Juízes e fiscais revertem apreensão de importados
Por Laura Ignacio e Bárbara Pombo
De São Paulo
A Receita Federal tem aplicado cada vez mais aos importadores a chamada pena de perdimento. A medida é a apreensão de mercadoria importada de maneira legal, porém com pagamento menor de impostos. Segundo a Superintendência da Receita da 8ª Região (São Paulo), só neste ano o órgão apreendeu no Estado R$ 480,12 milhões em produtos. Em 2010, foram R$ 414, 28 milhões. Por falta de provas, porém, decisões judiciais vêm revertendo algumas dessas penas. Neste ano, pelo menos R$ 28,2 milhões em mercadorias retornaram às empresas. Em 2010, R$ 44 milhões foram devolvidos.
Uma empresa de armarinhos, que atua em São Paulo, obteve uma sentença para liberar dois contêineres de mochilas, bolsas e carteiras importadas da China e Taiwan. As mercadorias haviam sido bloqueadas pela Receita Federal, no Porto de Santos, por suspeita de subfaturamento na operação. Para o Fisco, os preços declarados nas faturas estavam abaixo do valor de mercado, o que implicaria em recolhimento menor de tributos. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que deve recorrer da decisão.
Pelo Decreto-Lei nº 37, de 1966, a pena de perda do produto é aplicável, dentre outros casos, quando há falsificação ou adulteração de documentos necessários ao embarque e ao desembaraço aduaneiro. Para o juiz federal Marcelo Souza Aguiar, da 2ª Vara Federal de Santos, a adulteração não foi comprovada pelo Fisco. Na decisão, ele entendeu que a declaração de valores diferentes ao da transação real gera outro tipo de punição. "A existência de subfaturamento, na forma que entendeu o legislador, não configura fraude aduaneira sujeita ao perdimento, mas à multa", diz na sentença. Com isso, a empresa teria que pagar US$ 100 mil referentes à diferença do imposto declarado, acrescidos de multa de 100%.
Para o advogado da empresa Felippe Breda, do Emerenciano, Baggio e Associados Advogados, a aplicação do perdimento para casos de subfaturamento está em descompasso com a legislação. "Se a autoridade não concorda com o valor informado da transação comercial tem que seguir a valoração aduaneira", afirma o advogado referindo-se à Instrução Normativa da Receita nº 327, de 2003, que estabelece as regras para a declaração e o controle do valor aduaneiro de mercadoria importada.
Em outro caso, recente decisão da própria delegacia da Receita, livrou uma empresa de eletroeletrônicos de pagar R$ 332,43 milhões como pena de perdimento. Quando o fiscal não encontra a mercadoria declarada, a pena é convertida em multa de valor equivalente. Por maioria dos votos, a 2ª Turma da delegacia de julgamento em Fortaleza - formada por cinco auditores fiscais - declarou o auto de infração nulo porque o fato que teria gerado a autuação não ocorreu. Em razão do alto valor, o Fisco é obrigado a apresentar recurso de ofício ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Por isso, o superintendente da Receita da 3ª Região, Moacyr Mondrado, não quis comentar a questão.
Nos autos, o fiscal afirma que não localizou mercadorias que deveriam estar no terminal de Manaus e não existia documentos que comprovassem sua devolução ao depósito. O terminal teria recebido da indústria R$ 606,32 milhões em produtos e retornado apenas R$ 274,88 milhões. "Presume-se desta forma sua saída da Zona Franca de Manaus [da diferença entre os dois valores]", diz.
"Pela falta de clareza na demonstração do fato, não permitindo a verificação da perfeita subsunção do fato concreto à hipótese prevista na lei, ausência de manifestação acerca de elementos probatórios apresentados na fase fiscalizatória e imprecisões na identificação do autuado e cálculo da matéria tributável, torna-se imperativo decretar nulo o auto de infração", afirma o relator da decisão.
Segundo a advogada Priscilla Versatti, que representou a empresa no processo, quando o produto vai para um terminal é emitida uma nota fiscal de depósito. Ao ser remetido para fora da Zona Franca, a indústria deve emitir uma segunda nota fiscal de transferência. Nesse momento, o armazém deve emitir uma nota fiscal de "retorno simbólico" da mercadoria. "Como o armazém não emitiu essa nota, ao não encontrar as mercadorias no terminal, o fiscal federal presumiu a saída ilegal dos produtos", diz.
No processo, a advogada demonstrou que a operação estava amparada por documentos que comprovam a saída. "Além das notas fiscais, os documentos que provam o transporte das mercadorias foram apresentados", afirma. Segundo ela, o Fisco não conseguiu provar o que presumiu.
Além dos problemas criados pelas apreensões, esse tipo de situação pode ocasionar problemas internos às empresas. Segundo Yun Ki Lee, advogado do Dantas, Lee, Brock & Camargo Advogados, a auditoria interna da companhia pode buscar responsáveis pela pena fiscal. Para ele, o problema do caso de Manaus é que o fiscal apoiou-se apenas em indícios. "Se a mercadoria não estava mais lá, a fiscalização deveria fazer o encontro de contas com notas fiscais e de transporte da empresa", diz. Após o fim do processo, as mercadorias sujeitas ao perdimento podem ser leiloadas, doadas para instituições sem fins lucrativos, incorporadas por órgãos públicos ou destruídas, se importadas ilegalmente.
Valor Econômico Online
Por Laura Ignacio e Bárbara Pombo
De São Paulo
A Receita Federal tem aplicado cada vez mais aos importadores a chamada pena de perdimento. A medida é a apreensão de mercadoria importada de maneira legal, porém com pagamento menor de impostos. Segundo a Superintendência da Receita da 8ª Região (São Paulo), só neste ano o órgão apreendeu no Estado R$ 480,12 milhões em produtos. Em 2010, foram R$ 414, 28 milhões. Por falta de provas, porém, decisões judiciais vêm revertendo algumas dessas penas. Neste ano, pelo menos R$ 28,2 milhões em mercadorias retornaram às empresas. Em 2010, R$ 44 milhões foram devolvidos.
Uma empresa de armarinhos, que atua em São Paulo, obteve uma sentença para liberar dois contêineres de mochilas, bolsas e carteiras importadas da China e Taiwan. As mercadorias haviam sido bloqueadas pela Receita Federal, no Porto de Santos, por suspeita de subfaturamento na operação. Para o Fisco, os preços declarados nas faturas estavam abaixo do valor de mercado, o que implicaria em recolhimento menor de tributos. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que deve recorrer da decisão.
Pelo Decreto-Lei nº 37, de 1966, a pena de perda do produto é aplicável, dentre outros casos, quando há falsificação ou adulteração de documentos necessários ao embarque e ao desembaraço aduaneiro. Para o juiz federal Marcelo Souza Aguiar, da 2ª Vara Federal de Santos, a adulteração não foi comprovada pelo Fisco. Na decisão, ele entendeu que a declaração de valores diferentes ao da transação real gera outro tipo de punição. "A existência de subfaturamento, na forma que entendeu o legislador, não configura fraude aduaneira sujeita ao perdimento, mas à multa", diz na sentença. Com isso, a empresa teria que pagar US$ 100 mil referentes à diferença do imposto declarado, acrescidos de multa de 100%.
Para o advogado da empresa Felippe Breda, do Emerenciano, Baggio e Associados Advogados, a aplicação do perdimento para casos de subfaturamento está em descompasso com a legislação. "Se a autoridade não concorda com o valor informado da transação comercial tem que seguir a valoração aduaneira", afirma o advogado referindo-se à Instrução Normativa da Receita nº 327, de 2003, que estabelece as regras para a declaração e o controle do valor aduaneiro de mercadoria importada.
Em outro caso, recente decisão da própria delegacia da Receita, livrou uma empresa de eletroeletrônicos de pagar R$ 332,43 milhões como pena de perdimento. Quando o fiscal não encontra a mercadoria declarada, a pena é convertida em multa de valor equivalente. Por maioria dos votos, a 2ª Turma da delegacia de julgamento em Fortaleza - formada por cinco auditores fiscais - declarou o auto de infração nulo porque o fato que teria gerado a autuação não ocorreu. Em razão do alto valor, o Fisco é obrigado a apresentar recurso de ofício ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Por isso, o superintendente da Receita da 3ª Região, Moacyr Mondrado, não quis comentar a questão.
Nos autos, o fiscal afirma que não localizou mercadorias que deveriam estar no terminal de Manaus e não existia documentos que comprovassem sua devolução ao depósito. O terminal teria recebido da indústria R$ 606,32 milhões em produtos e retornado apenas R$ 274,88 milhões. "Presume-se desta forma sua saída da Zona Franca de Manaus [da diferença entre os dois valores]", diz.
"Pela falta de clareza na demonstração do fato, não permitindo a verificação da perfeita subsunção do fato concreto à hipótese prevista na lei, ausência de manifestação acerca de elementos probatórios apresentados na fase fiscalizatória e imprecisões na identificação do autuado e cálculo da matéria tributável, torna-se imperativo decretar nulo o auto de infração", afirma o relator da decisão.
Segundo a advogada Priscilla Versatti, que representou a empresa no processo, quando o produto vai para um terminal é emitida uma nota fiscal de depósito. Ao ser remetido para fora da Zona Franca, a indústria deve emitir uma segunda nota fiscal de transferência. Nesse momento, o armazém deve emitir uma nota fiscal de "retorno simbólico" da mercadoria. "Como o armazém não emitiu essa nota, ao não encontrar as mercadorias no terminal, o fiscal federal presumiu a saída ilegal dos produtos", diz.
No processo, a advogada demonstrou que a operação estava amparada por documentos que comprovam a saída. "Além das notas fiscais, os documentos que provam o transporte das mercadorias foram apresentados", afirma. Segundo ela, o Fisco não conseguiu provar o que presumiu.
Além dos problemas criados pelas apreensões, esse tipo de situação pode ocasionar problemas internos às empresas. Segundo Yun Ki Lee, advogado do Dantas, Lee, Brock & Camargo Advogados, a auditoria interna da companhia pode buscar responsáveis pela pena fiscal. Para ele, o problema do caso de Manaus é que o fiscal apoiou-se apenas em indícios. "Se a mercadoria não estava mais lá, a fiscalização deveria fazer o encontro de contas com notas fiscais e de transporte da empresa", diz. Após o fim do processo, as mercadorias sujeitas ao perdimento podem ser leiloadas, doadas para instituições sem fins lucrativos, incorporadas por órgãos públicos ou destruídas, se importadas ilegalmente.
Valor Econômico Online
Nenhum comentário:
Postar um comentário