Artigo: O ICMS e a descentralização do comércio exterior
Folha Vitória
Redação Folha Vitória
*Ivan Ramalho
A balança comercial brasileira apresentou um excelente resultado no ano passado. O saldo, de quase US$ 30 bilhões, o melhor em quatro anos, foi obtido com exportações de US$ 256 bilhões e importações de US$ 226 bilhões, um recorde histórico.
Mas um dos pontos que merecem destaque nesse desempenho – e que muitas vezes não é percebido pelos analistas – é o extraordinário valor das importações que entram pelo Estado de São Paulo. As compras externas de São Paulo registraram uma diferença abissal em relação às importações dos demais Estados da federação.
As importações de São Paulo alcançaram US$ 82 bilhões em 2011, o que corresponde a 36% do total importado pelo País. O Estado do Rio de Janeiro, segundo colocado, importou apenas US$ 18 bilhões. Já os demais Estados brasileiros registraram importações em níveis bastante mais modestos.
Esses números comprovam que continua existindo uma enorme concentração das importações brasileiras no Estado de São Paulo. Isso se deve em grande parte à evolução das compras de insumos industriais, cujo crescimento em no ano passado chegou a 41%, superando em muito as importações de bens de consumo do próprio Estado, cujo aumento foi de apenas 12%.
O mesmo não ocorreu com as exportações de São Paulo no ano passado, que chegaram a US$ 60 bilhões. O crescimento foi substancialmente inferior, de apenas 14%, quando comparado à expansão média das exportações brasileiras (mais 27%). O déficit comercial de São Paulo (US$ 22 bilhões) não impediu que no primeiro ano do Governo Dilma o Brasil encerrasse o ano com o expressivo saldo comercial de US$ 30 bilhões, naturalmente devido ao desempenho altamente superavitário do conjunto dos demais Estados do país.
O resultado deficitário da balança comercial de São Paulo decorre fundamentalmente das pesadas importações de máquinas e equipamentos, bem como de componentes e insumos voltados ao processo produtivo, dada à vocação eminentemente industrial daquele Estado.
Em meio a esse cenário, trava-se atualmente um grande debate acerca dos incentivos estaduais na importação aplicados por alguns Estados do país e que são objeto do projeto de resolução do Senado 72/2010. Esse projeto tem como objetivo implantar a alíquota de 0% para o ICMS incidente sobre o comércio interestadual de mercadorias importadas.
É notório que existe um robusto movimento do empresariado paulista para impedir a concessão dos atuais benefícios fiscais. Esses incentivos têm desempenhado um papel importante e buscam a promoção do desenvolvimento econômico e social dessas unidades da federação, ao estimular o desembarque de mercadorias em suas instalações portuárias.
Os incentivos colaboram decisivamente para a descentralização das importações. Note-se que a imensa concentração das importações no Estado de São Paulo (US$ 82 bilhões) foi sendo construída ao longo dos anos mesmo em plena vigência dos incentivos fiscais concedidos por vários Estados.
Não é demais reiterar que os incentivos estaduais não provocam um crescimento das importações brasileiras, como bem foi demonstrado em estudo da consultoria Rosenberg & Associados, encomendado pela Associação Brasileira de Empresas de Comércio Exterior (Abece), amplamente divulgado no ano passado.
O levantamento da Rosenberg destaca que os incentivos estaduais têm influência residual no aumento das importações. Segundo a consultoria, o crescimento das importações é causado, quase totalmente, pelo expansão do Produto Interno Bruto (PIB) e pela valorização da taxa real de câmbio. Todos os demais fatores somados, como os incentivos fiscais, a logística etc., respondem por menos de 1% do comportamento das importações.
O estudo não identifica efeito depreciativo dos incentivos sobre emprego, produção e renda para o Brasil. Ao contrário, há evidência de impactos extremamente positivos, pois um dos pontos mais relevantes do estudo diz respeito ao desenvolvimento regional: em todos os Estados que concedem incentivos fiscais foram verificados aumentos contínuos a partir de 1995 na arrecadação do ICMS, aumento no IDH, crescimento do PIB em ritmo maior que a média nacional e considerável aumento do número de empregos.
A interrupção desse processo, com o fim dos incentivos sugerido pelo projeto no Senado, além de ter um impacto negativo sobre a economia dos Estados atingidos, fará com que se avolumem ainda mais as importações por São Paulo, majoritariamente destinadas ao porto de Santos. Sem dúvida, isso levará a um agravamento das condições logísticas já saturadas e consequências também negativas nas demais malhas viárias do Estado.
Não faz sentido que isso ocorra justamente no momento em que as empresas que operam no comércio exterior e o próprio Governo Federal estão preocupados em efetuar novos investimentos nos vários portos brasileiros, buscando aprimorar a logística e reduzir custos, e assim alcançar ganhos em produtividade e competitividade.
O exemplo dado pelas exportações brasileiras em 2011, quando as regiões Norte (mais 38%) e Centro-Oeste (mais 33%) se destacaram com crescimentos em níveis superiores à média brasileira – contribuindo de maneira decisiva para neutralizar o déficit de São Paulo – demonstra que a descentralização pode proporcionar muitos benefícios para a economia brasileira como um todo, além de atenuar o grande desequilíbrio regional com o qual convivemos há tantas décadas.
*Ivan Ramalho, 62 anos, é economista, ex-secretário executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e presidente da Associação Brasileira de Empresas de Comércio Exterior (Abece)
http://www.folhavitoria.com.br/economia/guiadelogistica/noticia/2012/02/artigo-o-icms-e-a-descentralizacao-do-comercio-exterior.html
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