plataforma para contornar o maior custo tarifário. "Vamos complementar pela China. A estratégia de sermos um fornecedor global ajuda muito numa hora dessas", salienta. No mercado americano, a indústria já tem tarifa zero de importação devido a outros programas. Hoje 15% a 20% da receita líquida da Fras-le no exterior é obtida nos Estados Unidos, com 90% dos produtos oriundos de plantas brasileiras.



A direção da Solarium, que tenta com grande custo administrar o impacto da valorização cambial nas tabelas de preços, aposta na qualidade e em diferenciais dos produtos. Ana Cristina explica que a empresa foca regiões que valorizam o perfil dos revestimentos da categoria de atérmicos, ideal para climas quentes. A marca tem showroom em Miami e se prepara para chegar à Califórnia. "Atuamos muito com arquitetos. No entanto, hoje há muita cotação, mas pouca venda", descreve a presidente da Solarium. A empresa tem vendas esporádicas, que só não decolam mais devido aos custos. "Nosso produto chega a dobrar de valor frente ao dos chineses, mas acreditamos nos diferenciais", contrasta a executiva. "Os clientes ficam loucos pelo piso, pois não há similar. Mas na hora do preço é o problema." A esperança da empresária é o reaquecimento da construção civil americana, que já está ocorrendo. Com produção de 150 mil e 200 mil metros quadrados anuais de pisos, as fábricas na Capital gaúcha, em São Paulo, em Recife e em Brasília estão prontas para receber pedidos. Neste ano a meta é crescer 17%.
Sem isenção dos EUA, Rio Grande do Sul perde receitas




Patrícia Comunello



Os exportadores gaúchos precisam se benzer. Além de ter de fazer contorcionismo para lidar com a desvalorização cambial, as empresas agora calculam o custo de perder as vantagens tributárias da não renovação do Sistema Geral de Preferências (SGP) pelos Estados Unidos (EUA). O sistema expirou em dezembro e até agora o Congresso do país não decidiu sobre a continuidade. Sem os benefícios de redução ou tarifa zero na importação para segmentos de manufaturados, a disputa com adversários como chineses e europeus já está mais difícil. Para piorar as condições de competição externa das empresas, a União Europeia (UE) já deu sinais de que pretende alterar sua plataforma de preferências, que vence neste mês.





Estudo da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) estima que a retirada das isenções prejudique 25,31% da receita gerada em vendas ao país. O dano local é muito superior aos 10,9% dos negócios brasileiros que são beneficiados pela SGP americana. Segundo a federação, pelo menos US$ 302,2 milhões dos US$ 1,2 bilhão das divisas obtidas em 2010 com os EUA se enquadraram nas regras de redução tarifária. A conta foi obtida ao analisar os 50 maiores exportadores, que ultrapassaram US$ 1 bilhão em 2010. No elenco dos maiores favorecidos, estão armas, veículos, tratores, couro, plásticos, joias e ferramentas e cutelaria.





O coordenador do Conselho de Relações Internacionais e Comércio Exterior da entidade, Cezar Muller, diz que as empresas economizaram US$ 8,4 milhões em tributos. "Os americanos sempre fazem pressão interna para não renovar seu SGP, mas nunca havíamos ficado sem os benefícios", ressalta o dirigente. A Fiergs integra o grupo de entidades nacionais que atua diretamente no Congresso dos Estados Unidos com lobby para assegurar a preferência. "Até os clientes têm interesse e fazem pressão, mas desta vez está mais difícil", admite. A preocupação é com maiores perdas diante do tamanho do ganho com o sistema. Os EUA foram o terceiro principal destino das exportações do Estado em 2010. Já o bloco europeu somou US$ 3,08 bilhões.



O diretor de Relações Governamentais da Câmara Americana de Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham), entidade que integra a interlocução com os parlamentares americanos, Eduardo Fonseca, indica que o maior adversário da renovação é a conjuntura econômica do parceiro. "O Departamento de Comércio dos EUA é favorável ao sistema, mas o nosso maior problema é a agenda interna. Hoje não há espaço para colocar o assunto na pauta de votação", explica o diretor da Amcham. "O SGP não é prioridade", resume Fonseca, que adverte para necessidade de maior pressão e mobilização das entidades brasileiras.



O diretor das Peles Pampa, que exporta 90% da produção, Leogenio Luiz Alban, já registra disputa mais acirrada com italianos, por exemplo. Os EUA compraram 25% das peles da fábrica em Portão, no Vale do Sinos. O impacto da perda do benefício começou a ser sentido em março, com os novos pedidos. "Estamos tendo de renegociar com os importadores e absorver o peso das novas tarifas", informa Alban, que estava acostumado com imposto zero em alguns itens. "É mais uma dificuldade para quem vende mercadoria com valor agregado como nós", lamenta o diretor do curtume, que teve receita de US$ 80 milhões com exportações no ano passado.



O presidente-executivo da Associação das Indústrias de Curtume do Rio Grande do Sul (AICSul), Moacir Berger, espera um duro golpe sem o tratamento especial. O mercado europeu é o maior cliente dos curtumes gaúchos e os EUA ficam com quase 30% das vendas. Metade das 40 milhões de peles industrializadas em 2010 foram para o exterior. "Uma redução de três pontos percentuais já afeta bastante".



Crise econômica faz com que nações endureçam regras

A crise econômica desponta como razão para o comportamento das nações mais ricas. Uma alegação que surgiu nas últimas semanas é que o crescimento da economia do Brasil, que saiu quase ilesa das turbulências de 2008 e 2009, justificaria retirada de benefícios. "O SGP é coisa do passado e problema menor. Hoje há uma guerra maior, que é a das moedas", alerta Antonio Carlos Fraquelli, economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE). Para Fraquelli, a convivência com o mercado global implica ônus, como a perda de vantagens, e vê como maiores problemas a agenda interna, com a volta da inflação, indefinição da reforma tributária e juros elevados. Os exportadores gaúchos, adverte o especialista da FEE, devem agregar ainda restrições da Argentina e concorrência da China. "Das economias estaduais, a gaúcha é a mais aberta e está mais sujeita a prejuízo", confronta.



Os SGPs são herança dos anos de 1960 e constituíram ajuda das economias desenvolvidas para as mais pobres. No caso americano, também pesa a pressão de setores internos sobre o Senado, que deve votar a renovação. Trata-se de interesses de segmentos produtivos que são afetados pela entrada de importados, não necessariamente produtos brasileiros. Qualquer mudança, mesmo na vigência, não poder ser feita contra uma economia específica, conduta que pode gerar contestação na Organização Mundial do Comércio (OMC).



O diretor do Departamento Econômico do Ministério das Relações Exteriores, Paulo Estivallet de Mesquita, ressalta que o governo brasileiro já reiterou até ao presidente Barack Obama, em sua visita ao País em março, a importância da renovação das condições tarifárias. Mesquita aponta que há interesse na manutenção das regras e que as dificuldades se repetiram seis a sete vezes nos últimos 15 anos. O diplomata esclarece que a renovação, caso ocorra, será retroativa. "Não há muito o que fazer. Mesmo o governo americano que quer não consegue." O diretor do ministério concorda que os países desenvolvidos atuam para defender os seus mercados.





No passado, lembra o diplomata, era mais fácil dar os benefícios. Em relação à UE, Mesquita diz que o Brasil "está atento aos sinais e indicações de que a região pode restringir o acesso brasileiro ao SGP". "O Brasil só poderá se manifestar quando houver algo concreto. Não houve comunicado oficial."



Especialistas advertem para busca de maior competitividade

A coordenadora do Centro de Comércio Exterior da Fundação Getulio Vargas (FGV), Lia Valls Pereira, aponta outro face da moeda do Sistema Geral de Preferências (SGP). Para a especialista, as dificuldades instauradas com a não renovação do sistema norte-americano poderiam ser amenizadas se as empresas brasileiras tivessem aproveitado o tratamento diferenciado em vigor há mais de quatro décadas para elevar a competitividade. Ela concorda que há custos internos que estão fora do controle dos empresários, como a precária infraestrutura e a alta tributação, mas ressalta que o modelo de tratamento especial se justificava no passado. Lia considera natural que o crescimento brasileiro gere mudanças na visão dos parceiros, que passam a cogitar a retirada de taxação menor ou zero.



Mas, seguindo outros analistas, a economista detecta na conjuntura interna de prolongamento da crise nos Estados Unidos, com o agravante do alto déficit interno, e no bloco europeu como razão plausível para um reexame das regras. "Num momento como esse, aumenta o protecionismo", adverte Lia, lembrando que o SGP é voluntário e foi instaurado nos anos de 1960 pelas economias ricas para alavancar as nações subdesenvolvidas. Para Lia, a saída pode ser negociar acordos específicos, que incluem a tratativas entre Mercosul e UE. "Mesmo que haja corte de vantagens, a diferença tarifária não é muito alta na maior parte dos produtos." Estabelecer parâmetros diferentes para excluir alguns países do SGP europeu não é novidade. Já há limitações para a China, devido aos grandes volumes de exportações para a região, e para outros asiáticos, como Coreia do Sul e Cingapura.



Rogério César Souza, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), espera perda de espaço na disputa mundial por venda de produtos. Hoje a fatia brasileira é acanhada, ficando em 1,2% em 2009, e que pode subir a 1,35% em 2010 (os números não foram divulgados), sob efeito do bom momento de preços das commodities. "A situação se agravará, já que há o fator cambial pesando cada vez mais", justifica Souza. O economista-chefe do Iedi aponta que a saída será os exportadores investirem em inovação. "Para ter maior produtividade, será preciso aumentar a qualidade."



Para Honório Kume, coordenador de comércio exterior da diretoria de Estudos Internacionais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as posturas americana e da UE podem mirar ganhos em outras áreas de negociação, como na Rodada de Doha. "Eles querem obter maior abertura em demandas que são pautadas nestas negociações", sugere Kume, que mostrou em estudo de 2006 que o Brasil era o quarto país no mundo a se beneficiar do SGP dos EUA. O coordenador do Ipea vislumbra ainda que o quadro atual de revisão das vantagens é prenúncio de que em seis a oito anos esse tipo de concessão deve ser extinto para países como o Brasil.



Empresas mostram reações diferenciadas ao risco de perdas

A retirada das vantagens tarifárias provoca reações e impactos diferenciados no Estado. De um lado novatas no mercado mundial, como a Solarium Revestimentos, com sede em Porto Alegre, e de outro a gigante Randon, com sua subsidiária Fras-le. A presidente da indústria de pisos, com quatro fábricas no País, sendo uma em Porto Alegre, Ana Cristina de Souza Gomes, lamenta a medida dos EUA, onde a empresa briga por espaço desde 2004. Já Daniel Randon, diretor de relações com investidores da Fras-le, tem uma carta na manga caso a União Europeia (UE) mexa em seu Sistema Geral de Preferências (SGP).



Randon espera ainda ganhar tempo para compor o novo fluxo de remessa de mercadorias, pois as alterações nas regras europeias só entram em vigor após um prazo de adaptação, prática que deve adiar para 2012 a eventual nova realidade. A base chinesa de produção, inaugurada em 2009 e responsável por apenas 5% de tudo que é internacionalizado pela marca, será a plataforma para contornar o maior custo tarifário. "Vamos complementar pela China. A estratégia de sermos um fornecedor global ajuda muito numa hora dessas", salienta. No mercado americano, a indústria já tem tarifa zero de importação devido a outros programas. Hoje 15% a 20% da receita líquida da Fras-le no exterior é obtida nos Estados Unidos, com 90% dos produtos oriundos de plantas brasileiras.



A direção da Solarium, que tenta com grande custo administrar o impacto da valorização cambial nas tabelas de preços, aposta na qualidade e em diferenciais dos produtos. Ana Cristina explica que a empresa foca regiões que valorizam o perfil dos revestimentos da categoria de atérmicos, ideal para climas quentes. A marca tem showroom em Miami e se prepara para chegar à Califórnia. "Atuamos muito com arquitetos. No entanto, hoje há muita cotação, mas pouca venda", descreve a presidente da Solarium. A empresa tem vendas esporádicas, que só não decolam mais devido aos custos. "Nosso produto chega a dobrar de valor frente ao dos chineses, mas acreditamos nos diferenciais", contrasta a executiva. "Os clientes ficam loucos pelo piso, pois não há similar. Mas na hora do preço é o problema." A esperança da empresária é o reaquecimento da construção civil americana, que já está ocorrendo. Com produção de 150 mil e 200 mil metros quadrados anuais de pisos, as fábricas na Capital gaúcha, em São Paulo, em Recife e em Brasília estão prontas para receber pedidos. Neste ano a meta é crescer 17%.
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