Câmbio fica menos importante na inflação
É crescente o coro de especialistas que falam que o Banco Central (BC) está mudando.
Que a instituição está caminhando para o modelo chinês de política monetária, que consiste em menos taxa de juros e mais ações no controle de crédito e liquidez.
Até o lendário gestor do Fundo Verde, Luis Stuhlberger, reiterou no Relatório de Gestão de novembro que essa nova fase de política monetária está apenas começando e que as mudanças serão muito mais profundas do que o mercado prevê atualmente.
Partindo do pressuposto de que está ocorrendo essa mudança, não só na política monetária, mas também na política fiscal (que estaria ganhando viés menos expansionista) haverá uma nova matriz de política economia no país. E tudo isso (desde que não passe de delírio do mercado) poderá afetar, também, a relação do governo com a taxa de câmbio.
Por mais que se diga o contrário, é inegável o uso da taxa de câmbio como ferramenta de política monetária.
Dólar barato ajuda a conter pressões inflacionárias e gostando ou não, ajuda a atender ao robusto crescimento da demanda doméstica.
Aqui está inserida uma discussão bem conhecida de todos: como o BC estimula a formação de posições vendidas pelos bancos no mercado à vista de dólar e se beneficia da pressão de baixa sobre o preço da moeda americana que tal estratégia gera.
No entanto, nesse novo modelo de política econômica, a formação da taxa de câmbio poderá se libertar da clausura da política monetária. A observação é do diretor-executivo da NGO Corretora Sidnei Moura Nehme.
Na visão do especialista, o modelo de juros altos combinado com real valorizado visando conter a inflação parece superado. O novo governo mostra ciência da necessidade de conter e melhorar a qualidade dos gastos públicos e de desacelerar o ritmo de expansão do consumo via crédito.
Esses dois movimentos aliviam pressão inflacionária e acabam liberando o dólar de sua função de âncora para os preços.
Com isso, o preço da moeda poderá buscar patamares que permitam uma retomada das exportações (fora dos setores básicos).
Além disso, acredita Nehme, com demanda mais contida e dólar ligeiramente mais caro, a importação de bens não essenciais perde força.
No curtíssimo prazo, no entanto, o diretor não acredita em mudança relevante. O dólar segue com seu importante papel de ajudar a conter a inflação importada, ainda mais após a recente decisão do BC de manter a Selic estável em 10,75% ao ano.
No pregão de ontem, o dólar comercial marcou novo dia de baixa e voltou a valer menos de R$ 1,70. Seguem as conversas nas mesas de que a entrada de recursos externos continua firme. A moeda caiu 0,35% e fechou a R$ 1,695 na venda.
Resta saber se o BC voltará a acentuar as compras no mercado à vista e/ou se Fazenda fará as habituais ameaças com o dólar voltando a oscilar abaixo de R$ 1,70.
Passando para os juros futuros, os contratos curtos reforçaram viés de baixa na terça-feira.
Contribuíram para a redução nos prêmios de risco as venda no varejo, que surpreenderam para baixo ao subir 0,4% em outubro, e as coletas de preços no atacado e varejo, que mostram arrefecimento da inflação.
A combinação desses dois fatores deu força à ala de mercado que trabalha com estabilidade da taxa Selic também na reunião de janeiro.
De fato, a curva futura não embute mais integralmente uma alta de 0,5 ponto percentual no primeiro encontro do Comitê de Política Monetária (Copom) de 2011.
Valor Econômico
Um nível de câmbio para dois interesses
Depois de três dias seguidos de alta e um ganho acumulado de 1,66%, o dólar comercial passou por firme ajuste de baixa e voltou a ser negociado na linha de R$ 1,70.
Ontem, a moeda caiu 0,81%, e fechou a R$ 1,701. O elevado volume negociado no interbancário, quase US$ 4 bilhões, reforçou a percepção de fluxo positivo de recursos em direção ao país.
Além da entrada de moeda, as ordens de venda tiveram respaldo do mercado externo, onde o euro passou por firme retomada, voltando a ser negociado acima de US$ 1,33. Já o Dollar Index captou a menor demanda por moeda americana e caiu cerca de 1%.
Essa melhora no apetite por risco estaria relacionada à falta de ação do Banco Central da China no fim de semana. Os agentes temiam uma alta de juros como resposta à inflação, mas, por ora, nada aconteceu.
De volta ao mercado local, fica a percepção de que os agentes devem testar, novamente, a força da linha de R$ 1,70. Vale lembrar que na semana passada o governo respondeu com firmeza à perda desse patamar de preço. O Banco Central (BC) fez duas compras por dia no mercado à vista e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, falou que o governo pode voltar a atuar no câmbio.
A questão do dólar se pauta em ambiguidade de interesses, nota o economista e professor da PUC-Rio, André Cabus Klotzle. Busca-se uma cotação que compense, parcialmente, o viés inflacionário das commodities. Mas que também evite maiores atritos com alguns segmentos exportadores.
Então, para se atender a essas demandas distintas, há uma regra informalmente definida com os seguintes parâmetros: Dólar acima de R$ 1,70 um leilão de compra por dia no mercado à vista. Dólar abaixo de R$ 1,68 igual a dois leilões por dia.
Segundo Klotzle, essa banda entre R$ 1,68 e R$ 1,70 parece atender os interesses de conter o impacto da “inflação importada” e minorar os prejuízos aos exportadores.
Tal “consenso” também favorece o investidor externo, que não altera sua posição vendida no mercado futuro de dólar e cupom cambial (DDI – juros em dólar), que soma US$ 12,4 bilhões. Sabendo da relativa estabilidade da taxa, o estrangeiro consegue obter um ganho financeiro equivalente ao diferencial entre juros internos e externos.
Passado para o mercado de juros futuros, nenhuma alteração relevante na curva. Os investidores estão aguardando a ata do Comitê de Política Monetária (Copom) para ver se conseguem montar posições sobre alta de juros (ou não) em janeiro com algum grau de certeza.
No campo externo, atenção à reunião do Federal Reserve (Fed), banco central americano. A taxa básica deve permanecer entre zero e 0,25% ao ano. Com isso, as expectativas se voltam ao comunicado apresentado junto com a decisão.
É possível que o Fed faça algum comentário sobre o andamento do programa de US$ 600 bilhões em compra de títulos do Tesouro. A ferramenta, que visa a derrubar os juros de mercado e estimular o consumo, não parece estar funcionando muito bem, já que as taxas de retorno dos títulos americanos rondam patamares não observados em seis meses.
As explicações para tal movimento são diversas, mas todas têm alguma relação com o projeto de não elevar impostos aos americanos. O benefício que acabaria junto com o ano de 2010 tem tudo para ser prolongado.
A manutenção do benefício é vista como mais uma injeção de liquidez que vai agravar o déficit orçamentário americano, que fechou novembro em US$ 150 bilhões. Menor arrecadação resultaria em maior emissão de dívida. Também há quem relacione esse movimento no mercado de títulos à preocupação dosa gentes com a inflação no futuro.
Valor Econômico
Cota Hilton pode levar Brasil à OMC
Os exportadores brasileiros de carne bovina subiram o tom ontem contra a União Europeia e reforçaram a intenção de pedir a abertura de um painel contra o bloco na Organização Mundial de Comércio (OMC) por conta de mudanças nas exigências para vender cortes nobres dentro da cota Hilton. Como reflexo dos novos requisitos, o Brasil conseguiu cumprir menos de 10% do volume de 10 mil toneladas a que tinha direito no ano-cota julho de 2009 a junho de 2010, segundo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec).
Dentro da cota, a tarifa de importação dos cortes é de 20% ad valorem; fora é de 12,8% mais € 3.041 por tonelada.
O setor, que deve terminar o ano com volumes totais exportados de 1,640 milhão de toneladas (equivalente-carcaça) e receita de US$ 4,9 bilhões, já amarga quedas nas vendas de carne bovina (dentro e fora da cota) para a UE desde 2008, quando o bloco passou a exigir que apenas uma lista restrita de fazendas fornecesse bovinos para abate e venda aos países-membros. As vendas ao bloco alcançaram US$ 1,4 bilhão em 2007, mas tinham atingido apenas US$ 634 milhões de janeiro a novembro deste ano.
Até 2008/2009, o Brasil tinha uma fatia de cinco mil toneladas da cota Hilton, mas fechou acordo com a UE e obteve mais cinco mil como compensação pela perda de exportações para Romênia e Bulgária, após a entrada dos dois países na UE, em 2007. “Trocamos 120 mil toneladas de exportações, sem licenças, por cinco mil de Hilton, e agora há barreiras que prejudicam o acordo”, disse o presidente da Abiec, Antônio Camardelli, que ontem apresentou os números das exportações em 2010. Segundo ele, o conselho da Abiec já aprovou o pedido de abertura de painel. O assunto será levado a assembleia.
Entre as exigências que têm impedido o Brasil de cumprir a cota estão a determinação em 2009, pela UE, de que os bovinos abatidos para atender à cota Hilton sejam alimentados somente a pasto, sem suplementação. Essa exigência não é feita a Austrália e EUA, que também têm volumes da cota. Além disso, a UE pede rastreabilidade desde a desmama do bezerro, o que não é viável hoje, conforme os exportadores.
Enquanto as vendas de carne bovina seguem reduzidas para a UE – também por causa da crise -, o Irã ganhou importância nas vendas do Brasil e já representou 17,16% da receita com as exportações até novembro, segundo a Abiec. A Rússia ficou com a maior fatia, 22,08%.
Sem perspectiva de aumentar as vendas na Europa por causa das restrições, a Abiec buscará melhorar a performance em mercados já abertos, como a China, e conseguir novos clientes, como México, Cuba e Marrocos, Coreia e Indonésia.
Outro entrave às exportações do Brasil este ano foi o embargo aos embarques de carne industrializada após os EUA detectarem níveis acima do permitido do vermífugo ivermectina. Por conta disso, as vendas de carne industrializada caíram 22% de janeiro a novembro, para US$ 467, 6 milhões.
Segundo Camardelli, o Brasil aceitou a proposta dos EUA de reduzir a prevalência do resíduo, de 1,5% para 1%, mas não aceitará a sugestão de que outras seis diferentes análises sejam feitas, apenas parte desse número.
O presidente da Abiec não faz estimativas sobre volume em 2011, mas acredita que a receita com as vendas pode ficar entre US$ 5,3 bilhões e US$ 5,5 bilhões.
Para ele, a oferta de bovinos deve melhorar no próximo ano, já que o abate de fêmeas se estabilizou. O dirigente admitiu que em alguns momentos, este ano, o mercado interno foi mais competitivo que o externo por causa da alta da arroba do boi. De acordo com a Scot Consultoria, a arroba saiu de R$ 92 no começo de outubro para R$ 115 em meados de novembro e R$ 102 atualmente.
Valor Econômico
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