LEGISLAÇÃO

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Valoração aduaneira



VALORAÇÃO ADUANEIRA E SUA APLICAÇÃO NA IMPORTAÇÃO DE SOFTWARE

Valoração aduaneira é o conjunto de princípios e critérios técnico-legais que tem a finalidade de definir o valor aduaneiro[1]. Este, por sua vez, é o valor considerado para fins de tributação no comércio internacional. As normas que regem a apuração do valor aduaneiro estão dispostas no Acordo sobre Implementação do Artigo VII do Gatt, comumente chamado de Acordo de Valoração Aduaneira (AVA-Gatt), que foi internalizado pelo Decreto nº 1.355/1994. Esse Acordo contém a forma como deve ser determinado o valor aduaneiro das mercadorias nas operações de importação, sendo que, mediante aplicação sucessiva e sequencial, do primeiro ao último, devem ser considerados os seis métodos a seguir expostos:
O primeiro método é o valor real, que é o chamado valor de transação e corresponde ao valor pago ou a se pagar pelas mercadorias, acrescido do custo de carga, manuseio, descarga, transporte e seguro até o desembarque. Esse é o método comumente utilizado e pode ser questionado apenas quando a documentação apresentada for carente de credibilidade ou omissa. Além dos documentos necessários para a importação, podem ser apresentados demais documentos para corroborar a valoração por esse método. Caso não consiga se provar a legitimidade por esse método, passa-se sequencialmente aos demais.
O segundo método refere-se ao valor de outras transações com mercadorias idênticas, realizadas entre os mesmos países e na mesma época. Caso seja impossível a averiguação com mercadorias idênticas, passa-se ao terceiro método, que é o valor de outras transações com mercadorias similares, nas mesmas condições do segundo método. O quarto método trata-se do valor de revenda, no mercado interno do país importador, de mercadorias idênticas ou similares. Apesar de ser obrigatória a ordem sequencial dos métodos, há uma exceção no ordenamento brasileiro no que se refere ao quinto e sexto métodos, que podem ser adotados alternativamente, sendo que aquele se refere ao custo aproximado de produção da mercadoria, somado às despesas comerciais e lucro, e este, o sexto método, se refere ao arbitramento puro.
O Comitê de Valoração Aduaneira é o órgão da Organização Mundial de Comércio (OMC) que emite decisões sobre assuntos relacionados com a administração do sistema de valoração aduaneira no que se refere ao Acordo, e as decisões por ele emitidas vinculam seus membros.
A vinculação das decisões proferidas pelo Comitê de Valoração Aduaneira é tema que merece especial destaque, já que, apesar da existência de expressa previsão legal, na prática, a Receita Federal do Brasil não aplica as orientações interpretativas na declaração do valor aduaneiro, quando há divergência entre o entendimento do contribuinte e o da fiscalização quanto ao valor declarado. Não é raro verificar, nesses casos, o arbitramento de valores sem observância do devido processo de valoração aduaneira, das orientações do Comitê Técnico e nem mesmo respeito à aplicação dos métodos de valoração.
Vale lembrar que, apesar de o Decreto nº 6.759/2009, Regulamento Aduaneiro, prever em seu artigo 86 que "a base de cálculo dos tributos será determinada mediante arbitramento nas hipóteses de fraude, sonegação, conluio, quando não for possível a apuração do preço efetivamente praticado, ou quando for descumprida obrigação referida no caput do artigo 18", oAcordo Geral sobre Tarifas e Comércio (Gatt) dispõe, no artigo 7º, que, quando o valor aduaneiro não puder ser determinado com base em um dos seis métodos, será determinado por critérios razoáveis compatíveis com os princípios e as disposições gerais do Acordo e não será determinado por valores arbitrários. O Acordo de Valoração Aduaneira é acordo internacional, firmado pelo Brasil no âmbito do Gatt e integrado ao ordenamento pátrio por meio de Decreto Legislativo, com força de Lei Complementar.
Ou seja, deve, obrigatoriamente, a autoridade aduaneira obedecer à ordem sequencial dos métodos de valoração para, ante a impossibilidade de utilização de qualquer um dos métodos, determinar o valor aduaneiro por critérios razoáveis e compatíveis com os princípios e disposições gerais do Acordo.
O artigo 14 do AVA dispõe que as informações e orientações expedidas pelo Comitê terão poder normativo para todos os membros, vinculando-os à sua aplicação. Para tanto, foi publicada a Instrução Normativa SRF nº 318/2003, que divulga atos emanados do Comitê de Valoração Aduaneira (OMC), da IV Conferência Ministerial da OMC e do Comitê Técnico de Valoração Aduaneira (OMA).
Integra a Instrução Normativa SRF nº 318/2003 decisão referente a tema controverso tanto quanto à sua valoração aduaneira quanto à tributação, que é a operação de importação de software. Em 21 de maio de 1995, foi aprovada a decisão 4.1. pelo Comitê, que trata da valoração aduaneira do software e indica que as partes devem considerar, para fins de valor aduaneiro, na importação de suportes físicos que contenham dados ou instruções, somente o custo ou valor do suporte físico propriamente dito. O valor aduaneiro não compreende o custo ou valor dos dados ou instruções, desde que estes estejam destacados do custo ou valor do suporte físico.
Essa decisão segue a lógica de que o Imposto de Importação incide sobre "mercadoria", ou seja, somente sobre o suporte físico que contenha os dados ou instruções. Para essa finalidade, é importante a distinção já tratada em artigo publicado no mês de outubro de 2012[2] entre o "software de prateleira" e o "software customizado", já que este pode ser caracterizado como prestação de serviços. Segue abaixo trecho da decisão 4.1.:
"(...) Na determinação do valor aduaneiro dos suportes físicos importados que contenham dados ou instruções, será considerado unicamente o custo ou valor do suporte físico propriamente dito. Portanto, o valor aduaneiro não compreenderá o custo ou valor dos dados ou instruções, desde que estes estejam destacados do custo ou valor do suporte físico (...)."
A decisão OMC 4.1. vai ao encontro do disposto no artigo 81 do Regulamento Aduaneiro e sua observação é de extrema importância, já que, caso não esteja destacado o valor do suporte físico na fatura comercial, a tributação incide sobre o valor da transação, considerando o valor dos dados e instruções contidos naquele, bem como o valor da embalagem, entre outros, conforme se verifica na decisão abaixo:
Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário Período de apuração: 19/01/1996 a 15/07/1999 Valor Aduaneiro. Software. Ausência de Destaque do Suporte Físico. Consequências. A exclusão do custo do software do valor aduaneiro somente pode ser levada a efeito se o valor do seu suporte de gravação encontrar-se destacado na fatura comercial que exterioriza a comercialização. Inteligência do art. 20 do Decreto nº 2.498, de 1998 e do art. 2º da Decisão 4.1., do Comitê Técnico de Valoração Aduaneira. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. RECURSO VOLUNTÁRIO NEGADO (3º Conselho de Contribuintes/3ª Câmara/ACÓRDÃO 303-35.531 em 12.08.2008)
Importante destacar, ainda, que a referida Decisão da OMC define que não se inclui no conceito de suporte físico, porém, circuitos integrados, semicondutores e dispositivos similares ou artigos que contenham esses circuitos ou dispositivos:
"(...) Para os efeitos da presente Decisão, a expressão "suporte físico" não compreende os circuitos integrados, os semicondutores e dispositivos similares ou os artigos que contenham tais circuitos ou dispositivos; a expressão "dados ou instruções" não inclui as gravações de som, cinema ou vídeo (...)."
O mesmo entendimento verifica-se na decisão do 3º Conselho de Contribuintes, 2ª Câmara, no Acórdão nº 302-39.032, publicado em 16/10/2007, do qual se destaca o trecho:
"(...) Na importação de equipamentos eletrônicos, inexiste previsão legal para exclusão do valor aduaneiro do custo ou valor de softwares contidos em circuitos integrados, semicondutores ou dispositivos similares, ainda que esse valor encontre-se destacado no documento de aquisição (...)."
Ainda com relação às decisões emitidas pelo Comitê de Valoração Aduaneira, abordando agora também a forma de aplicação dos métodos de valoração e demonstrando a sua utilização em um caso concreto ocorrido no Brasil, temos que a decisão 6.1., aprovada em 12 de maio de 1995, reafirma o disposto no artigo 17 do AVA, que diz que a administração aduaneira pode solicitar ao importador o fornecimento de informações, provas, explicações e documentos caso haja dúvidas quanto ao valor aduaneiro declarado. Na decisão, afirma-se ainda que, caso após os esclarecimentos ainda haja dúvidas quanto ao valor declarado, pode a autoridade administrativa decidir que o valor aduaneiro das mercadorias não pode ser determinado com base no artigo 1º (que dispõe que o valor aduaneiro de mercadorias importadas seja determinado, preferencialmente, pelo primeiro método).
Diante do exposto, fica demonstrado quão técnico é o tema da valoração aduaneira, ainda mais quando tratamos de produtos de rápido avanço tecnológico, como softwares e seus meios físicos. Os importadores devem se municiar desse conhecimento técnico e se resguardar de cuidados preventivos, para evitar decisões simplistas e arbitrárias da fiscalização aduaneira, que visam, em regra, ao lançamento fiscal em busca de maior recolhimento tributário.
[1] MACEDO, Leonardo Correia de Lima. Direito tributário no comércio internacional (acordos e convenções internacionais - OMC, CCA/OMA, Aladi e Mercosul). São Paulo: Lex Editora, 2005, pág. 65.

[2] http://www.liraa.com.br/conteudo/2421/imp-software.

Autor(a): GABRIELA TIUSSI
Advogada, associada ao Instituto de Comércio Internacional do Brasil.

http://www.aduaneiras.com.br/noticias/artigos/artigos_texto.asp?acesso=2&ID=25059222

Nenhum comentário: